quarta-feira, 7 de dezembro de 2016

COMO CHEGAR A BANANALÂNDIA


"Os pretensos boys magia da Car Wash, na República de Curitiba, foram tragados por alguma espécie de histerismo paranoico diante de uma decisão tomada pela Câmara dos Deputados, em Brasília, que soterrou as desmedidas criadas e capitaneadas pelos magnânimos Redentoristas da Procuradoria da República. Travestidas de projeto de iniciativa popular, as desmedidas apresentadas foram gestadas por longos meses no ventre de todos os Ministérios Públicos do Brasil, com utilização de expressivos recursos públicos.
Não me surpreenderia se tivéssemos a notícia de que palestras e assinaturas ao projeto fossem critérios de avaliação do estágio probatório dos que recém ingressaram na carreira. Não se aventa, portanto, iniciativa popular nas medidas que propalavam necessárias para o combate eficiente à corrupção. Tudo foi um sortilégio. A iniciativa do projeto de lei é de um ente estatal chamado Ministério Público, o qual usou toda a sua estrutura e poder de fogo para buscar assinaturas de cidadãos induzidos a erro pelo título do projeto. O título do projeto de lei vendia combate à corrupção, mas o conteúdo dava ao cidadão também opressão e violação de direitos fundamentais.
De cunho autoritário, algumas delas buscavam solapar em suas bases o estado democrático de direito para que se erigisse, em seu lugar, um estado policialesco gerido por integrantes de um ministério cada vez menos público e cada vez mais corporativo, unido na sanha persecutória inspirada no segregacionismo, na parcialidade seletiva e no sectarismo social, ideológico e político.
O Projeto aprovado (pela Câmara) - e talvez deva ser essa a razão do ódio profundo que suas Excelências devotam ao parlamento integrado por deputados eleitos pelo voto popular - inclui responsabilização criminal para promotores e juízes, entre outros atos, por atos ilícitos por eles praticados, antes “punidos” apenas na seara disciplinar. Com arroubos próprios de primas-donas descompensadas, sem qualquer razoabilidade, “ameaçaram” renunciar caso o projeto legislativo seja sancionado pelo Presidente. Um motim praticado por altos servidores públicos, integrantes de uma Carreira de Estado, que estão no topo da pirâmide da remuneração estatal.  Este disparate dos Procuradores da República, junto com todo o conjunto da obra, é algo inominável.
Queriam acaso poder violar, sem punição alguma, a Constituição e todas as leis do país? Acaso fazem parte de uma classe de superdotados infalíveis que deve ser colocada acima de todos os demais cidadãos para poder prejudicar com seus atos, impunemente, o cidadão, a nação e o país?  Há bem pouco tempo, a lembrança me é vaga, os ilustrados integrantes da Car Wash diziam que a lei deve valer pra todos. Para todos, menos para eles.
A julgar pelo que falaram, vê-se que são muito ciosos de si e os únicos que podem fazer alguma coisa para salvar o Brasil. Passam a impressão, por este discurso mendaz e bravateiro, que a Procuradoria da República são eles e o resto dos seus pares constitui o rebotalho sem cérebro e sem estampa daquela instituição. Os demais membros do Ministério Público Federal não devem valer nem mesmo o auxílio-moradia que recebem, quanto mais o subsídio integral. É sério isso, preclaros jurisconsultos?  
Vê-se que os bem dotados juristas desta novel república nos ensinam sempre uma nuance jurídica que escapa aos simples mortais como nós.  Assim como, para dar um único exemplo, aprendemos com eles regras nunca antes vistas no cenário jurídico nacional ou mundial, do tipo que estabelecem conduções coercitivas sem lastro em Lei e na Constituição, aprendemos agora que a um membro do Ministério Público se concede a prerrogativa de dar as costas ao seu trabalho e voltar ao dolce far niente de seu gabinete ou o que quer que possa ser entendido como “voltar às nossas atividades”.
Pelo nível do discurso, deve-se entender que são uns incendiários da República que propalam proteger. Seu discurso toca as almas daqueles embebidos de ódio e rancor, em busca da destruição de um inimigo, qualquer inimigo, que possa dar vazão, como num transe, aos seus sentimentos mais violentos e lhes sirva de catarse.
Nos passam a impressão, falsa, espera-se, de que não tiveram outro interesse além de levantar, através do uso absoluto dos meios de comunicação, uma massa de cidadãos com os quais se alinharam, desde a primeira hora, na ação e na ideologia, no ódio e no rancor, para concretizar uma ruptura institucional de consequências nefastas para o nosso Brasil.  Neste domingo, 4 de dezembro, todo o planeta saberá, mais uma vez, que tipo de manifestações de massa eles tiveram a capacidade de invocar, provocar e estimular sem se importar com quaisquer consequências.
É sintomático perceber, e também é um traço revelador do que se trata, que olhando para o passado vemos uma sincronia temporal mágica entre as ações destes paladinos da justiça, do Juiz Supremo, dos vazamentos, das grandes manchetes, dos eventos políticos e das manifestações de rua. Nós, comuns mortais, sequer conseguimos planejar com tal acurácia e eficiência um almoço em família num domingo. Estes caras respeitáveis, notáveis juristas e comportados piás de prédio, fizeram uma “revolução”, alinhando-se, desavisadamente espera-se, ao que tinha de mais retrógrado no esquema de poder que submete este país debaixo de uma canga desde 1500.  A história não os absolverá. (Nota deste blog: Piá = na cultura guarani, criancinha, 'indiozinho', por aí; não conseguimos entender o uso do termo pelo escriba Furaj no contexto utilizado).
Graças a esses gênios, pioneiros da jurisdição-espetáculo, teremos, ano que vem, eleição indireta para eleger o Presidente da República pela primeira vez desde o fim do regime instaurado pela Redentora Revolução de 64.  Graças a esses notáveis de vanguarda, temos uma ÚNICA operação policial comandando os destinos de um país inteiro, gestada à forma de um seriado de televisão para durar anos, indo para a 4ª temporada, enquanto o nosso país definha econômica, social e politicamente.  Cansados da “brincadeira”, esses luminares agora ameaçam “renunciar”.  
Transformaram nossa terra numa Bananalândia.  Nosso País, com o recrudescimento das divisões internas que vão se tornando a cada dia mais inconciliáveis, está deixando de ser uma Nação. Aos poucos, também, o Brasil vai deixando de ser um País soberano.
Não, a história nunca os absolverá."



