quarta-feira, 8 de julho de 2015

A CRISE NA GRÉCIA SEGUNDO SARDENBERG

"Carlos Alberto Sardenberg é comentarista de economia em diversos veículos das organizações Globo e defensor intimorato das políticas de austeridade. 


Age como um disciplinado autômato a serviço do mercado financeiro. Se amanhã os banqueiros decidirem que todos devem pagar taxas para respirar dentro de uma agência bancária (é só o que falta) não tenham dúvidas de que Sardenberg (em companhia de outros da mesma escola) fará ilustrados comentários provando por A + B que os banqueiros estão certos e que é um absurdo um cliente inspirar oxigênio e expirar gás carbônico, dentro das agências, impunemente. Seguindo esta mesma linha é que Sardenberg aborda o resultado do referendo na Grécia, quando o “não” venceu de forma acachapante. Vale a pena ouvir o áudio do comentário desta segunda-feira (6) na CBN (a rádio que troca a notícia). O ouvinte ficará encantado com a honestidade intelectual deste senhor, e a análise profunda que faz sobre a crise na Grécia.

“Grécia fará plebiscito de acordo que não existe”


O título acima (está na página da CBN) se refere ao comentário da última sexta-feira (3), antes, portanto do referendo, onde Sardenberg, já prevendo a derrota do “sim”, tentava desqualificar a consulta popular. Pois se alguém convoca um referendo sobre algo que não existe, o próprio referendo não tem qualquer valor. E o comentário desta segunda reforça este entendimento. Sardenberg diz que os gregos votaram “não” a um acordo (acordo este que seu comentário anterior tinha asseverado que não existia) com os credores e que agora vão negociar “um outro acordo que trará as mesmas coisas que o acordo anterior”. Realmente, este referendo teve, assim, pouca importância. Porém, as manchetes do jornal O Globo desta segunda berram “Líderes europeus convocam reunião de emergência”, “Europa em busca de respostas”, “Grécia recusa, nas urnas, austeridade imposta por credores e põe em xeque futuro do Euro”. A chanceler alemã, Angela Merkel, marcou para esta terça-feira (7) uma reunião com o primeiro-ministro da Grécia para novas conversações. Preocupações vãs. Até parece que este povo não ouve os pertinentes comentários do Sardenberg.

Como se divide a Europa, segundo o Sardenberg


Reforço o conselho para que ouçam o comentário no link acima. É uma aula de geopolítica europeia. O comentarista diz que a Europa se divide em “países devedores e países credores”. No primeiro grupo estão países como Grécia e Portugal. No outro estão nações como Alemanha, Inglaterra e França. Sardenberg não perde seu tempo precioso para explicar o porquê desta situação. Afinal é evidente: certamente alguma eugenia divina transforma povos inteiros em devedores e povos mais afortunados em credores, e está acabado. Conversa fiada sobre interesses de grandes corporações financeiras que criam mecanismos (com a ajuda de economistas convenientes) para que países fiquem reféns eternos da agiotagem internacional são evidentemente fábulas comunistas.

O que causou a crise grega? Sardenberg responde


Sardenberg é muito didático em seu comentário, esclarecendo ao ouvinte que a crise grega se deve ao fato de a Grécia não ter seguido a receita de austeridade recomendada pela chamada “troika” (Banco Central Europeu, Comissão Europeia e Fundo Monetário Internacional). Diz Sardenberg que a “Espanha fez o ajuste e está indo bem. Portugal fez um ajuste e está indo bem. Irlanda fez um ajuste e está indo bem. Itália fez um ajuste e está indo bem”. Já com a Grécia Sardenberg é implacável, fez muito pouco ou quase nada (do que a troika mandou) e está pagando o preço. Simples, não? Realmente, Espanha, Portugal, Irlanda e Itália estão bem, mas não para seus povos. Talvez para uma parcela muito privilegiada, justamente aquela que Sardenberg mais tem interesse em defender. Pois na Espanha o desemprego hoje é de 23,78% e entre os jovens passa de 50%. Em Portugal o índice de desemprego é de 13,7% (35% entre os jovens). Na Irlanda é de 9,9% (entre os jovens, 20,20%) e na Itália é de 12,4% (entre os jovens chega a 42%). Mas estes países estão indo bem seguindo a receita de austeridade que Sardenberg tanto apregoa. Como se sabe, o mundo está acabando é no Brasil (7,9% de desemprego geral e entre os jovens 17,6%).

A Grécia não seguiu a receita?


Em 2010 o Pasok (partido que então era o que dominava o governo grego), em troca de receber 110 bilhões de euros como empréstimo, cedeu a uma política econômica de austeridade imposta pela troika. Como estavam aplicando o receituário neoliberal muito bem, houve um segundo empréstimo, em março de 2012, de 130 bilhões de euros. Portanto, a dívida foi para 240 bilhões de euros, ou 175% do PIB grego. Mas a crise só aumentava, chegando ao ponto de 30% dos gregos terem sido levados à miséria. Mas Sardenberg (e outros da mesma escola) sustentam que a Grécia não aplicou o receituário da troika (ouçam o áudio, ouçam o áudio!). Sardenberg fala isso com a tranquila certeza de um oráculo, embora a sua opinião esteja longe de ser uma unanimidade. Por exemplo, o norte-americano Joseph Stiglitz, ex-economista chefe do Banco Mundial (e que, portanto, definitivamente, não é comunista, nem petista, nem bolivariano), Prêmio Nobel de economia em 2001, diz que a receita de austeridade da troika foi a responsável pela crise ter chegado a este ponto e defendeu o voto “Não”. Mas quem é ele perto do Sardenberg? Ou da Miriam Leitão? Do Merval eu nem falo, seria humilhar o Stiglitz.

