O tempo da Lava Jato e o tempo político
Por Luis Nassif
A Justiça é necessariamente burocrática, presa a procedimentos e prazos. Seu tempo é diferente do tempo da política e da economia. Mas há que se ter o mínimo de sensibilidade quando fatos jurídicos ou policiais impactam a política e a economia. Não se pode tratar sequelas políticas e econômicas como danos colaterais.
Esse papel, de minimização dos efeitos políticos e econômicos, caberia ao Ministro da Justiça, desde que soubesse diferenciar as responsabilidades institucionais do cargo com as interferências indevidas. Trata-se de uma fronteira estreita que exige discernimento, coragem institucional, autoridade moral e responsabilidade pública, qualidades que evidentemente faltam ao Ministro José Eduardo Cardozo.
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Tome-se a crise política atual.
Surge a Lava Jato e, com ela, a informação de dezenas de políticos com foro privilegiado prestes a serem denunciados. Da maior parte deles, não se divulgam nomes. Entre os denunciados está o presidente da Câmara Eduardo Cunha.
A ameaça fica pairando sobre suas cabeças, sem desdobramentos maiores, criando o pior dos mundos, com a parcela mais barra-pesada do Congresso correndo contra a condenação, valendo-se para tanto de um poder de chantagem. O impasse tornou o país refém de seus esbirros autoritários, chantageando ora o governo ora a oposição.
É o que ocorre com Eduardo Cunha. Um país inteiro sob o tacão de um possível futuro condenado.
Ontem, o deputado Fausto Pinato, ex-relator do caso Cunha na Comissão de Ética, denunciou ameaças recebidas contra sua família.
Como se resolve isso? Apressando as denúncias, afastando os denunciados e atacando a organização criminosa.
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O mesmo problema ocorreu na frente econômica.
Desde fins do ano passado há um projeto de acordo de leniência na Presidência, que permitiria liberar as empreiteiras e direcionar as punições para as pessoas físicas dos controladores e dos diretores.
Nada foi feito, denotando nenhuma sensibilidade sobre os impactos dessa operação no PIB industrial brasileiro. Essa desatenção indesculpável provavelmente custou 2 pontos percentuais do PIB.
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Mais que isso, a Lava Jato promoveu um desequilíbrio político ao mirar sua lupa sobre um partido apenas. Se o Procurador Geral da República Rodrigo Janot não tivesse cedido à pressão do PSDB mineiro, e denunciado Aécio Neves – tanto pelas declarações de Alberto Youssef quanto pela conta em Lienchenstein – seriam abortadas tentações golpistas e se poderia combater a corrupção sem viés político.
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Por ocasião das comemorações dos 25 anos da Constituição, juristas enalteceram sua consistência, que permitiu ao país atravessar diversas crises sem maiores danos às instituições.
Passado o tiroteio atual, de alguma maneira terão que ser revistos alguns pontos. Como a politização do TCU (Tribunal de Contas da União), o uso abusivo de vazamentos seletivos por parte de autoridades investigativas, inclusive como forma de pressão indevida sobre tribunais superiores.
Afinal, o aparato institucional tem que ser suficientemente sólido inclusive para amparar governantes incapazes de articular minimamente um projeto político. Se o modelo só se sustenta com grandes lideranças, há algo de errado na montagem institucional. (Fonte: aqui).
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Cenário 2015, até aqui: Economia afundando (no dia em que a pauta foi finalmente destravada, aconteceu a aceitação do pedido de impeachment, e o emperramento da economia foi 'prorrogado'), agências de risco acenando ameaçadoramente, clima político exatamente no nível planejado pelos estrategistas do contra, políticos encalacrados mandando às favas o que restava dos escrúpulos para ver se as chamas sobem e eles conseguem escapar no meio do incêndio, o maniqueísmo imperando (um partido político é execrável, os demais são virtuosos, sendo um deles, além disso, absolutamente inimputável), e a Lava Jato - que estará completando dois anos em março próximo - seguindo calmamente o seu curso...
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