John Cole (EUA). (Porte Livre)
Segundo a Folha/GGN, Jair Bolsonaro assinou na manhã desta terça (15) o decreto que facilita a posse de armas no Brasil. A liberação consta em edição extraordinária do Diário Oficial da União publicada na tarde de hoje, com efeito imediato. Leia a íntegra do decreto aqui.
O jornal dá conta de que 68% da população discordam da facilitação da posse de armas.
O governo beneficiou pessoas que estão com o registro irregular com a regulação automática. Além disso, as autorizações vencidas também serão automaticamente renovadas.
Pelo texto, cada cidadão com condições de ter a posse de arma poderá ter, individualmente, até 4 unidades. Se comprovar a necessidade - em função de número de propriedades, por exemplo - este limite poderá subir.
O decreto derruba a obrigatoriedade de um delegado de polícia autorizar a posse de arma. Além disso, estende de 3 para cinco anos o prazo de validade do registro.
Quem tem criança ou pessoas com deficiência mental em casa precisa atestar cofre ou local com tranca para armazenar a arma.
"O decreto vai atingir moradores de cidades violentas, de áreas rurais, servidores públicos que exercem funções com poder de polícia e proprietários de estabelecimentos comerciais. Também serão beneficiadas pessoas que atualmente estão em situação de irregularidade, como prazo expirado para o registro."
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Eis os comentários mais criticamente contundentes que o decreto das armas suscitou até o momento:
.De Fábio de Oliveira Ribeiro:
"O Direito Administrativo é um ramo do Direito bem estruturado no Brasil. Os decretos são atos administrativos vinculados sujeitos, dentre outros limites, ao princípio da legalidade. Nenhum decreto pode transformar em regra geral algo que a Lei estabeleceu como exceção. Foi exatamente isso o que esse decreto fez. Ele deveria ser declarado nulo pelo Judiciário. A modificação da Lei do Desarmamento só pode ser objeto de deliberação no Congresso Nacional. Ao participar da elaboração desse decreto nulo, Sérgio Moro demonstrou que ignora ou despreza princípios básicos de Direito Administrativo. Portanto, ele não está mais em condições de comandar o Ministério da Justiça em razão de sua evidente ignorância ou má fé jurídica.";
.De Fábio S. Gonçalves:
"... o melhor seria uma Medida Provisória ou mesmo um Projeto de Lei
Ruim";
.De Nabantino Gonçalves:
"Se até mesmo um panaca como eu sabe que o que você acaba de descrever é uma verdade simples, fácil de entender, relacionada à hierarquia das normas legais, a partir do momento em que o Moro dá sua chancela a tal decreto e o Toffoli adianta que está tudo ok, acho que é o momento de uma reflexão igualmente elementar:
Que o Moro e o Toffoli vinham agindo à margem da lei já é constatação consolidada pelos fatos e pela análise de especialistas em direito. Mas que ambos chegariam ao ponto de redigir e dar carta branca a um decreto ilegal que será responsável pelo aumento direto do número de assassinatos no Brasil, aí já passa a beirar atividade de cunho genocida, crime imprescritível de acordo com as normas de direito internacional de que o Brasil é consignatário. Digno de nota, ainda, é o fato da imprensa, seja a oligárquica seja a independente progressista, estar fazendo vista grossa, desprezando a abordagem de mais essa ilegalidade a ser creditada na conta desse pessoal.";
.Arremate de Fábio de Oliveira Ribeiro:
"Você tem toda razão. Creio que Bolsonaro, Toffoli e Moro podem acabar sentadinhos no mesmo banco dos réus no Tribunal Penal Internacional.";
.Fechamento de Nabantino Gonçalves:
"Acho que talvez a maior pegadinha do tal decreto ilegal, por ferir a hierarquia das leis, como bem observou o Fábio Oliveira em seu comentário, pode estar no fato de anistiar os registros vencidos. Isso facilitará a vida dos que já se encontram na ilegalidade; que demonstram factualmente não possuir idoneidade civil para a posse de armas."
.Vitor, por sua vez, concluiu:
"Esses cidadãos, principalmente o Moro, tem cobertura do Departamento de Justiça Americano e, provavelmente, da CIA também. Ninguém irá incomodá-los se continuarem seguindo à risca a cartilha dos interesses dos EUA.".
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A quantidade de armas vendidas no comércio legal entre 2004 e 2017 já supera o número de unidades entregues voluntariamente por meio da campanha do desarmamento, criada em 2004.
Não obstante, a questão técnica do Decreto das Armas (se sua emissão foi legal ou ilegal) é controversa. Transcrevemos a seguir o que foi abordado pela BBC News Brasil (aqui):
"...BOLSONARO PODE MUDAR ESSAS REGRAS POR DECRETO?
Mudanças feitas por decreto passam a valer sem o aval do Congresso. No passado, essa forma de legislar já foi alvo de questionamentos jurídicos.
Uma das funções de um decreto é detalhar aspectos da legislação.
"Uma matéria tão importante não pode ser regulada por decreto", diz Ignacio Cano, especialista em segurança pública da Uerj (Universidade do Estado do Rio de Janeiro).
João Paulo Martinelli, criminalista e professor do curso de direito penal do IDP-São Paulo, acha que o texto amplia excessivamente a autorização para posse. "Até hoje o interessado teria que demonstrar a efetiva necessidade para a aquisição de arma de fogo. Agora foram inseridas hipóteses em que há presunção da necessidade. Se o requerente se enquadrar em alguma delas, não será necessário demonstrar a necessidade. São muitos grupos. A regra, que era não poder ter arma de fogo, passou agora a ser exceção, pois é muito fácil se enquadrar nessas hipóteses. Como fiscalizar essa posse?"
Outra especialista ouvida pela BBC, Vera Chemim, advogada constitucionalista, mestre em direito público administrativo pela FGV, diz que essas mudanças podem ser feitas por decreto pois não alteram fundamentalmente a lei, apenas detalham seu funcionamento.
"Esse decreto está modificando outro, o que foi expedido um ano após o estatuto. O objetivo é modificar alguns dispositivos e criar novos dentro do contexto da lei. Não veja nenhuma mudança de caráter ilegal, que extrapole o conteúdo da lei", diz ela.
Segundo João Paulo Martelli, se o decreto alterar a lei, o Judiciário terá que fazer o controle de legalidade. De acordo com ele, caberia à Procuradoria Geral da República (PGR) fazer um questionamento ao Superior Tribunal de Justiça (STJ). Outras instituições legítimas também poderiam recorrer ao Supremo Tribunal Federal caso considerem que o decreto fere a relação entre os poderes executivo e legislativo.
"Tem um ponto que merece análise jurídica mais cuidadosa", defende Gabriel Sampaio, que foi secretário de assuntos legislativos do Ministério da Justiça no governo Dilma Rousseff (PT). "A lei diz que, além de declarar efetiva necessidade, a pessoa deve cumprir certos requisitos. Ao tratar da declaração da efetiva necessidade, ela estabelece um critério normativo, preestabelecendo quais condições determinam a efetiva necessidade, e quebra a lógica do estatuto. A efetiva necessidade de alguém ter a posse tem que estar associada a uma situação concreta vivida por essa pessoa, e não uma situação tratada de forma abstrata. Em outras palavras, o decreto em alguma medida esvazia o sentido da lei." (...). - (BBC News Brasil - "Decreto de Bolsonaro facilita porte de arma; entenda como funciona a lei e o que muda agora" - AQUI).
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.Parece-nos que o comentário de Fábio de Oliveira Ribeiro é pertinente: o decreto incorre em vício de origem, devendo, em decorrência, ser questionado.
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