terça-feira, 17 de maio de 2011

O FILÃO DAS CONSULTORIAS


As lavanderias

Por Janio de Freitas

AS LAVANDERIAS que dão maiores lucros não lavam roupas nem outros tecidos. Lavam dinheiro. E não usam o nome de lavanderia. Chamam-se consultorias. Assim como as lavanderias verdadeiras não são consultorias, nem todas as consultorias são lavanderias. Há razões mesmo para acreditar que a maioria não o seja, à parte o grau de competência de cada uma.

Contraventores, traficantes, contrabandistas e congêneres adotam sistemas próprios de lavagem. Consultorias são preferidas e muito eficazes para quem precisa lavar dinheiro recebido de modo ilícito no exercício de função pública. Aquele dinheiro que não pode aparecer de repente sem maiores riscos.

Alguns, em verdade poucos, desfrutam de circunstâncias que lhes permitem fazer grandes investimentos, sem problemas, em fazendas, imóveis aqui e no exterior, saiam ou não da vida pública. Outros, menos notórios, desaparecem para sua nova vida de bem forrados. Solução que, por acaso ou não, foi muito praticada em certos setores, como o da regulagem de preços então existente, áreas da Fazenda e de obras. Mas os que não têm cobertura bastante e não podem sumir têm o recurso de consultorias. As quais, com frequência, até lhes mantêm ou conferem prestígio, proporcionado pelos jornalistas que os procuram para a palpitagem incessante. E, para não perder tempo, utilitária também.

As modalidades de lavagem são variadas. Digamos, para exemplificar com uma delas, que alguém em função ministerial receba um alto valor, ou se torne credor dele, por determinada medida (apresentada, é claro, para efeitos governamentais e públicos, sob a conveniente roupagem técnica). Não fará uso imediato dos novos cifrões, por impedimentos óbvios. De volta à vida dos quase comuns, porém, a operação é simples.

Um recibo não depende da existência de um pagamento. É o que lavagem sabe e faz: um pagamento fictício por uma empresa, ou uma entidade, e um recibo dado por prestação de consultoria que não houve. O dinheiro ilícito, vindo lá de trás às escondidas, passa a integrar o patrimônio do corrompido como se fosse pagamento por um serviço recente. Está limpo para todos os efeitos legais. E a empresa ou a entidade tem a vantagem de deslocar, da contabilidade real para o caixa dois de usos não declarados, a quantia que aparentemente saiu como pagamento de um serviço de consultoria.

Na mesma modalidade, há também a entrega de um serviço, o mais comum é uma publicação ou um "estudo técnico", pago pela empresa por um alto valor, seja para repetir o mesmo truque, seja para quitar o crédito ilícito do serviço prestado na função pública. Com a ressalva, apesar de desnecessária, de que nem toda publicação e "estudo técnico" para empresa cumpra esse papel.

A bem da verdade, como diziam no tempo em que tais práticas e suas variantes eram raras, é que seu uso não é exclusividade do âmbito administrativo ou do político. O Conselho Nacional de Justiça tem adotado providências contra casos semelhantes no Judiciário. Antes dele, o ex-juiz Lalau dos Santos Netto deixou outra ilustração, quando pôs sua lavanderia no exterior certo de que o remanescente do SNI ainda lhe daria proteção, e não abandono ingrato.

Dizem até que também uma atividade muito protegida por si mesma, chamada imprensa ou jornalismo, tem exemplos na matéria.

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Mais deplorável, mesmo, é quando o suspeito vem com a de que "calma aí, eu não fui o único a enriquecer!"...

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