sábado, 3 de outubro de 2020

PRIVATIZAR REFINARIAS DA PETROBRAS: UM ATENTADO À RAZÃO

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Na esteira de "STF Autoriza Venda De Refinarias Da Petrobras Sem Aval Do Congresso", publicada neste Blog em 02.10.20 - Aqui. 

"O fatiamento da Petrobras é uma política que não encontra respaldo na estratégia de nenhuma das grandes empresas do ramo de energia", avalia a economista Juliane Furno, que completa: "a justificativa para esse crime de lesa pátria encontra respaldo na mesma lógica que sustentou a Operação Lava Jato. A ideia de que mais Estado significa mais corrupção e distorção de preços"


Por Juliane Furno

Desde 30 de setembro, o Supremo Tribunal Federal julga a Reclamação nº 42.576 – feita pelo Congresso Nacional – que exige que o processo de venda de subsidiárias da Petrobras passe pelo Parlamento. A proposta do governo, motivada por uma denúncia de prática anticoncorrencial, é vender o controle de 8 das 11 refinarias da Petrobrás. A proposta, no entanto, é um atentado à razão! Na coluna de hoje quero argumentar essa hipótese com base nos seus aspectos tanto políticos quanto econômicos.

A Petrobras é um patrimônio do povo brasileiro. Sua criação é fruto da maior manifestação de massas por uma pauta de soberania vista até então na nossa história. Seu símbolo representa o anseio e a posterior conquista da autossuficiência energética e seu desenvolvimento caminha lado a lado com o fortalecimento de uma grande cadeia de fornecedores nacionais. A Petrobrás foi o maior instrumento da política industrial brasileira até hoje, provendo não apenas a preços baixos a principal energia do capitalismo – o petróleo – senão que, sobretudo, mobilizando nosso parque produtivo interno a partir do seu enorme poder de compra.

Do ponto de vista político, a ação vai na contramão das referências internacionais. Das 20 maiores empresas petroleiras mundiais, as primeiras quatro são estatais. Desse montante, no total, 13 são controladas por Estados Nacionais e nenhum deles projeta vendê-las. 

A indústria de petróleo mundial foi controlada – no seu nascedouro – por grandes empresas privadas. As chamadas “Sete Irmãs”, para fazer referência ao cartel das sete maiores empresas petrolíferas, que dominaram o mercado de petróleo mundial até a década de 1960.

De lá para cá os Estados Nacionais foram assumindo o controle das suas reservas e construindo grandes empresas para operar a exploração dessa grande riqueza natural. Ou seja, a tendência mundial – em se tratando de um recurso estratégico como o petróleo – tem sido de assegurar o controle nacional o ritmo e o desenvolvimento da sua exploração.

Ainda no que tange ao aspecto político, o petróleo – cada vez mais – tem adquirido centralidade na economia mundial. Ainda que a transformação da matriz energética mundial seja imperiosa, o fato é que, pelo menos até os próximos 30 anos, o petróleo seguirá como o principal energético do planeta. Quem o controla tem poder, e quem tem esse poder exerce – com menores constrangimentos – sua soberania. 

Do ponto de vista econômico as razões não são menos disruptivas. A força das grandes petrolíferas internacionais reside, justamente, na sua capacidade de ser “verticalizada”, ou seja, operando um processo de concentração e centralização de capitais que lhes permite controlar todas as fases do processo produtivo. Assim, o fatiamento da Petrobras é uma política que não encontra respaldo na estratégia de nenhuma das grandes empresas do ramo de energia. A integração vertical permite que a empresa não fique vulnerável às oscilações do preço do barril no mercado internacional. Assim, em momento nos quais o preço está deveras deprimido, ainda assim a empresa pode ter déficit na produção e exploração e ser lucrativa, uma vez que ela compensa com superávit no refino e/ou na distribuição. Da mesma forma, só uma empresa integrada e estatal pode operar uma política de redução do custo do combustível – a título de estratégia de política industrial ou de soerguimento econômico nacional – reduzindo as margens de lucro no refino e compensando na exploração. Assim, no agregado, a empresa permanece lucrativa.

