Em seu afã de (des)fazer e acontecer, o atual governo federal urdiu mais uma, a 'flexibilização' da 'regra de ouro', prevista no artigo 167 da Constituição Federal, que veta a realização de operações de crédito por parte da União quando o montante ultrapassar as chamadas 'despesas de capital' (investimentos da União + despesas referentes às operações de financiamento da dívida pública, a exemplo do pagamento de juros e de amortizações sobre o principal).
Qual(is) o(s) propósito(s) que está(ão)por trás dessa 'inovadora' iniciativa governamental? A questão suscita opiniões diversas. Mas o analista José Luis Oreiro foi fundo: considera-a ociosa, e especula sobre as verdadeiras motivações 'teméricas' (post intitulado "A Regra de Ouro: muito barulho por nada", publicado no Jornal GGN - aqui):
A) A 'proposta' e o seu porquê
"O ponto que vem sendo debatido desde o final do ano passado é que o efeito combinado da ocorrência de um déficit primário das contas da União com a redução das despesas discricionárias – notadamente gastos de investimento – nos últimos 2 anos na tentativa vã de fazer um forte ajuste fiscal no meio da maior recessão da história do Brasil desde do final da Segunda Guerra Mundial – eliminou o espaço para o cumprimento da “regra de ouro”, a qual tem sido obedecida desde 2016 apenas devido a devolução gradativa, por parte do BNDES, dos vultosos empréstimos que o Tesouro Nacional fez ao banco de fomento a partir da eclosão da crise financeira internacional de 2008. O problema posto no momento é que o cumprimento da regra de ouro para 2018 exigiria a devolução de R$ 130 bilhões por parte do BNDES, o que deixaria o Banco de fomento descapitalizado no momento em que a economia brasileira parece ter deixado para trás a recessão e, portanto, no exato momento em que os empréstimos do BNDES serão mais necessários para a retomada do investimento e do crescimento econômico em bases sustentáveis. Além disso, argumenta-se que mesmo que a regra de ouro seja cumprida em 2018, será impossível cumpri-la em 2019, de forma que uma PEC com uma 'flexibilização' da 'regra de ouro' será necessária para evitar que o governo cometa crime de responsabilidade fiscal, o qual daria ensejo a um possível pedido de impeachment do Presidente Michel Temer.
O que o governo e a grande imprensa não têm dito no debate público é que o inciso III do artigo 167 da Constituição Federal que estabelece a 'regra de ouro' já prevê um dispositivo que pode ser usado para 'flexibilizar' a mesma. Vejamos o que diz o Inciso:
'III – [São vedadas] a realização de operações de créditos que excedam o montante das despesas de capital, ressalvadas as autorizadas mediante créditos suplementares ou especiais com finalidade precisa, aprovados pelo Poder Legislativo por maioria absoluta'.
O inciso III estabelece de forma clara e cristalina que O Poder Legislativo poderá aprovar, por maioria absoluta (no caso da câmara dos deputados 257 votos), operações de crédito que excedam o montante das despesas de capital. Como a 'maioria absoluta' é muito menor do que o quórum necessário para a aprovação de um PEC, percebe-se claramente que toda essa discussão sobre o não cumprimento da regra de ouro é, no fundo, uma grande enganação. Isso porque se o governo não tiver os votos necessários para aprovar um pedido de waiver por maioria absoluta também (257 votos na câmara dos deputados) não terá os votos para aprovar uma PEC (308 votos na câmara dos deputados). Sendo assim, porque razão o governo Temer está insistindo no caminho mais difícil, se a Constituição Federal estabelece um dispositivo muito mais simples?"
B) As motivações:
B) As motivações:
"Acredito que existam duas razões para isso. Em primeiro lugar, a equipe econômica do governo está adotando a velha estratégia de por o “bode na sala” para negociar a retirada do bode. É provável que a equipe econômica esteja criando todo esse terrorismo para negociar a postergação do aumento dos salários dos servidores públicos para 2019 ou ainda a aprovação da reforma da previdência. Se essa for a linha de pensamento de Dr. Meirelles, então ele demonstra ser de uma ingenuidade sem par. Acreditar que o Congresso Nacional, num ano eleitoral, com um governo com 3% de aprovação e rodeado de denuncias de corrupção irá aprovar DUAS emendas constitucionais é não conhecer o estofo com o qual os ilustres deputados e senadores do Brasil são feitos. Não acredito que Dr. Meirelles seja tão ingênuo.
A segunda razão é que o governo quer transferir para o congresso o ônus político da 'flexibilização da regra de ouro'. A ideia seria dizer que a flexibilização não foi uma medida do governo, mas do congresso nacional. Isso livraria a cara do Dr. Meirelles durante a campanha presidencial de 2018, onde ele poderá dizer, com a convicção que lhe é característica, de que ele é o fiador da responsabilidade fiscal. Mas se o governo fizer o pedido de waiver para o congresso nacional, então Sr. Meirelles passará para a história da nova república como o Ministro da Fazenda que não cumpriu a 'regra de ouro'. Se isso ocorrer, seus principais adversários, Geraldo Alckmin e Ciro Gomes irão reduzi-lo a pó no debate macroeconômico."
Arremate: Num P.S., a ironia:
Arremate: Num P.S., a ironia:
"P.S : Alguém realmente acredita na possibilidade de Michel Temer sofrer impeachment em 2018 por crime de responsabilidade? O cara se livrou de duas denúncias da PGR e eu duvido muito que o Congresso Nacional vá se mobilizar em 2018, num ano eleitoral, no apagar das luzes do governo Temer, para afastá-lo do cargo. Toda essa discussão em torno da regra de ouro tem claro viés politico-eleitoral, para tentar blindar a candidatura de Meirelles ao Palácio do Planalto."
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Em nosso entendimento, o articulista poderia (mais ainda: deveria) haver citado uma terceira razão, mais importante do que as duas citadas:
Terceira razão: Tranquilizar desde logo os credores da dívida pública brasileira.
Obs.: Noticia-se agora que o senhor Temer descartou a pretensão de atropelar a 'regra de ouro', abraçando definitivamente a reforma da Previdência - justamente o 'tendão de Aquiles' apontado pelo Banco Mundial em seu 'receituário Brasil'. É indiferente, visto que o 'x' da questão se mantém: estará tudo bem, desde que estejam sempre livres e desimpedidas as estradas que conduzem ao tempestivo cumprimento do serviço da dívida pública.
Obs.: Noticia-se agora que o senhor Temer descartou a pretensão de atropelar a 'regra de ouro', abraçando definitivamente a reforma da Previdência - justamente o 'tendão de Aquiles' apontado pelo Banco Mundial em seu 'receituário Brasil'. É indiferente, visto que o 'x' da questão se mantém: estará tudo bem, desde que estejam sempre livres e desimpedidas as estradas que conduzem ao tempestivo cumprimento do serviço da dívida pública.
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