A ARTE SALVA OS MUNDOS!
"Há pessoas que, quando partem, levam consigo, para a eternidade, um pedacinho de nós e deixam conosco, em nosso interior, uma bela fatia de si. Diante das carinhosas e espontâneas manifestações, pelo Brasil afora, dedicadas à pessoa de Lô Borges, em face de sua partida inesperada, pode-se afirmar categoricamente que ele é uma dessas raras criaturas.
Não apenas os sonhos, mas também a Morte, nossa grande irmã, nunca envelhece. Está lá, à nossa espera, de forma sempre peculiar. Ela não apenas nos silencia a todos igualmente, como é capaz de revelar o que fizemos, ao colocar em luz aspectos muitas vezes desconhecidos por muitos, fazendo emergir tesouros escondidos no fundo dos mares de nossa trajetória. Segredos repletos de amor. Afinal, amar é um movimento silencioso e gratuito; é a impossibilidade possível.
Chamar-se moço é chamar-se estrada, ofício da descoberta do porvir. Como em Santa Tereza, também eu comecei a minha descoberta de moço na Rua Rita de Sousa, no bairro de Casa Forte, no Recife, por meio de muitas brincadeiras e amizades construídas através delas: barra-bandeira, queimado, futebol, trinta e um alerta, batatinha frita um, dois, três, ralis de bicicleta, bola de gude. O encontro nas esquinas da rua era nossa razão de ser humanos.
Contudo, eis que a primeira grande noite me visitou aos 10 anos de idade: a partida abrupta do meu amado pai, devido a um acidente automobilístico. E, do fundo dessa tenebrosa noite, partiu minha voz: por quê?
Inicia-se, assim, uma nova caminhada, em meio a sóis e chuvas, em busca de encontrar uma nova manhã. Quantas pedras no meio do caminho, quantas superações e descobertas, quantos vacilos e derrotas, quantos recomeços.
Entre as descobertas da década de 1970, despontou, de forma estonteante, o pessoal do Clube da Esquina, com sua poesia quântica, sua musicalidade estelar e sua candura mineira. Por muitos anos, passaram a fazer parte da minha caminhada, como uma bússola — ora alentando a aridez do cansaço e do desânimo, ora iluminando as buscas e realizações do trem em movimento.
Até que, de repente, não mais que de repente, uma chuva delicada começou a irrigar o meu rio em seu correr para o mar. Uma chuva mineira que, ao encontrá-la, finalmente, eu pude descansar. Fui correndo até ela, à frente do sol, para chegar a tempo de vê-la acordar. Ela me acenou um beijo de paz, virando a minha cabeça. E o meu coração começou a bater mais forte, somente por ela. Juntos, começamos a fazer, há 44 anos, nosso sonho acontecer.
Acredito que muitas e muitas histórias poderão ser relatadas e relacionadas à magnânima obra artístico-musical de Lô Borges com o pessoal do Clube da Esquina. Afinal, a arte salva os mundos!"
(Por Alexandre Aragão de Albuquerque, homenagem sob o título acima, publicada no site 247, Aqui.
Alexandre, escritor, é mestre em Ciência Política pela Universidade Federal do Ceará).


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