Presidentes houve que tiveram de enfrentar quadras de doloroso constrangimento. Alguns apeados do poder por força de armas; outros, sob pressão político-partidária ou reféns, sem que tenham faltado aqueles que caíram, por não cederem a interesses inconfessáveis. Vargas, protagonista da tragédia maior, decretou sua própria morte. Mas nenhum preso, o que fez desta sexta-feira um dia melancólico, tanto para qualquer um de nós, que amanhecemos com ele, mas, se a História tem alma, também para ela, que haverá de dobrar essa página com imenso pesar. Ela, talvez mais ainda, porque estará guardando para o futuro uma sentença prolatada quando o julgamento ainda caminha, à procura de provas, não circunstanciais, mas consistentes. Lula está no centro dessa tragédia, cujo lance mais chocante, com sinais de exagero, foi a fixação da hora para se apresentar ao carcereiro.
Neste mesmo espaço, cedendo a compromissos que supõe inarredáveis, este jornal levantou-se para afirmar que Lula precisava, como ainda precisa, ser tomado na conta de vítima privilegiada de uma estrutura política que se deixou dominar por vícios que, de tão poderosos, são capazes de ditar ao presidente concessões ou arbítrios que ele, em sã consciência, não toleraria. A reflexão ainda faz sentido hoje, porque a estrutura asfixiante sobrevive e vai sobreviver. Além do mais, é permitido denunciar que falta alguém no banco dos réus em que Lula se sentou. Quem? Os patriarcas das oligarquias que se elegem e se reelegem infinitamente, e na prática desse crime são capazes de fazer tanto, ou mais, do que se atribui ao ex-presidente. O juiz Moro devia dar assento nesse banco aos que armam esquemas milionários para fazer a estreia de seus filhos e dos cônjuges na política, sem faltar espaço para os amigos do poder, que descobrem em pizzaria malas de muitos milhares de dólares. E os senadores, que se subornam, mas afirmam que se trata apenas de empréstimo pessoal e amigável. Em que celas o douto Moro mandaria que se hospedem os autores desse velhaco fundo partidário, onde vão beber os sedentos de sempre? Lula, solitário, por ser acusado de receber, de prêmio, um tríplex, o que é grave, mas depende de comprovação. E os que serviam fielmente a governos anteriores e hoje têm trânsito livre no gabinete presidencial, ou quem, ironicamente ministro da Justiça na gestão Fernando Henrique, pratica, à vista de todos, acrobacia entre as dezenas de processos em que se indiciou.
O mundo desaba nas costas do metalúrgico, sob o olhar indiferente de gente impune. Que dia triste!"
(Do Jornal do Brasil, edição desta data, editorial sob o título "O Brasil não merece esse Brasil" - AQUI.
Para que não se diga que os editoriais de grandes veículos de comunicação brasileiros foram unânimes quanto à sentença contra o ex-presidente).
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