segunda-feira, 4 de maio de 2020

PARA ONDE VÃO AS FORÇAS ARMADAS BRASILEIRAS?

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"O Governo Bolsonaro NÃO é um governo militar – mas, pior ainda, é um Governo errático, sem projeto nacional, sem objetivos claros de desenvolvimento e inserção social, com largos componentes de seita ideológica de baixa extração, regidas por um astrólogo maluco que mora no exterior, com enormes carências e antagonismos em áreas cruciais como Educação, Meio Ambiente e Relações Exteriores, áreas que operam contra objetivos nacionais permanentes a que as FF.AA. estão tradicionalmente associadas, o que aumenta os riscos da presença militar nesse Governo."


Por André Araújo
De 1889 A 2019, por 130 anos, as Forças Armadas brasileiras mantiveram perante a Nação seu imenso capital de Poder Moderador usado nas crises fundamentais do Estado.
Em 1889, aboliram o regime monárquico e encamparam a República; em 1930, deram suporte à Revolução contra os hábitos viciados da República Velha; em 1937, endossaram um regime autoritário dentro do figurino da época; em 1945, depuseram esse mesmo regime, também acompanhando os ventos democráticos do pós Guerra; em 1964, em tempos de Guerra Fria, seguiram os ventos geopolíticos da luta contra a Revolução Cubana no continente; em 1988, endossaram a volta à Democracia no ciclo de esgotamento da Guerra Fria e fim dos regimes autoritários no Continente, quando no mesmo ciclo caíram também regimes autoritários nas Filipinas, Indonésia, Coreia do Sul e outros países do então Terceiro Mundo.
De todos os regimes autoritários da América Latina nesse ciclo da Guerra Fria, o brasileiro foi de longe o mais brando, o mais estruturado, o mais desenvolvimentista e o que propiciou maior inserção econômica na parte mais carente da população. Foi, no geral, um regime melhor que todos os demais autoritários.
O PAPEL MODERADOR
O perfil histórico das Forças Armadas Brasileiras é completamente diferente das demais repúblicas latino-americanas, porque a transição do Brasil de colônia para uma Nação Independente teve outro caminho.
Enquanto a libertação das colônias espanholas foi liderada por caudilhos militares que assim criaram capital político para governar os novos países, o Brasil se tornou independente por um movimento dentro da Monarquia portuguesa, tornando-se legado da mesma Casa dinástica dos Bragança que já reinava em Portugal.
Não foi, portanto, um movimento caudilhesco como nas colônias hispânicas, com o que a Coroa brasileira manteve o papel de PODER MODERADOR inerente à Coroa sucessora no Brasil.
Quando o Exército derrubou a Monarquia e instaurou a República, as Forças Armadas herdaram da Coroa o PODER MODERADOR que esta representava.


Portanto, ao contrário das repúblicas hispano-americanas, onde o Exército assumiu o poder de governo – e, portanto, não poderia ser Moderador –, no Brasil as Forças Armadas não se instalaram como governo e sim como sucedâneo da Coroa.
Depois dos dois Presidentes militares na instauração da República, Deodoro e Floriano, se seguiram até 1946 Presidentes civis ou eleitos com esse perfil, como foi o caso de Hermes da Fonseca, que não representava as Forças Armadas quando foi eleito – aliás, seu grande operador político era um civil, o Senador Pinheiro Machado.
Com a eleição de Dutra em 1946 as Forças Armadas assumem o poder, mas com perfil civil: Dutra era um fiel seguidor da Constituição e exerceu todo o período como civil, já na reserva. Na sucessão de Dutra, as Forças Armadas tentaram se reinserir no jogo político por oposição ao ex-Ditador Vargas, agora eleito democraticamente, mas não chegaram a intervir a não ser por breve período nos chamados “inquéritos do Galeão” pela Aeronáutica.
Na posse de Juscelino, houve tentativas de inserção das FF.AA. na cena política, repelidas pelo então Ministro da Guerra, General Lott, episodio das “novembradas”.
A INTERVENÇÃO DE 1964
A inserção direta das Forças Armadas no Governo em 1964 foi uma operação nova resultante da visão que elas tinham de seu papel como Poder Moderador, mas agora extrapolando para o exercício direto do Poder Executivo, sem intermediários.


