sexta-feira, 17 de dezembro de 2021

CHILE: A FORÇA DA EXTREMA DIREITA

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O sociólogo Emir Sader comenta sobre o cenário eleitoral do Chile. Lá, no segundo turno, há o risco de a extrema direita ganhar. 
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Que tomem nota os ingênuos que se dizem convencidos de que por essas plagas as favas já estão contadas. 

      José Antonio Kast - o favorito da eleição chilena

A Força da Extrema Direita

Por Emir Sader

Assusta a força do candidato da extrema direita no Chile, José Antonio Kast: depois de surpreender ao vencer o primeiro turno das eleições presidenciais, está cabeça a cabeça na reta final da disputa.

Que fatores fazem com que um candidato de extrema direita, em um pais com tradição de continuidade institucional desde a restauração da democracia (chegue a tal performance?). Desde 1990, no final da ditadura do Pinochet, houve estabilidade política, com governos moderados da coalizão entre o PS e a DC.

Há dois anos se deram as maiores mobilizações populares em muito tempo, protagonizada inicialmente pelos estudantes, mas que depois se generalizaram para todo o pais. Que conquistaram a convocação de uma Assembleia Constituinte, com representação paritária entre homens e mulheres, representação especifica dos mapuches e que elegeu como presidenta uma líder mapuche.

O pais elegeu os delegados constituintes, com predominância de representação progressista, que faz com que as primeiras decisões da Constituinte sejam de caráter democrático.

Mas o caso do Chile não é único. Mesmo caindo, o apoio ao Bolsonaro no Brasil impressiona, diante do desgaste do seu governo e da sua liderança, ficando ainda próximo da casa dos 20%, muito atrás do Lula, mas bem acima dos outros candidatos.

Na Argentina, um candidato de extrema direita ocupou, pela primeira vez, um espaço na disputa presidencial e conseguiu eleger parlamentares para o Congresso. Em outros países, surgem lideranças de extrema direita, ainda incipientes na sua força, mas ninguém nega que tenham um potencial de crescimento.

De onde vem essa força? Qual sua plataforma? Que propostas formuladas por eles têm mais efeito na opinião pública? São comuns suas propostas?

Há elementos certamente comuns entre eles. A começar pelo tema da postura anti-política ou apolítica. A critica da politica tradicional, dos partidos e dos líderes políticos tradicionais, de direita e de esquerda, tem efeito na população, cansada da falta de soluções para seus problemas e nas denúncias de corrupção sobre esses políticos. As forças de esquerda e suas lideranças aparecem como fazendo parte dessa política, com acusações de corrupção sobre eles que, de tanta insistência, deixam sempre sua marca.

Um segundo tema é a da violência, que atinge e preocupa grande parte da população e para a qual as forcas democráticas não têm solução e propostas efetivas diante dos olhos da população. Enquanto as propostas de endurecimento na ação contra a violência, de fortalecimento das polícias e de liberação da sua ação e flexibilização dos seus processos, quando atuam de forma indevida.

Mesmo diante dos casos, sempre crescentes, das formas de ação violentas da polícia e da quantidade de mortos, especialmente entre os pobres, dos negros e dos jovens, a população tende a não favorecer sua punição e fechar os olhos ou até mesmo apoiar as formas de ação da polícia, aceitando a suspeita de que essas populações estariam implicadas em alguma forma de ilegalidade. Na prática, termina ocorrendo uma delegação de amplos setores da população, especialmente da classe média, à ação das polícias.

As propostas das forças democráticas, vinculadas à defesa dos direitos humanos e de outras formas de ação das polícias, não têm tido efeitos nem sobre a massa da população, nem sobre a ação das polícias em formas alternativas de ação.

Especialmente a população pobre, da periferia das grandes cidades, se sente desvalida diante da violência cotidiana, da ação dos narcotraficantes e dos milicianos e, embora seja ela mesma vítima da ação arbitrária e violenta das polícias, acaba tolerando mais a ação destas. A direita parece a que mais se preocupa com a violência de que essas populações são vítimas e que são preocupação de amplos setores das classes médias.

Um terceiro ponto das posições dos líderes da extrema direita é a do anti-estatismo, da luta contra a presença do Estado. Tema central do neoliberalismo, concentra no Estado os ataques de má administração de empresas, de gastos excessivos através de muitos impostos, de excesso de servidores públicos, de fonte de corrupção do Estado. A ponto que, ao longo do tempo, mesmo nos governos progressistas, que se opuseram a essas posições, a privatização sempre goza de simpatia na maior parte da opinião. Mesmo sem exemplos concretos, se mantém a ideia de que os empresários privados e o mercado seriam mais efetivos, mais dinâmicos, menos custosos para a população.

A cada vez que se anuncia a dispensa de funcionários públicos, a maioria da população tende a receber a notícia de forma favorável, como se fosse pagar menos impostos, como se fossem dispensados funcionários inúteis para a sociedade. Nunca se menciona quantas enfermeiras e pessoal de saúde pública serão dispensados, quantos professores, quantos assistentes sociais.

Outra posição que caracteriza a extrema direita é a hostilidade aos direitos das chamadas minorias – mulheres, negros, indígenas, jovens. Expressam em voz alta posições conservadores de setores expressivos das classes médias, incomodados com os espaços e direitos crescentes conquistados por esses setores, sentindo-se ameaçados por esse movimento.

Da mesma forma que reagem de maneira negativa às políticas de redistribuição de renda, que promovem os direitos dos setores populares, sempre postergados. Se sentem ameaçados pela ascensão desses setores, ao invés de serem favoráveis à luta contra a exclusão social, a pobreza, a fome o abandono.

No seu conjunto, se fortalecem na opinião pública ideias de extrema direita, que explicam a força dos candidatos e das lideranças que defendem essas posições. Candidatos que podem ser eleitos presidentes proximamente, como no caso do Chile, mas que tendem a ocupar espaços cada vez maiores em outros países.

É um tema que tem que ser central para a esquerda e todas as forças democráticas, levando em conta que os programas dessas forças e lideranças não costumam contemplar, com respostas eficientes para a opinião pública. E levar em conta que as vitórias políticas são sempre antecedidas de vitórias no plano das ideias e que, assim, a disputa na luta das ideias acaba sendo determinante para o presente e o futuro das sociedades contemporâneas, especialmente as latino-americanas, onde é mais acirrada a disputa entre as forcas conservadoras e as democráticas.  -  (Fonte: DCM - Aqui).

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