sexta-feira, 21 de agosto de 2015

ALGO DE NOVO NO JOGO POLÍTICO


Eduardo Cunha pode ser pego pelo dízimo

Por Luis Nassif

A denúncia do Procurador Geral da República Rodrigo Janot contra o presidente da Câmara Federal Eduardo Cunha inaugura um novo tempo no jogo político.
Durante o dia, segundo os jornais, Cunha foi se aconselhar com os aliados. E aí se revela a hipocrisia do jogo político.
Agripino Maia, senador pelo Rio Grande do Norte, e da frente ampla pelo impeachment de Dilma Rousseff, defendeu a permanência de Cunha no cargo. Mendonça Filho, líder do DEM na Câmara – e um dos articuladores da eleição de Cunha para a presidência da casa – declarou judiciosamente que “ninguém pode ser condenado antecipadamente, nem blindado” (http://migre.me/rfvYj).
Durante o dia, Mendonça e o líder do PSDB na Câmara, Carlos Sampaio, foram procurados por Cunha atrás de conselhos (http://migre.me/rfwd1).
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Em 85 páginas a denúncia se assemelha a uma reportagem bem elaborada, sem o linguajar opressivo dos advogados.
Relata cada etapa do jogo mantido com a Diretoria Internacional da Petrobras para o aluguel de navios-sonda, preenche a delação com detalhes dos lugares onde teriam ocorrido reuniões, os arquivos da Câmara comprovando as pressões de Cunha contra a Mitsubishi, para a regularização das propinas.
É um excelente roteiro sobre os métodos modernos de investigação. Através da análise do sinal de rádio do celular de um dos suspeitos, consegue-se determinar sua localização justamente no prédio que o delator apontara como local da reunião para tratar das propinas.
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De um lado, mostra a incrível facilidade com que, na Petrobras, se aprovavam contratos de mais de US$ 1 bilhão sem maiores precauções. Ninguém conseguiria agir livremente, à salvo dos controles internos da companhia, sem um padrinho político forte e pactos políticos que garantiam liberdade de atuação.
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O dado relevante é a exposição dos métodos de chantagem a que Cunha recorria, valendo-se das prerrogativas dos órgãos de controle, dentre os quais o Congresso é um deles. Bastava um requerimento ao TCU (Tribunal de Contas da União) para implantar o terror ao chantageado.
Nesses tempos de CPIs alucinadas, é importante um acompanhamento pormenorizado dos trabalhos. Muitas CPIs foram abertas com o intuito mascarado de chantagear empresas, como foi o caso da CPI da Serasa, mais de dez anos atrás.
Manter Eduardo Cunha à frente da Câmara, depois da exposição pública das suas jogadas, será a completa desmoralização da oposição.
O dado curioso é que Cunha poderá ser pego pelo dízimo. Parte das propinas foi em espécie. Outras, transferidas através das contas de Fernando Baiano. As que têm as digitais de Cunha são para a Igreja Evangélica de Madureira. (Para continuar, clique aqui).
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Diz Nassif:
"De um lado, mostra a incrível facilidade com que, na Petrobras, se aprovavam contratos de mais de US$ 1 bilhão sem maiores precauções. Ninguém conseguiria agir livremente, à salvo dos controles internos da companhia, sem um padrinho político forte e pactos políticos que garantiam liberdade de atuação."
Seria cabível dizer que a incrível facilidade de aprovar contratos bilionários teve muitíssimo a ver com as normas de licitação que passaram a vigorar a partir de 1997/8 para a Petrobras, no governo Fernando Henrique: a Lei de Licitações - Lei 8.666/93 - deixou de ser levada em conta, e em seu lugar, por força da Lei 9.478/97 e Decreto nº 2.745, passou a vigorar o "Procedimento Licitatório Simplificado", válido exclusivamente para a Petrobras. O afrouxamento das cautelas resultou em que cada diretor passasse a ter autonomia para deliberar "monocraticamente" sobre quase tudo (Pedro Barusco, o gerente corrupto confesso, deixou isso enfatizado em sua delação, ao declarar que começou a receber propinas em 1998). A empresa, então, tornou-se altamente ágil, como queriam os defensores de sua privatização, a qual só não aconteceu em face da resistência dos que militam pelo interesse nacional.

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