domingo, 11 de outubro de 2015

A ECONOMIA DOS EUA NA SEGUNDA GUERRA


Como os EUA financiaram a Segunda Guerra sem inflação

Por André Araújo

Os Estados Unidos ainda não tinham saído integralmente da Grande Depressão de 1929 quando se iniciou a Segunda Guerra em 3 de setembro de 1939.
Oficialmente neutros até 7 de dezembro de 1941, os EUA iniciaram entretanto a preparação para entrar no conflito bem antes do ataque japonês a Pearl Harbour.  Esse gigantesco esforço de mobilização, encomendas de material bélico, conversão das indústrias existentes para fabricação de armamentos, construção de 3.000 novas fábricas e estaleiros para armar suas forças e fornecer material aos aliados, foi um grande programa executado dentro da economia americana sem provocar inflação de importância, exceto no primeiro ano de entrada na guerra, 1942. A inflação nos EUA teve este registro:
1940 - Menos 0,7%
1941 - 1,44%
1942 - 11,35%
1943 - 7,64%
1944 - 2,96%
1945 - 2,30%
Os valores monetários injetados na economia americana durante a Guerra foram impressionantes: US$950 bilhões, equivalentes em dólares de 2012 a US$6,6 trilhões. Os anos de pico foram 1943, com US$85 bilhões, equivalentes a dólares de 2012 a US$ 913 bilhões, e 1944, equivalentes em 2012 a US$1,2 trilhão.
O esforço industrial de guerra significou a construção de novas fabricas, para o que o Governo dava 100% de financiamento a juros de 0,75% ao ano. Para financiamento até 100 mil dólares o dinheiro saia em 15 dias.
O Federal Reserve System, Banco Central americano,  organizou-se para controlar a moeda e o financiamento da guerra. Seus doze bancos regionais foram encarregados cada de um conjunto de tarefas e para executá-los; o pessoal aumentou de 11.000 para 24.000. A taxa básica de juros pelos quais o FED financiava o Tesouro  manteve-se durante o conflito em 0,5% ao ano, o que se compara com taxas muito maiores antes da guerra, de 2 a 4% ao ano.
A taxa de redesconto, pela qual o FED emprestava a bancos privados, foi de 1% ao ano durante toda a guerra.
O Federal Reserve Bank of New York foi encarregado, como é até hoje, das relações internacionais da economia americana. Mantinha contas para bancos centrais de 51 países e tinha a complicada tarefa de pagar o soldo de 8 milhões de soldados americanos espalhados pelo mundo, bem como suas despesas locais.
O esforço de guerra americano também tinha em larga escala a tarefa de abastecer a Grã-Bretanha de armas e matérias primas, de fornecer material bélico para a União Soviética - foram 16 milhões de toneladas durante a guerra -, de fornecer navios, artilharia, tanques e munição a países aliados como o Brasil.
O "arsenal da democracia", como se falava sobre a indústria americana, estava a todo vapor em 1945. Finda a guerra, as sobras de material eram impressionantes. De aviões de transporte foram 11.000 C-47, convertidos no civil DC-3, vendidos em liquidação, o que possibilitou o surgimento de 380 novas linhas aéreas pelo mundo. Sobraram também 1.400 navios de transporte, milhares de tanques, caminhões, máquinas, ferramentas, tudo vendido em leilões que abasteceram o mundo nos anos de secura no imediato pós-guerra.
Sempre intrigou o fato de todo o financiamento da guerra não ter desvalorizado expressivamente o dólar. Os arranjos operacionais para manter o País com baixa inflação foram extraordinários e a história é contada no site do Federal Reserve. Foi uma obra de engenharia econômica que consistiu na COMBINAÇÃO de vários instrumentos manejados pelo banco central americano; a grosso modo foram:
1. Um sistema abrangente de controle de preços.
2. Campanhas de captação de liquidez pelos bônus de guerra, vendidos em títulos de baixo valor, que a população comprou em larga escala.
3. Aumento da capacidade industrial até em excesso, pela construção de novas fábricas, com o que a oferta acompanhou a demanda.
Com todo o imenso esforço de guerra a economia civil não sofreu muito, como foi o caso da Inglaterra. Havia abundância de alimentos, combustível, roupas e itens de conforto; só foi interrompida a produção civil de automóveis durante a guerra.
Mas o grande fator que segurou a inflação foi a existência de capacidade ociosa nas matérias primas, como aço, alumínio, cobre, petróleo. Desde a crise de 29 o consumo caiu tanto que sobrava capacidade por toda a cadeia básica da indústria. Quando veio a guerra havia sobra de capacidade e a grande demanda de material bélico já encontrou, no inicio, a indústria pronta para atender.
A inundação de liquidez na economia doméstica não provocou maior inflação pela expertise de arranjos combinados que controlaram essa liquidez, considerando que milhões de mulheres entraram na categoria de operárias, visto os homens terem sido convocados para as forças armadas.
Tampouco o excesso de liquidez foi enxugado com juros altos, ao contrário: durante toda a guerra os juros básicos não passaram de 1% ao ano e não faltou dinheiro para financiar a construção de novas fábricas. Houve inclusive críticas a posteriori sobre o excesso de capacidade industrial construída, representada em 6.300 galpões industriais que foram construídos e sobraram no pós-guerra.
Uma das principais lições da economia de guerra é que não é necessário JURO ALTO para controlar inflação, desde que haja capacidade ociosa na indústria, o que é exatamente a situação do Brasil de hoje. (Fonte: aqui).

................
O que se viu nos EUA na Segunda Guerra foi a integral aplicação das ideias de John Maynard Keynes, com o Estado no comando das ações e o mercado seguindo o ritual planejado. Passada a Guerra, contavam os EUA com uma senhora estrutura industrial, viabilizando certamente a maior expansão (diversificada) já observada em todo o mundo.
Relativamente ao Brasil, uma singela observação: algo como 500 bilhões de Reais deixam de ser arrecadados anualmente em face da sonegação fiscal, excrescência culturalmente 'aceita' e até por muitos louvada. 

Nenhum comentário: