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Um 'Pãe' Dedicado e Uma Menina Fenomenal
Por Carlos Alberto Mattos
Existe um tipo de filme em que nada de muito importante acontece, mas esse não acontecer acaba ficando mais importante do que qualquer eventual acontecimento. Assim é Mirador, produção curitibana dirigida por Bruno Costa. Há, claro, uma ocorrência que lança a história: Michelle some no mundo, deixando para trás a mãe, a filha pequena e o pai desta, o boxeador Maycon. Ele tem que assumir os cuidados com a menina, além de se virar para ganhar algum dinheiro. Fará isso lavando pratos num restaurante, pegando biscates de carregador e eventualmente usando o corpo em atividades, digamos, menos sóbrias.
A meio caminho, acontece também uma morte que trará outro ingrediente ao cotidiano de Maycon. Mas nada disso é apresentado como fatos especialmente dramáticos. São apenas as esquinas do destino que fazem Maycon reinventar-se como “pãe” e enfrentar a luta (em muitos sentidos) por uma vida um pouquinho melhor.
No boxe, ele precisa perder peso e conquistar a confiança dos agentes e de si próprio. Nas outras ocupações, necessita testar sua capacidade de resistir ao autoritarismo e ao constrangimento. Coisas passíveis de suceder a qualquer pessoa normal como o pernambucano Maycon. Eis um personagem que não apela à nossa identificação, nem a alguma simpatia especial. Como o protagonista do recente – e também ótimo – Rio Doce, ele é discreto e se deixa narrar mais pelo entorno do que por suas próprias atitudes.
O ator Edilson Silva (do elenco de Bacurau) compõe Maycon com eficácia e uma enorme destreza nas cenas de boxe e na relação física com sua motocicleta. Mas é no seu contato com a pequena Malu que o filme ganha os momentos de maior graça e emotividade. A menina Maria Luiza da Costa é um fenômeno de descontração diante da câmera, tornando difícil acreditar que não exista ali uma relação real de pai e filha. A cena do acalanto com uma cantiga típica pernambucana, que ressoa nos créditos finais, é de uma beleza inesquecível.
Bruno Costa lança mão de uma linguagem econômica e elegantemente elíptica, na qual transparece tanto o senso de observação humana quanto do melhor cinema independente contemporâneo. Qualidades que se espelham também nas rubricas técnicas, com destaque para a fotografia impecável de Elisandro Dalcin e a montagem refinadíssima de Matheus Kerniski.
Mirador foi exibido na Mostra de Tiradentes e no Olhar de Cinema. Venceu a competição do festival de cinema ibero-americano de Miami, cujo júri era integrado por dois grandes cineastas latino-americanos, a mexicana Tatiana Huezo e o guatemalteco Jayro Bustamante. A fofíssima Maria Luiza só mais adiante vai compreender o que significa a menção honrosa recebida no Festival de Vitória. - (Fonte: Blog Carmattos - Aqui).
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