segunda-feira, 15 de setembro de 2025

O MAIOR MÚSICO BRASSILEIRO DE TODOS OS TEMPOS


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Hesitei muito antes de me decidir pelo título acima. Ponderei comigo mesmo: mas, poxa, o Brasil é um celeiro de músicos imensos, para dizer o óbvio. Temos tantos craques na música quanto no futebol. O Brasil é o país do futebol e da música. Tivemos os eruditos Carlos Gomes e Villa-Lobos, incomparáveis; a carnavalesca Chiquinha Gonzaga, original e engraçada; tivemos os geniais Pixinguinha, temos pianistas excepcionais como João Carlos Martins, tivemos Tom Jobim, Baden Powell, Naná Vasconcelos... não seria ousadia demais eleger apenas um como o melhor? Concertistas brasileiros estão sempre no Olimpo musical, em todo o globo. Homens e mulheres. Eu certamente seria esculhambado, qualquer que fosse minha escolha. E quem sou eu para fazê-la, logo eu que não sei patavina de música — além de ouvir, é claro, há mais de sessenta anos. Abro um breve parêntese.

Aos meus 12 anos, por aí, fui entrevistado em um programa chamado “O ouvinte escolhe a música”, algo assim, apresentado por Enzo de Almeida Passos, na Rádio Bandeirantes, que ficava num predinho mixuruca perto do Mercado Municipal e não no Morumbi. Minha cartinha foi sorteada e eu deveria justificar, ao vivo, as minhas escolhas. Eu mal alcançava a altura do microfone sobre a mesa. O apresentador ficou com a pulga atrás da orelha. Não entendia como um pirralho como eu tinha escolhido músicas adultas de muito bom gosto, como “I Can’t Stop Loving You”, com Ray Charles, e “Momentos”, com Agostinho dos Santos. 

Continuando

Eu estive com Hermeto Pascoal apenas uma vez. Acho que foi no tempo dos dinossauros. Fui entrevistá-lo no Estúdio Eldorado, num dos andares altos do prédio com um relógio gigante no telhado, onde funcionavam as redações do Estadão e do Jornal da Tarde.

O que eu vi então nunca mais esqueci. A certa altura, ele começou a mexer na alça da capa do seu violão e, de repente, daquele objeto metálico banal e inexpressivo, manipulado por seus dedos grossos, brotou uma melodia harmoniosa e ritmada. Eu só acreditei porque estava vendo. A entrevista poderia terminar aí. Sem palavras. Suas palavras eram as notas.

Hermeto não era o homem dos sete instrumentos, mas dos n instrumentos. Ele não era só um incrível pianista, como tantos brasileiros talentosos, um maravilhoso saxofonista, como tantos brasileiros talentosos, baterista, flautista etc.; ele criava seus próprios instrumentos do nada, ele tocava qualquer coisa, ele era o alquimista: de qualquer coisa de que saía som ele fazia um instrumento de orquestra. Era isso, o Hermeto era uma orquestra, O que eu vi então nunca mais esqueci. A certa altura, ele começou a mexer na alça da capa do seu violão e, de repente, daquele objeto metálico banal e inexpressivo, manipulado por seus dedos grossos, brotou uma melodia harmoniosa e ritmada. Eu só acreditei porque estava vendo. A entrevista poderia terminar aí. Sem palavras. Suas palavras eram as notas.

Hermeto não era o homem dos sete instrumentos, mas dos n instrumentos. Ele não era só um incrível pianista, como tantos brasileiros talentosos, um maravilhoso saxofonista, como tantos brasileiros talentosos, baterista, flautista etc.; ele criava seus próprios instrumentos do nada, ele tocava qualquer coisa, ele era o alquimista: de qualquer coisa de que saía som ele fazia um instrumento de orquestra. Era isso, o Hermeto era uma orquestra, um virtuose com um Stradivarius ou com um abridor de lata. Nunca houve ninguém igual nem parecido.

Ele deixou uma grande obra gravada, ainda bem, e uma ainda maior não gravada, que ficou na memória de quem conviveu com ele, como eu, naquele encontro no Estúdio Eldorado."



  "um virtuose com um Stradivarius ou com um abridor de lata". 

(De Alex Solnik, artigo sob o título no topo, publicado no site Brasil 247 - Aqui).

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