sexta-feira, 31 de março de 2023

OS MISTÉRIOS DO NOVO ARCABOUÇO FISCAL

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"Autores do pacote fiscal são técnicos de competência confirmada; que se aguarde a divulgação da íntegra, para entender melhor".
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Eis a observação feita pelo arguto analista Luis Nassif. 
Concordamos com Nassif, mas fazemos questão de enfatizar a competência - notadamente política - de Fernando Haddad, que soube 'guardar' convenientemente o pacote. Se o conteúdo do novo arcabouço guardar coerência com o discurso do Ministro nos encontros mantidos (e se forem aprovadas as anulações de desonerações injustificáveis, além de a estrutura da Receita der conta do trabalho que poderá vir), suas diretrizes surtirão os mais sadios efeitos para o Brasil. Boa sorte. E vamos à análise do perspicaz Luis Nassif:


Por Luis Nassif

Hoje se desfará o mistério sobre o chamado novo arcabouço fiscal. Pelo que vazou até agora: 

Há muitas dúvidas em jogo.

O governo Bolsonaro-Paulo Guedes deixou um país desmontado com atrasos significativos no financiamento de vários setores. O governo poderia alinhar as despesas e começar a nova regra em cima de um novo patamar, de despesas mais elevadas. Mas aí entra a outra promessa, de zerar o déficit no próximo ano.

Aí se entra efetivamente na quadratura do círculo.

A recuperação da economia – e das receitas – depende fundamentalmente da política monetária do Banco Central. Com Selic a 13,75%, é impossível se pensar em qualquer forma de recuperação.

Mais que isso. Há um maremoto de empresas caminhando para a recuperação judicial, e um aumento expressivo da inadimplência. A possibilidade de renegociar as dívidas aliviará a situação de muitas famílias, mas as taxas de juros não abrirão espaço para aumento dos financiamentos. Investimentos públicos são essenciais para a recuperação da economia – como reconhece a própria Fazenda. Mas investir como, amarrado por essas regras?

De seu lado, o Banco Central mostrou que está atuando politicamente. Teve até a ousadia de ameaçar o BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social): se definir custo do dinheiro inferior à Selic, o BC responderia com aumento de juros.

O Ministro da Fazenda, Fernando Haddad, já demonstrou que atuará estritamente dentro das regras do jogo, ainda que leve a economia para um barranco.

A única esperança é o processo de deterioração rápida da imagem do BC, com sua insistência em mostrar força. Mesmo no mercado começaram a pulular críticas contra o BC, já que a política monetária não apenas mata o mercado de consumo, quebra empresas, mas inviabiliza fundos de investimento em qualquer espécie de ativo que não seja títulos do Tesouro.

Ontem, um integrante da equipe da Fazenda anunciou outra medida mágica: a desburocratização e o fim do teto de juros para o mercado de dívida não bancário. Segundo a lógica, o mercado não-bancário não empresta por conta do limite de remuneração. Acabando com o teto, significa que o mercado poderá emprestar a taxas superiores às do sistema bancário. Obviamente, a clientela será constituída de empresas que não conseguiram apresentar garantias aceitas pelo sistema bancário. Para compensar o risco de inadimplência, as taxas terão que ser bastante superiores ao teto. Em que isso aliviará o mercado de crédito?

Em suma, pelo que saiu até agora, não se consegue ver lógica no pacote. Mas como seus autores são técnicos de competência confirmada, que se aguarde a divulgação da íntegra para entender melhor a lógica. - (Aqui).

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Os comentários dos leitores do Jornal GGN estão entre os mais aclamados. Selecionamos dois deles:

.Da leitora Elena:
"De seu lado, o Banco Central mostrou que está atuando politicamente. Teve até a ousadia de ameaçar o BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social): se definir custo do dinheiro inferior à Selic, o BC responderia com aumento de juros". Meu Deus! Como a arrogância do tal Roberto Campos Neto é monstruosa, gente! O que ele pensa que é? Se autointitulou presidente do país? Um sem voto agora manda em tudo? O povo tem que colocar esse arrogante em seu devido lugar!!!"

.Do leitor Wilson Ramos:
"Mesmo não tendo ainda todos os detalhes, parece que as medidas contemplam os diversos interesses em jogo. Tanto do lado da possibilidade de ampliação de gastos como também das salvaguardas para contenção da dívida. O ingrediente contra cíclico deverá vir na definição de bandas para o resultado primário, ideia que Paulo Nogueira Batista tem recomendado em seus artigos. Não se pode esquecer também que alguma coisa pode ter sido deixada para o Congresso emendar, já que não podem passar como meros expectadores e aprovadores. Como Lula parou de bater no BC, deixando para os parlamentares as críticas necessárias, dependendo da repercussão, será possível discutir e rever a meta de inflação pelo CMN em Junho, como de hábito. Não tendo a meta irrealista para perseguir, o BC não tem desculpa para o juro exagerado. Mesmo que tente burlar, pois aí um processo de destituição da diretoria seria justificado."

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