(De Fuad FurajPromotor de Justiça do Ministério Público do Estado do Paraná, post intitulado "Curitiba em transe", publicado no site jurídico 'Justificando', reproduzido no Jornal GGN - aqui.

O texto acima foi publicado antes das manifestações ocorridas no domingo passado. Destacá-lo hoje neste blog se deve ao fato de que os transtornos ora verificados em nosso País se devem basicamente à postura questionável do MPF, por seus procuradores da Lava Jato: 

a) tentativa de imposição de medidas anticorrupção, mesmo sendo algumas delas flagrantemente inconstitucionais... 

b) revolta diante das medidas que resultaram da discussão do assunto na Câmara... 

c) estímulo à realização de passeatas, nas quais o senador Renan Calheiros foi a 'estrela' execrada... [Renan, convém dizer, é tido como 'patrocinador' da proposta de lei sobre abuso de autoridade e do projeto de moralização dos supersalários, temas que atingem em cheio operadores do Direito e... promotores e procuradores]... 
[Nota: Sobre o estímulo à realização de passeatas, cumpre ler o post "Cunha, Geddel e agora Renan culpam Moreira Franco por suas respectivas quedas", do Jornal GGN - AQUI].


d) ingresso do partido Rede no STF com pedido de afastamento do senador Renan Calheiros da presidência do Senado, uma vez que o senador é "quase" réu - segundo o STF, em face de deliberação sobre inquérito instaurado anos atrás, decisão que só não foi 'sacramentada' em razão de o ministro Dias Tóffoli haver pedido vista do processo - e como tal, no entendimento do citado partido, não pode figurar na linha sucessória presidencial do País...

e) liminar expedida pelo ministro Marco Aurélio determinando o afastamento do senador Calheiros da presidência do Senado, e os desdobramentos/transtornos daí advindos). 

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