terça-feira, 23 de outubro de 2012
ANALISANDO O NEOLIBERALISMO TUPINIQUIM
O falso liberalismo brasileiro
Por Sérgio Saraiva
A leitura do livro "A consciência de um liberal" de Paul Krugman foi-me muito interessante. Ele narra como surgiu a poderosa classe média emergente nos EEUU, a partir dos anos 1930, nos governos Franklin Roosevelt e como ela definhou vítima da "grande compressão" a partir dos governos Reagan, mas principalmente nos governos Bush.
Krugman falava de Roosevelt e eu enxergava Lula. É incrível a semelhança das ações e dos resultados. Roosevelt foi a social-democracia americana, Lula é a brasileira.
Agora, interessante mais ainda foi ter lido as ponderações de Krugman sobre o achatamento dessa classe média - a middle-class squezed. Havia no relato, para mim, pela primeira vez a constatação de que algo que aconteceu primeiro no Brasil, e para a qual encontramos a solução, aconteceu depois nos EEUU. O relato da grande compressão da classe média americana nos governos Bush foi o que no Brasil foram antes os governos FHC. Às vezes penso, ou torço, para que Obama seja o Lula deles. Lula também teve um 1º mandato complicado.
Agora, vamos ao governo FHC. Conceitualmente foi uma fraude, uma impostura.
O governo FHC adotava a teoria do estado mínimo tão cara aos liberais - ou conservadores na ótica estadunidense. Por esse conceito, o estado interfere minimamente na vida dos cidadãos e nas suas formas de organização.
Não no Brasil; aqui, na melhor tradição ibérica, se alguém quiser montar uma barraca de feira ou trabalhar com um taxi terá de obter uma autorização estatal. Das atividades econômicas mais simples às mais complexas tudo é intermediado por um agente público.
O governo FHC fez algo para mudar esse padrão?
O estado mínimo presta pouco serviço de seguridade social aos seus cidadãos. Atem-se primordialmente às funções de estado. A manutenção da segurança interna e externa, a defesa dos interesses nacionais em relação às outras nações e a administração da justiça e do poder de polícia. Cabe aos cidadãos proverem as suas necessidades de modo particular, pagando por elas. No estado mínimo, como gostam de dizer no Brasil, deturpando o conceito, não há almoço grátis.
Em compensação, o estado mínimo cobra impostos mínimos. Quanto mais baixos os impostos, menor a carga sobre a sociedade para manter a sua estrutura administrativa. Logo, geram-se excedentes financeiros para alavancar por via da iniciativa privada o progresso do país. A apropriação dos ganhos desse progresso se dará pela meritocracia, ou seja, a cada um segundo seu esforço e talento.
Quando no Brasil o governo FHC diminuiu a carga tributária? Ao contrário, só fez aumentá-la.
Assim, vivíamos nos governos FHC o pior de dois modelos. Pagávamos impostos como na social-democracia europeia e recebíamos serviços como no estado mínimo norte-americano.
A quem serviu então os governos FHC? A um pequeno grupo de especuladores financeiros que se aproveitavam de sua proximidade com o governo para lucrar com o "melhor" dos dois modelos.
O poder de intervenção do estado era útil a esse grupo, pois era esse poder que decidia quem participaria do jogo econômico e quem seria deixado de fora. O que foram as privatizações senão uma ação entre amigos? Por que, diferentemente de Thatcher, as ações das empresas a serem privatizadas não foram simplesmente negociadas na bolsa de valores e adquiridas segundo as tais regras de mercado?
Para aonde foi o dinheiro das privatizações? Com uma política de juros altos, voltou para a mão dos mesmos financistas que o desembolsaram com empréstimos do BNDES e com a participação dos fundos de pensão das estatais. Capitalismo sem risco.
O que foi o PROER, senão uma socialização dos prejuízos dos banqueiros que antes haviam lucrado com a inflação?
Capitalismo sem risco, privatização dos lucros e socialização dos prejuízos. Isso é liberalismo?
Conceitualmente o liberalismo apregoado por FHC é uma empulhação, um estelionato. Caso não o tenha sido de fato.
E o que virá com a continuação do "modelo Lula" - a social-democracia brasileira?
Virá uma classe média conservadora.
Não sei se ao modelo europeu, que quer conservar seu "welfare state" ou se ao modelo americano e seu reacionarismo individualista.
No primeiro caso, o "lulismo" se mantém por 50 anos. No segundo, haverá a partir do fim da sucessão do 2º mandato de Dilma pressões para a redução do peso do estado.
Criaremos uma terceira via? (Fonte: aqui).
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Não li o livro acima referido, mas acompanho os artigos (traduzidos para o português) de Paul Krugman, que não à toa ganhou o Nobel de Economia de 2008. Não li o livro, repito, porém desde logo destaco um mérito dele: o de haver motivado a análise acima.
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