segunda-feira, 26 de setembro de 2016

REFORMA DO ENSINO: A SÍNDROME DE FROTA


A visão da gestão de padaria de Maria Helena, do MEC

Por Luis Nassif

No início dos anos 90 tiveram início os programas de qualidade no país. Naquele aprendizado inicial, os consultores limitavam-se a identificar os principais processos em cada organização e a redesenhá-los, visando aumentar sua eficiência.
Era uma espécie de bê-a-bá da gestão, na qual era mais importante conquistar um ISO 9000 do que melhorar o desempenho da empresa.
À medida em que as empresas foram evoluindo, devidamente assimilados, os programas de qualidade passaram a ocupar um lugar secundário. E a gestão passou a recorrer a instrumentos mais sofisticados visando o objetivo-fim, como o planejamento estratégico, a discussão de novos métodos para a área de recursos humanos, a descoberta de novas qualidades exigidas dos gestores e funcionários.
O próprio Prêmio Nacional de Qualidade incorporou um conjunto maior de indicadores, para evitar essa prisão a um indicador só, em detrimento dos demais. E o papel do RH (Recursos Humanos) passou a ser central. Motivação do funcionário, capacidade de auto avaliação de seu trabalho, estímulo à criatividade, tudo isso passou a contar na avaliação dos modelões de gestão.
Da equipe de Paulo Renato de Souza no MEC, Maria Helena Guimarães Castro sempre foi o estereótipo acabado do gestor cabeça-de-planilha que aprendeu as primeiras lições e não mais evoluiu. Sempre pertenceu à parcela dos gestores que colocam os meios na frente dos fins. Esse tipo já foi extirpado das empresas mais modernas do país, mas persistiu na educação de São Paulo.
Em nenhum outro setor, a motivação é mais relevante do que na educação. Uma empresa pode ter vendedores desmotivados, desde que o produto seja bom. Mas na educação o produto final é o próprio trabalho do professor. E quando se montam políticas públicas federais, a adesão dos professores ao projeto pedagógico é elemento central. A consolidação dessas políticas se dá através da troca de experiências, da identificação das experiências bem sucedidas, da assimilação dos ensinamentos pelas Faculdades de Pedagogia.
Em vez de uma visão sistêmica e sofisticada, Maria Helena transformou toda a gestão escolar em um desafio para gerentinhos, privilegiando diretores que soubessem fazer o livro caixa, cuidar do dia-a-dia, da limpeza, da merenda etc. Um desperdício completo! A micro gerência, que deveria ser trabalho de um funcionário menor, do administrativo, acabou se constituindo no único papel do diretor, desviando-o do produto final, o ensino do aluno. Equivale a uma empresa colocar o diretor de um departamento para conferir a entrada de cargas no pátio.
Lembro-me de um Prêmio de Gestão do Estado de São Paulo, do qual fui um dos jurados. Minas e São Paulo tinham lançado sua reforma educacional. No júri havia um técnico da McKinsey que participara dos dois projetos e me explicou a maneira como cada qual foi implementado.
Em Minas, o projeto foi amplamente discutido com professores, diretores, com pedagogos, com a Universidade. Em São Paulo, gestão Maria Helena, enfiou-se goela abaixo dos professores. Uma gerente na cabeça da Secretaria da Educação, com algumas estatísticas na mesa e nenhuma ideia na cabeça. Não pegou.
A ignorância tecnocrática de Maria Helena nunca aceitou o óbvio: que o professor é elemento central na educação, o ponto de ligação com o aluno. Sem professores endossando projetos pedagógicos, não se chega até a ponta do cliente (para usar uma terminologia que ela gosta), o aluno.
Nos últimos anos, houve enormes avanços na interação entre os diversos agentes da educação. As Conferências Nacionais promoveram a troca de informações e conceitos entre Secretarias de Educação, sindicatos de professores, ONGs empresariais, permitindo a consolidação de consensos, expressos no Plano Nacional de Educação.
De repente, um Ministro da Educação totalmente jejuno, ao ponto de receber propostas do ator Alexandre Frota, tendo Maria Helena como Secretária Executiva, tenta promover mudanças radicais na Educação – um setor que mexe com milhões de alunos, milhares de escolas e professores – através de uma Medida Provisória.
Convoca as ONGs empresariais em Brasília para celebrar o gol. E o Jornal Nacional é obrigado a forçar declarações compungidas de lideranças empresariais sobre o tema – como a diretora de Todos Pela Educação e Viviane Senna -, claramente decepcionadas com o estardalhaço montado em torno de uma Medida Provisória e explicando (nas frases editadas do JN) que mudanças dessa envergadura não podem ser feitas a toque de caixa e com Medida Provisória.
No ano passado, a ocupação das escolas estaduais paulistas foi um clarão em cabeças pedagógicas mais abertas. Estudantes de baixa renda, nos pontos mais afastados, tiveram uma luta pela escola. Montaram palestras interdisciplinares nos finais de semana, levantaram temas contemporâneos, como o machismo, a tecnologia. Nas mãos de qualquer educador, seria ouro puro.
Mas Maria Helena ficou fiel ao seu padrão de gerente de padaria.
(Fonte: Jornal GGN - aqui).

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