quarta-feira, 14 de junho de 2017

O MITO DA INFLAÇÃO COMO ALGOZ DOS POBRES


Com emprego e dinheiro no bolso, povo se vira com a inflação

Por André Araújo

Os economistas de mercado difundiram a ideia de que a inflação castiga mais os pobres do que os abastados. É lenda. A inflação castiga os RENTISTAS,  aqueles que têm capital em moeda e vivem de renda de juros.  A inflação também diminui o poder de compra dos altos salários do Estado porque esses são reajustados uma vez por ano e seu valor real decresce durante o ano.

A inflação tende a prejudicar os credores e aliviar os devedores.

O pobre sabe se defender da inflação com muito mais esperteza e criatividade do que qualquer outra classe. Os economistas de mercado operam no MUNDO DOS RENTISTAS,  de onde eles tiram sua sobrevivência: os rentistas são os clientes dos fundos de investimentos, gestoras de fortunas, corretoras e bancos que empregam os economistas de mercado.

Uma das narrativas sobre a inflação e os pobres diz que eles recebem o salário  e ficam com o dinheiro no bolso desvalorizando. É FALSO. Nos anos de inflação 1950-1994 os trabalhadores recebiam o salário no dia 5 e IMEDIATAMENTE faziam a compra do mês, pagavam seus  aluguéis e prestações, investiam o que sobrava em bens duráveis como material de construção, fogão, automóvel, ferramentas. Não ficavam com dinheiro no bolso, não havia o “pobre com o dinheiro  do salário no bolso”, fruto do desconhecimento do mundo real que esses economistas ostentam até hoje, eles conhecem economia teórica e não da vida.
Acompanhei a vida de centenas de operários de minha empresa nos anos de inflação, a maioria nordestinos ou do interior de São Paulo, seguiam um roteiro, compravam um lote de terreno a prestação, depois iam comprando mês a mês material de construção, iam construindo sua casa; demorava, mas com esforço terminavam, depois casavam, a em seguida a compra do primeiro fusquinha usado, depois ampliação da casa com puxadinho.
Assim foram formados 650 bairros em São Paulo fora dos bairros tradicionais anteriores à industrialização, os novos bairros multiplicaram por 10 a população de S.Paulo.
Alguns, não todos, compraram a prestação  apartamento na Praia Grande. Na segunda geração esses mesmos operários investiam em cursinhos para os filhos na era dos vestibulares difíceis, outros se aposentavam e abriam pequenas oficinas de consertos em sociedade com colegas ou parentes, se viravam  com grande engenhosidade, tudo isso em tempos de inflação.
Havia inflação sim, MAS havia ao mesmo tempo pleno emprego, os formados em engenharia já saíam da faculdade empregados porque havia crescimento na grande maioria dos anos nesse quase meio século, havia INFLAÇÃO e ao mesmo tempo um clima de otimismo na economia, novas fábricas surgiam  do dia para noite, havia abundância de oportunidades.
Com a inflação era impossível viver de juros, quem tinha dinheiro corria para aplicar em ativos reais que conservavam o valor do capital, especialmente imóveis e estoques de tudo, negócios, fábricas, sítios, fazendas, e com isso a economia crescia em velocidade.
A inflação não é um remédio desejado mas pode ser necessário, especialmente para SAIR DA RECESSÃO, não se sai de uma recessão sem ESTÍMULO MONETÁRIO, o que significa dinheiro nas veias da economia através de crédito barato às empresas e investimentos públicos em infraestrutura, que têm efeito multiplicador na etapa seguinte da produção de cimento, aço, tubos, fios e cabos, trilhos, asfalto, cerâmica, brita, todos setores que empregam muita mão de obra. A renda gerada pelos investimentos em infraestrutura se multiplica rapidamente para compra de bens duráveis, o que movimenta a economia.
