segunda-feira, 12 de fevereiro de 2018

PAPO DE BOTECO

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Ao que tudo está a indicar, o assunto tratado na crônica abaixo - a exemplo dos tristes episódios que culminaram na morte do reitor Luiz Carlos Cancellier de Olivo, da UFSC (AQUI e AQUI) - será presença marcante na memória nacional. O que, diante da conjuntura, significa muito. (A propósito, leia 'arremate' publicado na parte final deste post).


África

Por Wilson Ramos Filho

Em um boteco carioca:
- E se o STF decidir que teto é teto cancelando o auxílio-moradia, mandando devolver o que foi pago indevidamente? 
- (Gargalhada) Em que mundo você vive, Xixo? Não mexerão em nada! Não são loucos. 
- Nem a mera suspensão do pagamento daqui para frente?
- Óbvio que não! Vocês petistas estão fora da realidade. Imagine a revolução que uma barbaridade dessas causaria! Os juízes e procuradores colocariam fogo no país.
- Como assim?
- Todas as causas contra a Globo e contra os demais veículos de comunicação teriam condenações exemplares e pedagógicas.
- Não entendi.
- Os juízes de todos os níveis têm poder. Com o apoio do Ministério Público iriam se vingar da imprensa e dos políticos. E com razão. Imagine um juiz ou um procurador com menos de dez anos de carreira que ganha entre 27 e 34 mil mensais e perde mais de 4 mil de uma hora para outra. Vão começar a louquear e com razão, repito, pois a maioria vai entrar no cadastro do Serasa! 
- Mas então...
- Esqueça! Ninguém seria insano ao ponto de reduzir o salário - que já é uma merda - de quem tem a garantia constitucional de irredutibilidade de vencimentos. 
- Não quero polemizar, mas não é tão ruim assim. Considere que 92% da população brasileira recebe menos que os R$ 4.300,00 do auxílio-moradia e que os juízes brasileiros ganham mais que os magistrados europeus ou estadunidenses. A opinião pública está atenta ...
- Bobagem. Isso é modinha, um moralismo hipócrita que logo sairá dos holofotes. 
- Com a proximidade da decisão no STF voltará...
- Até lá os políticos e a imprensa terão tempo para compreender que não devem mexer nesse vespeiro. 
- Se o auxílio-moradia é salário, sobre ele terá que incidir o Imposto de Renda, a Previdência ... essa então talvez seja a saída do STF ... mandar descontar dali para frente e recolher o imposto sobre o que vocês receberam nos últimos 4 anos ...
- (Gargalhada) Bebeu? Isso seria um tapa na cara da magistratura. 
- Mas se é aumento disfarçado para compensar ausência de reajustes ...
- Não temos culpa disso! Seria intolerável ter que recolher impostos sobre isso. Se a Dilma não tivesse vetado o reajuste de 78% aprovado pelo Eduardo Cunha no Congresso nada disso teria acontecido. Fizeram cagada!
- Vocês estariam com um salário de mais de cinquenta mil reais mensais ... isso também pegaria mal, principalmente agora depois do Golpe com o aumento da concentração de renda.
- Golpe, golpe, golpe, vocês não falam de outra coisa? Vocês acham que a população entende o que vocês dizem? Você tem consciência, né, de que o impeachment não teria passado se ela tivesse sancionado nosso aumento. Ela cutucou quem não devia. Foi muito burra. 
- Não foi golpe?
- Há controvérsias. Mas vocês petistas têm que reconhecer que a Reforma Trabalhista só aconteceu porque vocês não tiveram capacidade de articulação política para evitar o impeachment...
- Isso daria assunto para algumas horas de conversa. Voltemos ao tema do auxílio-moradia.
- Essa obsessão com os nossos salários já virou psicopatia! Esqueça. Nada vai mudar e se mudar no STF arrumarão um jeito de modular a decisão, aumentarão o teto, sei lá. 
- ?
- E as próximas viagens? Vai para onde?
- África.
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Fonte: Aqui.
(Wilson Ramos Filho [Xixo]), advogado aposentado, presidente do Instituto Defesa da Classe Trabalhadora).

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Para arrematar:

"Um conjunto de 18 mil juízes brasileiros, de 81 tribunais federais e estaduais, deixa de pagar cerca de R$ 30 milhões por mês de Imposto de Renda graças à isenção tributária de benefícios como auxílio-moradia, auxílio-alimentação e auxílio-saúde. Se os chamados penduricalhos fossem tributados da mesma forma que os salários, cada juiz teria de repassar, em média, 19% a mais para a Receita Federal. (...)."

(Clique aqui para ler a íntegra de "Com auxílios, juízes deixam de pagar R$ 360 milhões [por ano] de Imposto de Renda", publicado na edição de ontem do Estadão).
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Esclarecimento necessário:
A isenção tributária de que gozam os penduricalhos decorre do fato de que eles são classificados como 'Verba indenizatória', artifício que os torna infensos também ao teto remuneratório estabelecido no artigo 37 da Constituição Federal.

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