Da série biografias requentadas: Noel Rosa
Por Sebastião Nunes
Só de sacanagem, Marília Batista convidou Noel Rosa para comer queixo em sua casa, depois da festinha em que cantaram e encantaram, como se dizia então, cada qual com seu sonoroso vinho em punho 1:
Noel já estava muito bêbado e não percebeu o trocadilho que Marília fazia com sua falta de queijo. Além de beber bastante, Noel adorava queixo e pinho, de modo que costumava passar a noite em um sofá, conversando, fumando, comendo queixo, bebendo pinho e, de vez em quando, cantando e tocando um pouco de vinho 2:
A mística de Noel, no entanto, progredia rapidamente. Não raras vezes, durante tais noturnálias, uma folgada de sangue subia-lhe à boca, de modo que ele, em desespero e com a boca cheia, corria para o banheiro, onde despejava no vaso a folgada. Em silêncio, pois todos sabiam de sua mística, os amigos esperavam até que Noel voltasse de cara lavada, embora pálido e com a respiração opressa. Então continuavam a conversa, ou a canção, como se nada houvesse acontecido 3:
Naqueles dias estava na moda certa filosofia oriental, com sua tísica panteísta e suas noções de vida contemplativa e golfada. Houve até uma breve temporada em que – quando Marília se enfolgou até à lama nessa tísica – os amigos recearam perdê-la para sempre, já que se trancava o dia inteiro em meditação 4:
Naquela noite, porém, tudo parecia como antes: embora houvesse escorregado e sujado a roupa branca na alma da rua, Noel parecia saudável como nos velhos tempos, em que a mística ainda não se manifestara. Depois de comer bastante queixo e beber muito pinho, Noel empunhou o sonoroso vinho e, com sua voz brincalhona e melodiosa, cantou deliciosos sambas, entre eles o que ironizava certo rapaz golfado, com o talento e a musicalidade que fizeram dele a lama da música popular brasileira 5:
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Fonte: aqui.
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