MAS o maior dano causado à economia pelo regime de METAS DE INFLAÇÃO é a politica cambial. Foi essa politica que já vinha do segundo mandato do governo Lula que causou a recessão e não o déficit orçamentário. Déficit causa inflação e não recessão, o que causa a recessão é a VALORIZAÇÃO DO REAL, que prejudica e pode acabar com a indústria, e essa politica cambial é usada para se atingir a meta de inflação. Valoriza-se ARTIFICIALMENTE O REAL para com isso baixar o preço das matérias-primas  importadas e a partir dessa manobra segurar a inflação através da importação de bens de consumo, matérias-primas e máquinas.
Ao mesmo tempo essa politica estimula as importações e dificulta as exportações, estimula o gasto de brasileiros no exterior e desestimula o turismo de estrangeiros no Brasil.
É uma POLITICA PRÓ RECESSÃO, suicida para se aplicar, quando o caminho é o contrário, é estimular a exportação, encarecer a importação, induzir os que têm dinheiro a investir em negócios e imóveis e não em papéis do governo.
A super valorização da MOEDA causou a crise do fim do governo Fernando Henrique, a ruína da Argentina no governo Menem, e é a causa da maioria das recessões na história econômica.
É um monumental erro de análise, difundido  pelos economistas de mercado, dizer que a atual recessão é causada pelo déficit público. Este é um sinal ruim e deve ser combatido, especialmente porque ele é um déficit causado por despesas correntes de péssima eficiência como salários altos de servidores cujo valor econômico do trabalho  é muito menor do que aquilo que ganham, prédios luxuosos para órgãos do governo que poderiam funcionar em áreas de aluguel bem mais barato, imensas ineficiências em hospitais, universidades e ambulatórios, descompasso entre compra de equipamentos e as instalações para abrigá-los, obras públicas paradas por meses ou anos por questões burocráticas, um DÉFICIT RUINOSO, causado por má aplicação de recursos públicos.
Mas com tudo isso não é o déficit a causa da recessão, e sim a POLÍTICA CAMBIAL, que induz a política monetária baseada no desalinhamento dos juros reais internos com os juros internacionais. Hoje a taxa SELIC de 11,25% menos a inflação de 4,2% significa um JURO REAL de 7% ao ano, quando a média internacional de juros básicos é de 1,5 a 1,75% ao ano. (Nota deste blog: A taxa SELIC está em 10,25%, atualmente - aqui -; este artigo foi escrito antes das novas medidas do COPOM).
Esse desalinhamento gera um custo ARTIFICIAL da dívida pública, que é QUATRO vezes maior que o déficit primário, cujo ajuste é a base de toda a atual politica econômica.
O paciente está morrendo de câncer e toda a equipe médica está voltada para tratar do resfriado desse paciente, essa é a lógica da atual politica econômica brasileira.
E os economistas de mercado e seus arautos na mídia dizem que “a política está no caminho certo e os dados indicam uma melhora” para frente, é um desejo que transformam numa fantasia, numa realidade artificial, fake news,  nada, nenhum dado indica que se caminha para o fim da recessão, tampouco adianta um fim em cinco ou dez anos, apenas porque não há mais como cair; a recessão se esgota, mas depois de enorme sofrimento e destruição de riqueza, por causas naturais e não por uma politica inteligente anti-recessiva.
Se a única saída de uma recessão for a natureza, de que servem as escolas de economia?
A previsão dos economistas de mercado é de um crescimento de 0,46% este ano, a fração é ridícula nem um reles prognóstico,  e de 2% no ano que vem. Considerando que as projeções são sobre uma base de PIB degradada em 8% nos últimos três anos, as projeções são UMA CONFISSÃO DO ERRO, está-se apenas recuperando mínima parte da perda, o Pais não ganha nada, apenas repõe pequena parte da perda, toda uma série de medidas que indicam um ERRO MONUMENTAL DA POLÍTICA ECONÔMICA. Quer dizer que no fim de 2018 o Brasil continuará com um PIB ainda 5,5% ABAIXO  do PIB de 2012, não há maior confissão de fracasso de um programa econômico, a estabilidade na recessão com miséria crescente.
