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Fortaleza Hotel carrega a pátina melancólica que tem caracterizado filmes cearenses recentes, como Inferninho e Greta, longa anterior de Armando Praça.
Por Carlos Alberto Mattos
Hotéis são por definição lugares de trânsito e de encontros temporários, onde não há raízes. Hotéis são pontos flutuantes entre origem e destino. Em Fortaleza Hotel, duas mulheres têm seus caminhos cruzados da maneira mais inusitada possível. O belo filme de Armando Praça começa com uma casualidade e acaba falando sobre sentimentos que vicejam mesmo onde tudo é diferença e transitoriedade.
Pilar (Clebia Souza) é camareira no hotel-título. Tem planos de mudar de vida e emigrar para a Irlanda, onde uma amiga já se encontra. Seu inglês razoável lhe permite trocar algumas palavras com a hóspede sul-coreana Shin (Lee Young-lan), recém-chegada para cremar o corpo do marido, que trabalhava na capital cearense. Como Pilar, Shin também planejava começar uma nova vida bem longe de sua terra, em Fortaleza ao lado do marido.
Eis que de repente um certo acontecimento familiar impede Pilar de viajar e as duas se veem equiparadas pela frustração de seus planos. Enquanto a camareira ajuda a hóspede a resolver o funeral do marido, e ambas passam a precisar de dinheiro, o esboço de sororidade (união/empatia) entre elas será posto a dura prova.
A relação entre Pilar e Shin é construída a conta-gotas com extrema sutileza. A distância cultural, de classe e de idade é insinuada por uma constante interposição de pórticos, treliças e até mesmo sombras entre as duas, afora boa parte do filme em que elas contracenam em planos separados. Daí a beleza particular da sequência culminante da dança, quando ambas se encontram no mesmo plano e sem mais nada a isolar uma da outra.
Fortaleza Hotel carrega a pátina melancólica que tem caracterizado filmes cearenses recentes, como Inferninho e Greta, longa anterior de Armando Praça. Mesmo uma passagem jubilosa como a dos jovens mergulhando de um velho pier compartilha uma tristeza doce. Afinal, o mar é naquelas circunstâncias um índice (?) de morte. além de ser aquilo que separa Pilar e Shin de seus sonhos.
Mais ainda que em Greta, a direção logra um precioso senso de medida entre a crônica da violência que domina a periferia de Fortaleza e as delicadas emoções em jogo nas personagens. Percebe-se uma grande harmonia conceitual entre os vários setores do filme, seja no ritmo da montagem, seja na trilha sonora de O Grivo ou na fotografia de Heloisa Passos. As composições cuidadosas e a iluminação levemente expressionista preenchem a tela com grande apuro estético e sugestão dramática. Nisso se destaca a tomada final, uma bonita condensação do que significa um Ano Novo.
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Uma boa entrevista com o diretor, o corroteirista Pedro Candido e a atriz Clebia Souza está no canal 3 em Cena. - (Fonte: Blog Carmattos - Aqui).
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