A inflação dos monetaristas
Por André Araújo
No cenário econômico que vem da Europa pós-napoleônica até a Primeira Guerra, as moedas tinham em geral lastro ouro e a inflação era um fenômeno raro. No período conturbado do entre-guerras, 1918 até 1939, os desajustes provocados pela Guerra Mundial e a descolamento de moedas de seus lastros metálicos provocaram inflação em muitos países importantes.
O fenômeno era então visto como um problema dos ciclos econômicos, no caso alemão, por conta de reparações impagáveis.
O fenômeno era então visto como um problema dos ciclos econômicos, no caso alemão, por conta de reparações impagáveis.
Mas foi após a Segunda Guerra e da nova ordem econômica mundial e especialmente após o advento da segunda escola monetarista - cuja história narrei em meu livro Moeda e Prosperidade, onde o personagem central foi Milton Friedman (na primeira Escola era Irving Fisher) - que conseguiu pregar a verdade revelada do monetarismo como ideologia política, criando seguidores na academia e na banca e em centros de pensamento como a U. de Chicago, a partir de um grande circuito de conferências e publicações financiadas pelo City Bank de Nova York.
A partir da pregação de Friedman e seus seguidores criou-se então uma crença santificada na imperiosa necessidade de não haver inflação sob nenhuma hipótese, a moeda estável passou a ser o totem da higidez de qualquer economia.
Essa crença é ideologia porque a moeda estável é um pressuposto fundamental não para a economia produtiva mas para os mercados financeiros. É com base na moeda estável que se torna possível a gigantesca indústria dos derivativos, fundos de investimento, alavancagens sofisticadas, swaps cambiais, em suma, o capital financeiro dos fundos de hedge, da venda de planos de aposentadoria de longo prazo. Dessa crença surgiu uma seita, a das metas de inflação, a serem perseguidas como o Santo Graal não importa com qual custo para a economia produtiva e o emprego, tudo poderia ser reduzido a escombros desde que se mantivesse a meta de inflação fixada lá atrás.
A questão da inflação vista por monetaristas é portanto IDEOLÓGICA e não requisito inexorável para a economia produtiva funcionar, como pregam os monetaristas. Os próprios Estados Unidos são exemplo: o dólar de hoje vale VINTE VEZES menos que em 1945, os EUA convivem com inflação regular há décadas.
No Brasil pós 1945 a inflação constante, especialmente após o Governo JK, não impediu enormes taxas de crescimento, as maiores do mundo no Século XX, e um regime em geral de pleno emprego e prosperidade.
A economia pode funcionar por periodos consideráveis com inflação e crescimento de emprego e renda.
A crença de que a inflação é uma desgraça é o credo dos monetaristas, quase todos ligados ao sistema financeiro.
Entre esses mitos por eles pregados à exaustão:
PRIMEIRO MITO: A inflação prejudica mais o pobre porque seu salário durante o mês se desvaloriza.
PRIMEIRO MITO: A inflação prejudica mais o pobre porque seu salário durante o mês se desvaloriza.
REALIDADE: O pobre é mais esperto do que os monetaristas imaginam. Se defendem comprando todos os itens vitais assim que recebem o salário, não ficam com o dinheiro no bolso esperando a desvalorização.
SEGUNDO MITO:Com a inflação é impossivel para o povo planejar o futuro.
REALIDADE: O povo se defende construindo casa tijolo a tijolo, quarto a quarto, milhões de residências de bairros pobres foram construídas em tempos de inflação, em lotes comprados em época de inflação em prestações fixas.
TERCEIRO MITO: Com inflação as empresas não conseguem crescer.
REALIDADE: O grande crescimento industrial do Brasil se deu exatamente em épocas de inflação.
A inflação não é um fato econômico positivo, mas por certos períodos não é o demônio que os monetaristas pintam.