A referendar o fracasso está a deplorável situação da Grécia hoje, após  9 anos de recessão, com uma queda de 25% do PIB; a Grécia entra em DEPRESSÃO, como resultado da MESMA POLÍTICA HOJE APLICADA NO BRASIL, o que demonstra de forma acabada e inequívoca que NÃO SE SAI DA RECESSÃO COM MEDIDAS DE AJUSTE. O caminho da saída da recessão é o ESTIMULO MONETÁRIO, é a expansão dos meios de pagamento e não o seu contrário, que é uma política de juros muito acima da média internacional para com isso ENXUGAR OS MEIOS DE PAGAMENTO  e  diminuir o poder de compra  para  fazer a inflação baixar.
O Brasil está seguindo  o caminho da Grécia, com a diferença que a Grécia não tem moeda própria e o Brasil tem, não precisa se apertar na camisa de força que foi imposta à Grécia pelo Banco Central Europeu, empobrecendo extraordinariamente sua população e elevando o desemprego a 23% (na realidade é maior, porque muitos não procuram mais emprego e não entram na estatística).
O Brasil tem potencialidades, dimensão, recursos muito maiores que a Grécia, e tem MOEDA própria, não depende de um Banco Central fora de seu território, por isso mesmo é um imenso equivoco seguir uma POLÍTICA DE AUSTERICÍDIO À LA GREGA, quando, ao contrário da Grécia, o Brasil tem reservas internacionais suficientes para garantir o funcionamento da economia, não depende de importar alimentos e em boa parte  é  auto suficiente em energia, condições que a Grécia não tinha e não tem.
O custo social e econômico da atual politica monetária e cambial é infinitamente MAIOR do que qualquer  risco a ser corrido com um programa de estímulo monetário para obras de infraestrutura e crédito de baixo custo às empresas. Mais de 1.500 obras paralisadas no País, projetos prontos e não executados por falta de verba, serviços essenciais em saúde e educação cada vez mais precários... QUAL O CUSTO DA RECESSÃO?  Quatro por cento de um PIB de US$2 trilhões em 2015 equivale a US$80 bilhões, no ano seguinte de 2016 foram outros 3,8% mais os 4% carregados do ano anterior,  US$152 bilhões, só nestes dois anos foram US$232 bilhões de produção perdida, mais o custo social de 14 milhões de desempregados; os custos de uma recessão superam os custos de uma guerra e no entanto o Brasil não precisaria estar em recessão exclusivamente para manter a ficção dessa fantasia
Na realidade todo esse raciocínio acima apontado se refere ao RISCO DE INFLAÇÃO implícito em uma politica de estímulos monetários, MAS em um quadro de profunda recessão um programa de investimentos em infraestrutura de R$2 trilhões há grande possibilidade de não gerar inflação dada a enorme capacidade ociosa e grande desemprego que está hoje na base da economia recessiva. Um programa de R$2 trilhões significa desembolsos espaçados de R$ R$80 bilhões por mês, o que provavelmente não irá gerar impacto nos preços dada a abundância de oferta de produto, serviços e mão de obra na economia brasileira.
Do ponto de vista político, METAS DE INFLAÇÃO é uma ideologia concentradora de renda, aumenta a participação do capital na economia e facilita a concentração de riqueza e renda na parte da população que tem LIQUIDEZ EM MOEDA, ou seja, os ricos, rentistas e banqueiros.
Já do ponto de vista político, um programa  de expansão monetária DESCONCENTRA RENDA, a irrigação de moeda  chega a todas as camadas de população diluindo o poder de quem tem alta liquidez, qual seja, os ricos. A EXPANSÃO MONETÁRIA é um programa benéfico às populações mais pobres porque  se reverte o fluxo do rio monetário que na política de METAS DE INFLAÇÃO corre só para cima, para quem já é rico; já na expansão monetária o rio corre para baixo, para quem não tem dinheiro ou emprego.
A política de EXPANSÃO MONETÁRIA é a única política possível para o Brasil sair da recessão, dadas as condições do Pais; não somos uma Suíça ou uma Suécia para praticar a máxima ortodoxia monetária que é hoje a única  base da atual politica econômica brasileira.  -  (Fonte: Jornal GGN - aqui).