A justificativa de alienação dos ativos da Petrobras amparada na falácia que ela está muito “endividada” também não encontra razão econômica. A Petrobras tem uma dívida elevada como qualquer empresa petrolífera. Nenhuma grande empresa financia ousadas investidas – como foi para descobrir o Pré-Sal – usando capital próprio. O que se deve atentar na análise da dívida não é o seu valor nominal, mas sim a sua capacidade de solvência. O endividamento da Petrobras cresce concomitantemente ao crescimento das reservas petrolíferas, ou seja, a sua renda, o que não constitui problemas de insolvência. Além disso, os investimentos feitos no Pré-sal têm maturação média de 10 anos. Ou seja, apenas a partir de 2020 começará, de forma mais célere, a geração de receita para amortecimento da dívida. Até aí tudo absolutamente normal para quem entende do setor.

Além disso, ao vender o controle das refinarias a Petrobras vai amortecer seu endividamento apenas do ponto de vista ilusório, no curto prazo. No longo prazo, porém, ela perde o direito ao recebimento da renda futura dessa atividade. Segundo o INEEP, apenas duas das refinarias que estão na lista, a Rlam e a Rnest, geraram mais de R$ 5 bilhões de receita operacional á Petrobras, o que significa que ela teve mais capacidade de gerar lucro ao seu acionista majoritário, que é o Estado. 

Por fim, ainda do ponto de vista econômico, a justificativa de abrir o mercado para gerar concorrência e com isso pressionar a redução do preço ao consumidor é outro atentado a inteligência. Isso porque não existe concorrência nesse mercado. Vamos substituir um monopólio público por um monopólio privado. Você não vai trocar de estado da federação para abastecer seu carro porque o preço do posto que recebe gasolina da refinaria privada está mais caro. Ou seja, estamos na iminência de formar monopólios regionais.

A justificativa para esse crime de lesa pátria encontra respaldo na mesma lógica que sustentou, sorrateiramente, a Operação Lava Jato. A ideia de que mais Estado significa mais corrupção e distorção de preços. É mais um passo do Golpe que está vocacionado para solapar a soberania econômica, política e energética nacional. - (Aqui).

(Juliane Furno é mestre e doutora em desenvolvimento econômico na Unicamp, Assessora Parlamentar na Câmara Federal e militante do Levante Popular da Juventude).

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A opinião do ex-ministro das Relações Exteriores e da Defesa Celso Amorim:  “Como cidadão brasileiro, e tive a oportunidade de me ocupar de temas diretamente ligados à defesa da soberania nacional, só posso lamentar uma decisão que debilita nossa capacidade de garantir energia, sob várias formas, ao povo brasileiro. Sem energia, não há produção; sem produção, não há emprego; e sem emprego não há renda sustentável. E vamos ser claros: na maioria dos casos – e este não será exceção – privatização é uma palavra mais palatável para encobrir desnacionalização. É disso que se trata: entregar atividades fundamentais à segurança e bem estar do povo a interesses estrangeiros. (...).”  - Aqui.

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O governo federal, muito pelo contrário, agradeceu ao STF pelo fato de haver dispensado a exigência de prévio aval do Congresso relativamente à alienação do patrimônio nacional, ao menos no que respeita às subsidiárias. "O Congresso é complicado, além de demorar muito a decidir!".

Nosso comentário, em post já citado (Aqui): "Subsidiárias (ou recém-batizadas 'subsidiárias') da Petrobras serão as primeiras a entrar na fogueira da privatização. Qual a receita? ('Receita' nos dois sentidos: fórmula a aplicar; ganhos a auferir - quem ganha?). Banco do Brasil poderá ser o próximo: vão-se as subsidiárias (até a BB - Distribuidora de Títulos e Valores Mobiliários!), ficará a carcaça da 'ex-estratégica empresa'. O País precisa entregar suas estatais (ou as partes lucrativas delas) para auferir dinheiro visando ao custeio de suas atividades - se possível sem depender do aval do Parlamento, entende?!"

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