sexta-feira, 22 de novembro de 2013
BIOGRAFIAS NÃO AUTORIZADAS: AUDIÊNCIA PÚBLICA
Para OAB-SP, STF não deve definir questão das biografias
Por Pedro Canário
A seccional paulista da Ordem dos Advogados do Brasil prefere que o conflito entre a liberdade de expressão e de imprensa e o direito à privacidade sejam definidos caso a caso pelos juízes de primeira instância. Isso porque, para a integrante da Comissão de Direito Autoral da OAB-SP, Silmara Chinellato, não há “hierarquização em abstrato” entre os dois princípios constitucionais. Portanto, para ela, a prevalência de um sobre o outro deve ser definida nos casos concretos. “Não cabe definição apriorística nesse caso”, defendeu.
Com essa argumentação, a advogada quer dizer que não cabe ao Supremo Tribunal Federal determinar um padrão de conduta para o Judiciário quando da apreciação desse tipo de conflito. Silmara falou na manhã desta quinta-feira (21/11) durante audiência pública no Supremo para discutir se os artigos 20 e 21 do Código Civil exigem aprovação prévia dos personagens de biografias e se eles afrontam o texto constitucional.
A discussão está posta na Ação Direta de Inconstitucionalidade 4.815, ajuizada pela Associação Nacional dos Editores de Livros (Anel) para pedir que o STF dê aos artigos do Código Civil a chamada “interpretação conforme a Constituição Federal”. As empresas alegam que, ao exigir autorização prévia dos biografados para publicação de biografias, os dispositivos do CC afrontam o inciso IX do artigo 5º da Constituição: “É livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença”.
O caso foi levado ao Supremo depois de o Judiciário, por reiteradas vezes, ter determinado a retirada de biografias de circulação porque determinados trechos ofendem os biografados ou as personagens citadas.
As decisões judiciais se baseiam no inciso X do artigo 5º da Constituição, segundo o qual “são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação”.
A ADI está sob relatoria da ministra Cármen Lúcia, que convocou a audiência pública. O pedido é para que o Supremo defina se a publicação de textos biográficos sem autorização do biografado viola o direito à intimidade, ou se a indenização por eventuais violações deve ser posterior à publicação, independente de autorização. E é isso que a advogada Silmara Chinellato não quer que o Supremo faça.
Em sua fala na audiência desta quinta, ela defendeu que a liberdade de expressão não é direito absoluto e que os direitos públicos, como o da informação, não são indisponíveis. “É necessário enfrentar o embate entre o interesse público e o privado”, disse. “Há interesses meramente empresariais em divulgar fatos somente para satisfazer a curiosidade da população, o que não se confunde com interesse público.”
Sem debate
A representante da OAB falou praticamente sozinha na audiência pública. A esmagadora maioria defendeu que o Supremo acabe com a controvérsia de uma vez por todas e diga que nenhuma produção, artística, jornalística ou acadêmica, dependa de autorização prévia de quem quer que seja. “A única saída para más biografias são boas biografias”, resumiu o professor Ivar Hartman, que representou o Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, o IHGB.
Houve uma coincidência histórica na presença do IHGB no “debate”. O instituto foi fundado em 1838 pelo imperador D. Pedro II justamente com o intuito de estimular a produção acadêmica e científica a respeito do Brasil. Era uma época em que a produção científica estava centralizada na Europa, e D. Pedro estava preocupado em construir uma história nacional e valorizar as tradições brasileiras.
A coincidência é que um dos expositores da audiência foi o historiador José Murilo de Carvalho, autor de extensa obra sobre o Império e, inclusive, de uma biografia de D. Pedro II. Na discussão, contou que jamais foi procurado pelos herdeiros do imperador para que se abstivesse de mencionar qualquer episódio. Citou o próprio D. Pedro II: “Quem controla a imprensa é a própria imprensa”.
Carvalho defendeu que não há como estudar história sem as biografias, já que ela é fruto das ações de seus personagens. “Já se foi o tempo em que os estruturalistas pregavam que os indivíduos são meros joguetes, e que a história é fruto da geografia, do clima ou de fatores externos”, ensinou. “Defesa da censura prévia por pessoas públicas é incoerente. Revela visão torta da posição que ocupam na sociedade. É como se quisessem servir-se do povo sem servir o povo. Podemos estar diante do ovo da serpente para acabar com o direito à opinião e ao contraditório.” (Fonte: aqui).
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