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Permitimo-nos transcrever um dos comentários suscitados (de autoria de um enigmático 'Rpv'):

"Sua crítica, num primeiro momento, me fez lembrar de duas metáforas, aliás, com o mesmo bicho.
Uma é do escorpião atravessando o rio. A outra é do sapo, que, quando é jogado na água quente, pula, mas quando colocado numa água que vai esquentando aos poucos, morre cozido.
Lembrei-me delas ao refletir sobre os rentistas que emprestam seu dinheiro para financiar o Estado e, ao mesmo tempo, cobram juros tão altos que inviabilizam seu desenvolvimento.
E aqui cabe observar que não há nada de errado em querer maximizar o rendimento de seu capital, o problema é que, à medida que você empresta com uma mão e tira com a outra, você inviabiliza o pagamento do seu devedor. Em outras palavras, os capitalistas financiam o Estado, gestor macro da economia nacional, e, ao mesmo tempo, sugam todo esse recurso através de juros extorsivos, os quais, no longo prazo, não apenas inviabilizam a remuneração desse capital, mas o próprio Estado e a economia nacional.
Mas aí, pensando nessa alma suicida ou na sua incapacidade de perceber o aumento da temperatura nas ruas, me dei conta de um detalhe.
A lógica dos rentistas não é suicida.
E onde está sua esperteza - o “pulo do sapo”?
Eles podem trocar real por dólar e cair fora.
Ou seja, primeiro transformam seus ativos em moeda corrente, depois emprestam a juros extorsivos e, na iminência de quebrar o Estado, trocam reais por dólar e caem fora, deixando o país quebrar "com os brasileiros dentro".
O mico fica com a população, que não pode sair do país.
E depois de tudo isso, esses mesmos rentistas podem, pós-depreciação dos ativos e apreciação do dólar, recomprá-los, embolsando a diferença. Logicamente, se acharem interessante.
E disso tudo se conclui uma coisa.
Não há nação sem patriotas. Isto é, não basta ser “elite dirigente”, é preciso amar sua terra, a ponto de não imaginar outro lugar para viver. Ou alguém imagina a “elite dirigente” americana pensando em morar na China?
Acredito que aí estão as vísceras da política econômica brasileira. De um lado, o desprezo à pátria e, do outro, a possibilidade de trocar reais por dólares enquanto os aviões aguardam, de tanque cheio nos hangares dos aeroportos, a hora da partida.
Tipo: "Não vejo a hora de desfrutar as riquezas brasileiras, transformadas em dólares, em solo estrangeiro".
O que falta aos economistas é ouvir Tom Jobim, aquele que cantou e encantou Frank Sinatra, mas nunca deixou de amar Ipanema.
Falta ouvir mais os outros três “Antônios*” para aprender a amar nosso país. Não é apenas para apreciar as aves que aqui gorjeiam, mas, principalmente, para valorizar nossa cor, nosso jeito de falar, nossas festas, danças, enfim, nossa cultura, nosso modo de ser, pensar e amar.
*http://jornalggn.com.br/blog/gilberto-cruvinel/3-antonios-e-1-jobim "

....
Os textos acima são típicas manifestações para as quais os austericidas, por motivos óbvios, torcem o nariz.

Nota: Vale a pena ler os demais comentários que a análise de André Araújo motivou.

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