Sardenberg releva a verdade: a culpa da crise na Grécia é do Lula


Aliás, o inefável Carlos Alberto Sardenberg publicou recentemente um texto intitulado “Enganaram Tsipras”, onde através de uma "ironia pronta" diz que Lula e Dilma têm culpa na crise grega. Escreveu Sardenberg: “Há dois anos e meio, Alexis Tsipras, então um jovem aspirante a líder europeu, esteve no Brasil para ouvir o conselho de Dilma e Lula. Ouviu que políticas de austeridade só levam ao desastre e que era preciso, ao contrário, aumentar o gasto público e o consumo. E não é que ele, eleito primeiro-ministro, seguiu o conselho (...) Tsipras (agora) está muito ocupado com a confusão que armou. Mas ainda assim poderia tomar um tempinho para telefonar ao mentor e à mentora brasileira: e o que eu faço agora, hein?”. Então, ficamos combinados assim: Em 2012 (fora do poder) Tsipras visita Lula e Dilma. Não se sabe bem a razão pela qual Lula e Dilma iriam tentar convencer Tsipras de uma coisa da qual ele estava mais do que convencido, pois o grego já era conhecido internacionalmente por ser contra a política de austeridade da troika, mas se Sardenberg disse... Daí, em 26 de janeiro de 2015 Tsipras assume o cargo de primeiro-ministro em seu país e nestes poucos meses (seguindo conselhos de Lula e Dilma) leva a Grécia à atual situação. Haja ironia.

Pausa no modo irônico


Uma pausa no modo irônico para ressaltar o seguinte: Um comentarista como Sardenberg é a expressão pronta e acabada da indigência intelectual e da completa falência ética da nossa apodrecida mídia hegemônica. O triste nessa situação é que muita gente, por não ter acesso a outras visões, acaba engolindo estas asneiras, ditas com ar de grande autoridade e maior ainda cara-de-pau.
"






(Do portal Vermelho, post intitulado "A crise na Grécia, segundo um comentarista da Globo" - aqui.

Nenhuma surpresa. Carlos Alberto Sardenberg está onde sempre esteve. 

Afora as muitas análises que certamente pululam por aí, inclusive as já divulgadas neste blog, é merecedora de reflexão a que se segue:

"Qualquer comparação entre distintas realidades nacionais nasce morta se omitidas ou negligenciadas as realidades concretas, mas a pátria do Syriza também traz lições universais.


Estratégias de mudanças sem conflito são eficazes apenas em períodos de bonança, quando a interseção entre transformação e paz se amplia porque o Estado tem mais recursos para investir na melhoria da vida dos pobres sem afetar a fortuna e os interesses dos ricos.
Nas épocas de escassez, esta zona de conforto desaparece.
Somente há mudanças se houver conflito, o instrumento político pelo qual a sociedade distribui renda, poder e riqueza.
Se a regra central for evitar enfrentamentos, não há mudanças. Normalmente impera o retrocesso e a capitulação.
As forças progressistas, quando seguem esta senda conciliatória sem base objetiva, geralmente são tragadas pela paralisia, sofrendo todos os males do enfraquecimento político, incluindo a desmoralização perante eleitores e apoiadores.
O resultado prático, nestas circunstâncias, é deixar o terreno fértil para a ofensiva das forças mais reacionárias, que se aproveitam das contradições e confusões para impor sua agenda e ditar o ritmo da vida política.
Mais grave quando, para se evitar o confronto a qualquer custo, quebra-se o cristal da coerência, criando um fosso entre o discurso de sedução eleitoral e a prática de governo.
O Syriza extraiu estes ensinamentos da história grega e do movimento socialista mundial.
Obviamente atento aos limites da situação política e econômica, além das fragilidades objetivas da Grécia, o partido de Tsipras revela muita flexibilidade tática na negociação com os centros imperialistas europeus.
Sua marca de corte, no entanto, não é evitar o conflito, mas viabilizar a mudança, o que implica fundamentalmente construir maioria nacional e solidariedade mundial para embates inevitáveis.
Avanços e recuos, operados com a necessária maleabilidade, parecem submetidos a um rigoroso objetivo estratégico: gerar uma outra correlação de forças na Europa, forçando ao máximo a disputa com a Troika, até que se criem as possibilidades de uma nova ordem econômica.
Preferencialmente parida por acordo. Se necessário e inevitável, pelo fórceps da ruptura.
A lógica da tática, assim, não se apresenta como instrumento destinado a obter pequenas concessões, mas caminho para construir um bloco capaz de combater a ditadura do capital financeiro.
Esse foi o papel do plebiscito de domingo. (...) " - (Para continuar a leitura da análise produzida por Breno Altman, clique AQUI).

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