domingo, 5 de fevereiro de 2023

ÓDIO À DEMOCRACIA

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A exibição da série Extremistas.br iniciou-se no mês passado, mas isso é irrelevante: ela, em face do que se está a ver, segue em pleno curso, atualíssima. 
"O Brasil ainda terá muito trabalho para desfazer esse caldo de ódio e incultura em que ferve o extremismo de direita". 


Por Carlos Alberto Mattos

Nenhum programa pode ser mais oportuno neste momento do que a série extremistas.br, em cartaz na Globoplay. Os três primeiros dos oito episódios já estão na plataforma e observam personagens e movimentações da extrema-direita brasileira. A série de Caio Cavecchini é produção da Globo, contando portanto com o vasto acervo da emissora para ilustrar uma ampla reportagem conduzida nos últimos dois anos. Notavelmente atualizada, já incorpora os fatos do 8 de janeiro, quando a turba golpista atacou Brasília. 

O primeiro episódio, “Indignação”, trata da retórica de guerra adotada pelos militantes bolsonaristas contra a “ameaça comunista” representada pelo PT. A empresária Rosângela Peçanha é vista se desdobrando no apoio a figuras como Daniel Silveira e Roberto Jefferson, e no “enterro” de ministros do STF. Um operador de redes digitais não identificado expõe seu método de trabalho baseado na produção de mal-estar a favor de quem o contratar. No contraponto, as câmeras seguem André Janones em sua guerrilha internética contra o bolsonarismo.

A série extremistas.br se vale de muitos materiais de arquivo e gravações diretas, mas insere também toques de análise que ajudam a produzir sentido sobre o que é exibido. No segundo episódio, por exemplo, o filósofo Pablo Ortellado mostra o acompanhamento da cena extremista por um grupo da USP. “Sitiados” trata basicamente da politização das polícias e das Forças Armadas nos últimos anos, como uma resposta aos clamores golpistas de “Socorro, senhor general!”. O surto paranoico do policial Wesley Góes no Farol da Barra (Salvador) e o assassinato do petista Marcelo Arruda em Foz do Iguaçu são sintomas desse fenômeno, cuja contraparte foram os acampamentos diante dos quartéis, vergonhosamente tolerados pelo Exército até o clímax do 8/1.

No terceiro episódio, “Armados em nome de Deus”, discute-se a conexão entre religião e armamentismo. Fuzis sendo abençoados em igreja e os cursos de “defesa pessoal” ministrados pelo delegado e deputado armamentista Paulo Bylynskij (que se diz salvo por Deus de um atentado cometido por uma antiga namorada) exemplificam o cinismo fundamental desses extremistas. As vozes contrárias pertencem aqui ao pastor Nilson Gomes, que se opõe à instrumentalização eleitoral dos evangelhos, e o pai da jovem Liana Friedenbach, estuprada e assassinada em 2020. Defensor dos direitos humanos, ele repele a apropriação do crime pelo discurso do ex-presidente no sentido de promover o armamento da população.

Uma certa poluição gráfica e um ritmo intenso são parte da estética da série. Nesses três primeiros episódios, algumas ações e personagens transbordam de um para o outro, configurando uma razoável unidade nas hordas bolsonaristas. A impressão que fica é clara: o Brasil ainda terá muito trabalho para desfazer esse caldo de ódio e incultura em que ferve o extremismo de direita.  -  (Fonte: Carmattos - Aqui). 

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