segunda-feira, 8 de maio de 2017

DO RETROCESSO CIVILIZATÓRIO


Revogue-se a Lei da Abolição

Por Frei Betto

Não satisfeito com a reforma trabalhista que retira direitos dos trabalhadores e favorece interesses dos patrões, o deputado federal Nilson Leitão (PSDB-MT), líder da bancada ruralista, encaminhou projeto que reintroduz no Brasil a neoescravatura.

A proposta é de estarrecer: os trabalhadores rurais não seriam pagos apenas com salários, mas também mediante “remuneração de qualquer espécie”, como oferta de moradia e alimentação.

Esse descaso com os direitos humanos é um retrocesso civilizatório. Se aprovado o projeto, fazendeiros que só têm olhos para suas contas bancárias dirão ao empregado: “Vou lhe fornecer casa e comida. E este será o pagamento pelo seu trabalho, uma vez que vai morar e comer de graça.”

O projeto prevê ainda que a jornada diária poderá se estender por 12 horas! Anula-se assim o 1º de Maio, data na qual os trabalhadores comemoram a conquista das 8 horas diárias. E só haverá dia de descanso após 18 dias de trabalho consecutivo. Ou seja, além de o trabalhador jamais desfrutar de aposentadoria, devido à desumana reforma previdenciária em pauta, teria sua morte antecipada por exaustão. Quem nunca pegou no cabo de enxada não tem ideia do que significa lidar com a terra sob sol ou chuva.

O deputado do PSDB, sem nenhum pudor diante da Declaração Universal dos Direitos Humanos e da Constituição Cidadã de 1988, propõe ainda: o que negociarem patrão e empregado valerá mais que a legislação trabalhista; a CLT não mais protegerá o trabalhador rural; autoriza-se trabalho aos domingos e feriados sem necessidade de laudos; empregado que morar no local de trabalho poderá vender integralmente as férias; revogam-se as normas do Ministério do Trabalho sobre saúde e segurança no campo; as regras sobre agrotóxicos não mais serão definidas pelos ministérios do Trabalho e da Saúde etc.

O Brasil acelerou o seu retrocesso com o governo Temer. Fala-se que a Previdência é deficitária e se reduzem os direitos dos trabalhadores de baixa renda, sem no entanto tocar nas gordas aposentadorias de políticos que exerceram dois mandatos, e de membros das Forças Armadas e do Poder Judiciário.

Há muita grita de “fora Temer” e repulsa a parlamentares favoráveis às reformas trabalhistas e previdenciárias. Nenhum deles, porém, entrou no Congresso Nacional pela porta dos fundos. Foram todos eleitos nas urnas.

Ano que vem termina o mandato de todos os deputados e de 27 senadores. Novos deputados e  54 senadores serão eleitos. E em 2018 não será fácil utilizar o caixa dois.

Portanto, a questão que se coloca não é apenas em quem cada eleitor votará. É iniciar, desde hoje, campanha em prol de candidatos que sejam comprovadamente éticos e comprometidos com os direitos dos segmentos mais pobres e discriminados de nossa população.

Como canta Geraldo Vandré, “quem sabe faz a hora, não espera acontecer.” Tomara que deputados e senadores eleitos em 2018 não possam entoar, ao tomarem posse, o verso de Belchior: “Ainda somos os mesmos!”  -  (Fonte: aqui).

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