Foi um processo novo na História do Brasil desde 1822, pela primeira vez as FF.AA. governam o País sem a intermediação do poder civil. A experiência deixou marcas profundas na Instituição Militar que se retirou desse papel intervencionista em 1985, com percepção interna e externa mista.
As FF.AA., ao mesmo tempo em que reconhecem seu papel fora dos quadros regulares nesse período, ao mesmo tempo justificam sua presença no Governo como necessidade de manutenção de valores nacionais em risco pelas atitudes do Poder Civil em 1964.
Ao se retirar do poder em 1985, as FF.AA. recuaram novamente para sua posição anterior de Poder Moderador até o atual governo Bolsonaro, quando rompem novamente uma postura que parecia firme até 2018 e entram em uma etapa arriscada.
Uma análise mais detalhada do papel das FF.AA. no Governo de 1964 a 1985 está em meu livro “BRASIL DOS PATRIOTAS” (Editora Alfa Omega), cuja fidelidade aos fatos foi apreciada por dezenas de oficiais generais que me enviaram  cartas elogiosas e que me valeram a Medalha do Pacificador outorgada pelo Exército.
A INSERÇÃO NO GOVERNO BOLSONARO
A presença completamente fora da curva de militares no Governo Bolsonaro abre um novo capítulo na trajetória das Forças Armadas. No inicio foram oficiais da reserva, o que NÃO comprometia o estamento militar, MAS em uma segunda etapa se incorporaram ao Governo os OFICIAIS DA ATIVA, uma anomalia em democracias.
Oficiais da ativa são militares que REPRESENTAM as Forças Armadas. É uma situação anômala porque um agente do Governo não pode ser ao mesmo tempo civil e militar. Mais ainda, a presença de um General da ativa como Chefe da Casa Civil VINCULA a Instituição Militar ao Governo de forma direta. Chega-se assim a um patamar novo.
O GOVERNO NÃO É MILITAR, mas a Instituição Militar a ele se associa, com os ganhos e riscos dessa sociedade. Se o governo for bem, e nada indica que irá, as FF.AA. serão sócias políticas do ganho, MAS se for mal, como tudo indica que irá, pagarão em prestígio e associação essas perdas. É um alto risco a que a Instituição se submete.
Não adianta dizer que a Instituição Militar não está ela mesma associada ao Governo. Está não só pela presença em grande número de oficiais da reserva, mas especialmente porque o Chefe do Estado Maior do Exército, número 2 da hierarquia da Arma, tem sua presença dentro do Palácio Presidencial. É uma situação complicadíssima.
O Governo Bolsonaro NÃO é um governo militar – mas, pior ainda, é um Governo errático, sem projeto nacional, sem objetivos claros de desenvolvimento e inserção social, com largos componentes de seita ideológica de baixa extração, regidas por um astrólogo maluco que mora no exterior, com enormes carências e antagonismos em áreas cruciais como Educação, Meio Ambiente e Relações Exteriores, áreas que operam contra objetivos nacionais permanentes a que as FF.AA. estão tradicionalmente associadas, o que aumenta os riscos da presença militar nesse Governo.
O centro do Poder arrasta o País para zonas conflituosas em setores-chaves dos objetivos nacionais, MAS aparentemente as FF.AA. dentro desse Governo não têm poder para alterar esses rumos quase suicidas e que levam o País a um abismo em educação, meio ambiente e diplomacia; são sócias no Palácio, mas não podem influenciar e muito menos mandar em setores críticos dessa associação de Poder.
Tudo isso sem falar em ECONOMIA – área onde também as FF.AA. não têm influência e para onde o Governo leva o País para um buraco negro, especialmente após a crise da Pandemia.  Ou seja, a associação minoritária das FF.AA. a um Governo sobre o qual têm escassa autoridade traz a noção de que as FF.AA. serão mais sócias nas perdas do que nos ganhos eventuais de um governo que tem a sina do fracasso absoluto em todas as áreas, agora também na área sanitária e com a consequente crise econômica.
Há os que anotam que a presença de militares no Governo Bolsonaro serve ao País como contraponto ao comportamento errático e imprevisível do Chefe do Executivo.
Pode ser e só a Historia dirá, mas a operação, especialmente na área diplomática, já traz sérios prejuízos em curto prazo aos interesses nacionais, por uma diplomacia que joga no despenhadeiro da irrelevância um sólido capital geopolítico que o Pais acumulou desde a participação na Segunda Guerra Mundial e na condição de País principal na participação em Missões de Paz das Nações Unidas.
Nenhum outro País foi tão solicitado pela ONU para Missões como o Brasil – que em 2017 estava presente simultaneamente em NOVE Missões e com o Comando na maior delas, a da Republica do Congo (General Santos Cruz),  além do capital diplomático pela presença equidistante e pacificadora em grandes conflitos, como na questão palestina.
Tudo hoje seriamente comprometido pela submissão abjeta, porque sequer solicitada, aos interesses do Presidente Trump, que sequer são os mesmos interesses dos Estados Unidos como país amigo e aliado – a agenda Trump NÃO é a agenda dos Estados Unidos como nação e potência mundial.
Uma absurda associação com Israel em meio a um conflito que tem, por outro lado, um bilhão de muçulmanos clientes do Brasil é outro detonador de interesse nacional brasileiro sem lógica de qualquer ganho objetivo, conjunto de situações onde parece que o estamento militar, sócio menor do Presidente, não tem influência maior.
Trata-se, portanto, de uma associação bizarra, onde a Instituição Militar entra com seu enorme capital institucional e pouco ganha com isso, ao mesmo tempo em que tudo arrisca numa participação que lhe será cobrada pela população brasileira ao se manifestar a acumulação de erros de um governo sem rumo.  -  (Fonte: Aqui).

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