A resultante é que não vale a pena pagar qualquer preço, como alto desemprego, recessão e paralisia econômica, para atingir determinada meta de inflação. É possível tolerar inflação por certo tempo em troca de manutenção do nível de atividade econômica, da produção e do emprego. Pode-se a qualquer tempo e tendo o Banco Central boas reservas fazer troca de moeda, (isso) já foi feito às dezenas no Século XX, só a Alemanha fez três vezes, a França cinco vezes, não é algo tão extraordinário, o know how (modelo Schacht) é bem conhecido.
Do que não se conhece cura é a depressão econômica, que é para onde geralmente os monetaristas levam as economias que governos desavisados ousaram confiar à sua falsa ciência.
O Brasil está se encaminhando dentro da cartilha monetarista a um desastre de proporções bíblicas, seguindo uma receita caduca, pouco inteligente, inapropriada para economias complexas de grandes países.
Uma receita que jamais seria aplicada no País de Milton Friedman, os EUA, onde o prestígio do monetarismo jamais foi muito grande, hoje uma escola nostálgica escondida na Carnegie Mellon University. A ideologia econômica do Seculo XXI é uma combinação de escolas, uma espécie de "fusion economy" flexível e ágil, com um grande olhar no social e no político, sem radicalismos acadêmicos que já mostraram a sua falácia. (Fonte: aqui).
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Há, entretanto, muito o que ponderar, a exemplo de:
a) (Os pobres) "Se defendem comprando todos os itens vitais assim que recebem o salário, não ficam com o dinheiro no bolso esperando a desvalorização."
.Certo, mas no mês seguinte o salário será o mesmo, enquanto a nova compra de itens exigirá mais dinheiro, em face da inflação.
b) Parece desaconselhável incluir os EUA na questão. Os EUA 'mandam' no mundo: apresentam, tranquilamente, déficits sucessivos e crescentes, ano após ano (a China, sua credora-mor - ou maior 'investidora' - que o diga), influenciam a cotação do petróleo, das commodities em geral e do conhecimento - e são indiferentes a avaliações de agências de risco. Em resumo: Os EUA são um outro departamento. Vá o Brasil, por exemplo, amargar inflação estratosférica e por conta disso receber uma bordoada de qualquer uma das agências de risco donas do pedaço, para ver o que acontece...
Não obstante, o receituário monetarista é, sim, pernicioso: O dono do futuro é o deus Mercado, e se o país (o povo) se estrepar, que baixe a cabeça e se amolde às imposições desse deus! Em suma: se acontecer de o país perder a soberania e o povo, a dignidade, tudo bem, o importante é que se cumpra o que o deus Mercado esteja a 'exigir'.
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Há, entretanto, muito o que ponderar, a exemplo de:
a) (Os pobres) "Se defendem comprando todos os itens vitais assim que recebem o salário, não ficam com o dinheiro no bolso esperando a desvalorização."
.Certo, mas no mês seguinte o salário será o mesmo, enquanto a nova compra de itens exigirá mais dinheiro, em face da inflação.
b) Parece desaconselhável incluir os EUA na questão. Os EUA 'mandam' no mundo: apresentam, tranquilamente, déficits sucessivos e crescentes, ano após ano (a China, sua credora-mor - ou maior 'investidora' - que o diga), influenciam a cotação do petróleo, das commodities em geral e do conhecimento - e são indiferentes a avaliações de agências de risco. Em resumo: Os EUA são um outro departamento. Vá o Brasil, por exemplo, amargar inflação estratosférica e por conta disso receber uma bordoada de qualquer uma das agências de risco donas do pedaço, para ver o que acontece...
Não obstante, o receituário monetarista é, sim, pernicioso: O dono do futuro é o deus Mercado, e se o país (o povo) se estrepar, que baixe a cabeça e se amolde às imposições desse deus! Em suma: se acontecer de o país perder a soberania e o povo, a dignidade, tudo bem, o importante é que se cumpra o que o deus Mercado esteja a 'exigir'.
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