Há algum tempo, John Roberts, Chief of Justice (presidente da Suprema Corte de Justiça dos Estados Unidos), achou de bom tom conceder entrevista a uma emissora americana de TV. Altamente amável com a repórter, discorreu sobre amenidades, com destaque para o futebol, esporte a que se dedicava nos tempos de universidade.
A grande imprensa fez reparos, criticando a "exposição" do Chief e sua amabilidade para com a entrevistadora. John Roberts, ao que consta, assentiu.
Uma das características da função jurisdicional, em qualquer lugar do mundo, é a inércia: não existe prestação jurisdicional de ofício (feita diretamente pelo juiz); o juiz (no caso, o Estado) tem de ser provocado pelo Ministério Público - art. 127 da CF - ou pelos Advogados - art. 133.
Como o juiz é o detentor da função jurisdicional (poder/dever do Estado de aplicar o Direito ao caso concreto, substituindo a vontade das partes com força definitiva), não deve estar envolvido psicologicamente com a causa e/ou emitir juízo fora dos autos, garantindo, dessa forma, na parte que lhe toca pessoalmente, o devido processo legal (art. 5°, LIV, da CF). Mais: um dos Princípios de Bangalore, "código de ética" instituído pela ONU em 2007, é exatamente o da imparcialidade.
Uma vez que qualquer assunto/matéria pode, em princípio, ser objeto de ação judicial no futuro, cumpre ao juiz manter-se, tanto quanto possível, ao largo de tais itens.
Colidindo com tudo o que a Lei prescreve e o bom senso apregoa, o ministro Gilmar Mendes, em entrevista ao UOL, de 24.03, declara o seguinte: "Se há alguma irregularidade eu tenho a obrigação de apontar".
Verdadeiro disparate.
E segue o ministro, antípoda de John Roberts, criando embaraços país afora, convertendo impresões/estalos/cismas em "verdades absolutas" (grampo sem áudio, da Veja; prisão preventiva de Daniel Dantas como mera afronta de De Sanctis ao STF, já que as provas eram as mesmas da prisão temporária - quando não eram), estrelando sabatinas, falando de coisas já julgadas, matérias em julgamento...
Há quem reclame da "omissão" dos demais ministros. Tenho leitura diversa: eles estão corretos. Eventual conflito público infligiria à imagem do STF danos bem mais perniciosos que os ora vivenciados. Melhor agir seriamente em cada jornada, cada novo julgamento (como o da reserva Raposa/Serra do Sol), melhor trabalhar com afinco, resguardando o Direito.
Notícia alentadora: o TRF da 3ª Região, em 23.03,votou unanimemente pela legitimidade do compartilhamento de dados entre PF e ABIN e demais componentes do Sistema Brasileiro de Inteligência (Bacen, CVM, Receita Federal etc), ratificando o previsto na lei 9883/99 e negando pedido de trancamento de ação penal impetrado por prepostos de Daniel Dantas. Prevaleceu o entendimento dos desembargadores, como deve ser.
Em abril de 2010 expirará o mandato (que é de dois anos) do presidente do STF. "Quiçá os ministros não me dão mais dois anos?", indagou ele...
Certamente a indagação não foi dirigida a John Roberts.
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