sexta-feira, 2 de setembro de 2016

OS DIREITOS DE DILMA ROUSSEFF


"Jornalista Paulo Henrique Amorim: O ministro do Supremo Gilmar Mendes disse que a decisão do Senado de preservar os direitos políticos da presidenta Dilma Rousseff foi uma decisão "bizarra". É bizarra ou é legal?
Procurador Eugênio Aragão, ex-ministro da Justiça - Me parece que o ministro Gilmar Mendes não leu o livro de Direito Constitucional do presidente - agora presidente, investido no golpe - Michel Temer. Que, no seu livro mesmo, admite que o Senado pode ou não aplicar a pena da perda dos direitos políticos.
Deixa eu só ler aqui a citação… é muito interessante. O jurista Michel Temer, em sua obra "Elementos do Direito Constitucional", em sua 22a. edição, segunda tiragem, na página 169, defende que: "o artigo 52, parágrafo 1 da Constituição fixa duas penas: a) pena de perda do cargo; e b) a inabilitação por oito anos para o exercício de função pública."
E o que que ele diz a respeito disso? "A inabilitação para o exercício da função pública não decorre da perda do cargo. Não é pena acessória. Mas decorre da própria responsabilização, cujo julgamento é de natureza política, verdadeiro juízo de conveniência e oportunidade que não obriga o Senado, tipificada a hipótese de responsabilização, necessariamente a impor".
Isso aqui, ipsis litteris, Michel Temer, na obra "Elementos do Direito Constitucional". Então, tem alguma coisa errada aí. Quer dizer que a doutrina agora, também, é seletiva a sua aplicação? Não é isso? Nós temos já vazamentos seletivos, depois nós temos a indignação seletiva de Sua Excelência, e agora nós temos, também, a doutrina seletiva caso a caso.
Mas, para quem diz que ele não quis ofender os bêbados, quando falou mal da lei da ficha limpa…
Enfim, se isso não for um comportamento indecoroso, fora do esquema, fora do dever de decoro que a todo magistrado compete, o que será falta de decoro?
Então, isso não surpreende. Isso não surpreende. Partindo de quem partiu, não surpreende.
Ministro, por que não se pede o impeachment do ministro Gilmar?
 Bom, aí é uma questão de ter gente pra fazer isso e de probabilidade de seu acolhimento no, vamos dizer... nesse ambiente político em que nós vivemos hoje. Não se esqueça que o ministro Gilmar Mendes, na segunda turma do STF, ele é um dos que julgam os agentes políticos envolvidos na Lava Jato. Não é isso?
Então, os agentes políticos envolvidos na Lava Jato, alguns deles no Senado, terão muito cuidado em querer desagradar o ministro Gilmar Mendes.
A presidenta Dilma Rousseff pode se candidatar a um cargo político? O cargo de senadora, por exemplo?
Pode. Sem problema nenhum. Sem problema nenhum. No momento em que o Senado não aplicou essa pena à presidenta Dilma Rousseff... Agora este ano não, porque os prazos de registro já se encerraram. Mas, em 2018, sem dúvida nenhuma pode concorrer a qualquer cargo político.
Inclusive Presidente da República?
Eugênio Aragão: Inclusive Presidente da República.
O senhor acha que o Supremo, finalmente, vai se pronunciar sobre o mérito do impeachment?
Isso a gente não pode antecipar. Para nós, a tese é muito sólida, (diante) dos desvios que houve no curso do julgamento. Mas, enfim, eu não quero me manifestar. Como eu não tenho bola de cristal, não quero me manifestar sobre o que o Supremo pode fazer ou pode não fazer.
O senhor acredita que a decisão do Procurador Geral - e o senhor é um Procurador da República - de congelar ou fechar o processo de delação premiada de um líder da OAS tem o efeito prático, político de acabar com a Lava Jato, manter lá dentro da cadeia só os petistas e os não-petistas ficarem do lado de fora?
Eugênio Aragão: Olha, é uma hipótese. É uma hipótese legítima de se pensar. Não estou dizendo que se vai fazer isso, que está deixando de fazer, mas é uma hipótese legítima de se pensar, tendo em vista mais uma seletividade não explicada na desistência de uma das delações.
De qualquer sorte, o que a gente vê é que nos últimos tempos, uma vez concluído o processo de derrubada do PT do poder, nós estamos vendo que a Lava Jato vai, agora, muito mais passos de cágado, não é isso?
Qual o estado da ordem jurídica brasileira, findo o processo do impeachment da presidenta Dilma Rousseff?
Eugênio Aragão: Tudo é muito triste. Porque, de repente, os argumentos jurídicos são distorcidos, contorcidos, redobrados, à vontade do freguês. Me parece que nós vamos ter um tempo muito longo de escuridão - não só na política mas, também, na respeitabilidade das instituições. As instituições vão precisar de um esforço muito grande para readquirir a respeitabilidade do público.
Infelizmente, me parece que essa é a principal consequência desse processo. A nossa República saiu, sem dúvida nenhuma, muito fortemente maculada do Golpe, da esperteza, da falta de escrúpulos, da atuação de bandos - para não falar de matilhas - contra o poder constituído. Isso, infelizmente, vai ter consequências duradouras até que a gente possa reconsolidar um pacto nacional e dar algum tipo de estabilidade e respeitabilidade, um pacto que reconstitua a confiança da coletividade nas suas instituições."



(De Eugênio Aragão, procurador da República e ex-ministro da Justiça, em entrevista ao jornalista Paulo Henrique Amorim, post intitulado "Aragão e Dilma: Gilmar não leu Temer" - AQUI).

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