segunda-feira, 5 de setembro de 2022

ENGENHO E ARTE NA MONTAGEM DA FANTÁSTICA FÁBRICA DE GOLPES

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Um documentário sobre a manipulação midiática e o colapso da democracia brasileira


A Fantástica Fábrica De Golpes

Por Cesar Locatelli

Criticar os meios hegemônicos de comunicação envolve dificuldades inimagináveis. Só com criatividade e arte é possível não se render a seu poder. Ao não terem autorização para usar imagens da Globo, Victor Fraga e Valnei Nunes, diretores do longa A Fantástica Fábrica de Golpes, usaram ilustrações, elaboradas por Fernando Carvall e Leandro Araújo, bem como detalhes da tela de Flávio Tavares "Brasil, O Golpe: A Ópera do fim do mundo”.


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Chico Buarque autorizou de bom grado o uso de duas de suas músicas; os fonogramas, entretanto, pertenciam à Globo. A solução foi recorrer ao grupo Francisco el Hombre, que regravou “Roda Viva”, e à cantora Josyara, que interpretou “Pelas Tabelas”. A trilha sonora original conta ainda com o trabalho de Erika Nande. As soluções com as ilustrações e com a trilha conseguiram converter problemas de difícil solução em agradáveis surpresas para os espectadores.

Padrão Globo
Já nos momentos iniciais do filme é contada a história da armação de uma roleta no Largo da Carioca por dois jornalistas de A Noite, dirigido por Irineu Marinho, jornal que seria sucedido por O Globo. O evento ilustra bem a postura adotada pelo grupo desde então.


Corria o ano de 1913, quando os dois jornalistas montaram uma roleta em pleno Largo da Carioca, no Rio de Janeiro, para dar como notícia a licenciosidade do chefe da polícia, tido pelo jornal como conivente com a jogatina. “O Rio está se transformando num Mônaco licencioso e despudorado” estampava a edição de A Noite de 02/05/1913. O samba “Pelo Telefone”, considerado o primeiro gravado no Brasil, ironizou o evento: “O chefe da polícia pelo telefone manda me avisar / Que na Carioca tem uma roleta para se jogar.”

"Ressurge a Democracia"
Com o título acima, a edição de O Globo de 02/04/1964, trazia um radiante editorial em que saudava a desobediência militar ao chefe do Executivo, eleito democraticamente, e os agradecia por protegerem os brasileiros de seus inimigos. “Mais uma vez, o povo brasileiro foi socorrido pela Providência Divina, que lhe permitiu superar a grave crise, sem maiores sofrimentos e luto. Sejamos dignos de tão grande favor”, concluía o editorial narrado por Fraga.

Uma continuação informal do documentário 'Muito Além do Cidadão Kane'
Para demonstrar que a TV Globo e a grande mídia mantêm sua firme atuação política de anos atrás, Fraga e Nunes consideram seu novo filme como uma continuação informal do documentário inglês Muito Além do Cidadão Kane, de 1993. “O filme de quase três décadas atrás denunciou como a TV Globo do Brasil manipulou impiedosamente a opinião pública desde os anos 1960, legitimou a ditadura que governou o país por 21 anos e demonizou as vozes progressistas que lutam pelos valores mais caros da democracia (particularmente o ex-presidente Lula)”, afirmam.

A monocultura mais perigosa é a das mentes
As monoculturas de soja, de milho e outras, atravessadas por agrotóxicos, excluem os pássaros, os sapos, os insetos, interditam a diversidade, tolhem a vida. Do mesmo modo, a monocultura nos meios de comunicação transmite alto grau de toxicidade para a consciência dos membros de uma sociedade. Esta é a forma que o prêmio Nobel da paz Adolfo Pérez Esquivel, um dos ouvidos por Fraga e Nunes, entende o monopólio na mídia e o pensamento único nos meios de comunicação. 


“A monocultura mais perigosa é a das mentes. 
A monocultura das mentes traz consequências, porque se chega ao totalitarismo, se chega a querer silenciar a mídia da oposição, a mídia de informação, os meios jornalísticos que se opõem a este ou qualquer outro governo; e aí chegamos aos totalitarismos. Apenas um passo separa os totalitarismos das ditaduras”, complementa ele.

Esperança
“Nosso filme é tanto um registro histórico quanto uma ferramenta de denúncia. Brasileiros e pessoas de outras nacionalidades devem aprender com os erros cometidos nos últimos anos. A regulamentação da mídia é necessária para corrigir isso. Queremos evitar que a história se repita e ajudar o Brasil a romper com sua longa tradição de golpes de Estado. Esperamos que um terceiro documentário sobre o viés da mídia não seja necessário em três décadas”, concluem Victor Fraga e Valnei Nunes. (...). 

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