O jogo rasteiro das multinacionais impõe pesados prejuízos a quase todos os países de origem e gordos lucros para os conglomerados e para os 'países eleitos', eufemismo para paraísos fiscais. Mas a JBS (65 empresas nos EUA) vai se comportar direitinho, a exemplo nas demais, na terra de Tio Sam, onde, por sinal, as doações eleitorais de empresas são ilimitadas, desde que declaradas à justiça; doações eleitorais fraudulentas e subornos, só 'lá fora', e caso preservem interesses de múltis aliadas de estados fortes, se é que isso existe. Como agiu a alemã Siemens, p. ex., fora de seu país.
(Comovente, agora, é ver matérias da GloboNews denunciando a leniência de órgãos como o Ibama e outros para com a JBS, que pôde/pode ostentar certificados de qualidade de seus produtos mundo afora mesmo não havendo sido efetiva e eficazmente rastreada/fiscalizada pelos agentes estatais. De repente, a operação carne fraca parece ter tido algum mérito, que não o de atentar contra os interesses comerciais estratégicos nacionais...).
Mas, voltando ao jogo rasteiro das múltis, vejamos a análise de Mathias Alencastro, cientista político e doutor pela Universidade de Oxford:
JBS e as artimanhas fiscais
Por Mathias Alencastro
O espetáculo da delação e subsequente deserção da JBS, que trocou a confissão de uma multitude de crimes pelo direito de transferir a sede para fora do país, causou indignação entre os brasileiros. E colocou em cima da mesa um tema quase tabu: a otimização fiscal, modalidade olímpica das multinacionais.
Perfeitamente legal, e por isso diferente da sonegação fiscal, a otimização fiscal é engrenagem essencial da máquina financeira moderna. A rota de fuga traçada pelos irmãos Batista, por exemplo, é de uma banalidade desoladora.
Com a abertura da holding na Holanda, a JBS se tornará vizinha de centenas de multinacionais que se instalaram por lá em busca de blindagem legal e institucional.
À imagem da Irlanda e de Luxemburgo, outros suspeitos de costume, o país oferece uma rede grande e confiável de acordos de dupla tributação. É mais vantajoso investir no Brasil através da Holanda do que de um parceiro privilegiado como Portugal.
Os defensores da otimização fiscal veem nela um "mal necessário" da economia globalizada.
Os críticos denunciam uma prática perversa e pérfida, além de ser profundamente antipatriótica.
Os críticos denunciam uma prática perversa e pérfida, além de ser profundamente antipatriótica.
Numa tentativa de resgatar a credibilidade da União Europeia nessa questão, Emmanuel Macron, em sua primeira entrevista coletiva com Angela Merkel, designou a harmonização fiscal dentro do espaço europeu como prioridade do seu governo.
Uma ameaça pouco velada ao Reino Unido, que planeja tirar proveito da disparidade existente na União Europeia para reduzir seus encargos tributários e assegurar o estatuto de praça financeira de Londres depois do "brexit".
Porém os governos que se insurgem regularmente contra a otimização fiscal também são os guardiões desse sistema.
Antes de assumir a presidência da Comissão Europeia, Jean-Claude Juncker, interlocutor-chave de Merkel e Macron, conduziu enquanto premiê a transformação de Luxemburgo em centro de lavagem de dinheiro.
O pacato país de 500 mil habitantes, que tributa uma porcentagem ínfima dos dividendos, tem o maior volume de investimento externo da União Europeia.
Sem uma ação coordenada das autoridades da UE, os países-membros estão condenados a sacrificar a arrecadação tributária no altar da competitividade fiscal. Nessa corrida rumo ao abismo, quem ganha são as empresas, e quem perde são os Estados, da Europa e do mundo. As artimanhas fiscais, legais e ilegais, custam cerca de US$ 50 bilhões por ano aos países africanos, o equivalente do que recebem em ajuda e investimento externo.
Diante dessa constatação de impotência frente à manobra da JBS, resta a resistência cívica. O "tax shaming", movimento que revela e divulga as manobras fiscais das multinacionais, deixou os mastodontes GAFA –Google, Amazon e Facebook– numa saia justa.
Incapazes de obrigar todos os empresários a pagar impostos onde produzem lucros, os cidadãos podem, pelo menos, através de manifestações públicas, sinalizar que tais práticas não passarão mais despercebidas e não serão esquecidas. - (Fonte: Folha; post reproduzido no Jornal GGN - AQUI).
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Não podemos deixar de transcrever o desabafo do leitor Severino Januário:
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Não podemos deixar de transcrever o desabafo do leitor Severino Januário:
"Este é o grande e patriótico empresariado do Brasil! Depois de subornar, corromper e prostituir boa parte do mundo político nacional, o grande empreendedor deixa em seu próprio país um rastro inextinguível de dissolução moral e se muda de mala e cuia para os Estados Unidos, onde deverá ser recebido de braços abertos. Esta teria sido a razão de tanto trânsito de gente do Departamento de Justiça daquele país ultimamente. Para que pudesse crescer e aparecer, ele gozou dos créditos especiais de nosso banco público de fomento, mas o retorno que deu foi a execração e a desmoralização da vida pública nacional.
Neste caso em particular, os concorrentes do norte não precisaram destruir os concorrentes do sul, já que lucraram muito mais por outra via: Conseguiram ganhar sem qualquer ônus a maior empresa do negócio da carne do mundo, que um dia foi brasileira e hoje é tão americana quanto a Estátua da Liberdade. Parabéns para eles, e mais uma pesada tristeza para nós.
O que devemos fazer? Entregar-nos à depressão e ao derrotismo? Não, o que precisamos é deixar de ser ingênuos e lutar de todos os modos para afastar da vida política essa chaga purulenta que é o predomínio da influência empresarial nas eleições. Aí está o terrível resultado disso, e aí está a razão de nosso atraso. Se nossas leis fossem feitas para o povo e não para eles, um empresário não poderia nos fazer o que este nos fez. Não é nosso povo que é atavicamente atrasado, é nossa classe empresarial, que embora viva em função do povo, o odeia, controla sua política, persegue seus legítimos representantes e não permite que ele se eduque e se desenvolva."
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