No começo dos anos 90, o ritual se repetia: uma ou duas vezes por semana, após o trabalho íamos bebericar, "salvando o mundo" várias vezes. Eu fazia parte do bloco dos anacrônicos, pois defendia um Estado forte e um mercado livre-até-certo-ponto. Meus oponentes defendiam o contrário, entusiasticamente. É que o neoliberalismo grassava, o Consenso de Washington imperava desde o final de 1989, quando o economista inglês John Williamson, diretor do Institute for International Economics, presidiu um seminário em Washington, reunindo titulares do governo Reagan, Fundo Monetário Internacional, Banco Mundial e Banco Interamericano de Desenvolvimento, entre outros, e lá chegou-se ao Consenso, traduzido em dez mandamentos, corolários do neoliberalismo, entre os quais ressaltavam o "Estado mínimo" (educação, saúde e infra-estrutura), "menor progressividade dos impostos diretos", "taxa de câmbio favorecida", "liberdade total ao capital externo", "privatização" e "desregulação do processo econômico, incluindo o aspecto mão-de-obra". Era simplesmente o retorno ao laissez-faire de Adam Smith e David Ricardo, só que agora num mundo dominado por corporações gigantescas e especuladores arquitetando as mais iluminadas "engenharias financeiras" (derivativos...). E quem dissentisse que se danasse: nada de apoio do FMI, BIRD, BID etc.
E assim, enquanto a "modernidade" ia fluindo, prosseguiam os debates regados a cerveja, quando o mundo era salvo várias vezes. Haja guardanapo pra rabiscar balanço de pagamentos e outros esquemas! O México abraçou o NAFTA, o Brasil escapou da ALCA (faz lembrar discurso antigo de partido radical) mas não da privataria escandalosamente lesiva aos interesses nacionais, Tio Sam deu continuidade à ordem mundial da sangria ininterrupta - até o momento em que o sangue escasseou e o neoliberalismo deu com os burros n'água, afogando touros (vide Wall Street), atolando vacas no brejo e pedindo arreglo ao Estado, tábua final de salvação, que nem se sabe ao certo quando chegará, e quanto sofrimento, até lá, será infligido ao povo americano e do resto do mundo.
As charges acima foram feitas no início dos anos 90. Bons tempos aqueles (pros neolibs), hein?
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