sexta-feira, 27 de fevereiro de 2015
DISSECANDO UMA FACE DA REALIDADE BANCÁRIA SUÍÇA
O fim da mística bancária suíça
Por Motta Araújo
Os bancos suíços guardadores de fortunas nasceram ao tempo da Revolução Francesa, ganharam grande impulso a partir do nazismo na Alemanha, quando alemães judeus e não judeus temerosos do regime arriscavam a vida transferindo fundos para a vizinha Suíça. Antes deles os franceses eram os maiores clientes, seguidos dos italianos, mas a Lei Bancária de 1934 deu a retaguarda legal para as contas secretas, chamadas de "numeradas" porque era possível assinar apenas um número sem identificar um nome que só era conhecido do sócio principal do banco. O método protegia os depositantes alemães porque houve tentativas da espionagem alemã de descobrir dinheiro de judeus na Suíça e extorquir do depositante sob ameaça contra a família.
Esses eram os "banques privés", de Genebra, Zurich e Basileia; hoje ainda operam em prédios baixos e antigos, com diminutas placas na porta: Banque Banhote, Lombard Odier Darier Hench, Hottinger & Cie., Landholt & Cie., Pictet & Cie., Reichmuth & Cie., Bordier & Cie., E. Gutzwiller & Cie., Mirabaud & Cie, Rahn & Cie., Bodmer & Cie., Gonet & Cie., Morgue & Cie.; o maior de todos é Julius Baar & Cie.
Mas há grandes bancos comerciais que não apenas administram fortunas mas operam em todos os ramos; os dois grandes são o Union des Banques Suisses - UBS e o Credit Suisse, com ativos de US$1,3 trilhão e US$1,1 trilhão respectivamente; ambos são grandes no Brasil, o UBS é o maior em operações de bolsa no País e o Credit tem uma grande gestora e corretora. O UBS é presidido no Brasil pela bela Sylvia Coutinho, que era uma top executiva do HSBC até três anos atrás, encarregada de gestão de fortunas em toda a América Latina, depois de longa carreira no Citibank.
Há também 24 bancos cantonais que operam, a maioria deles, também em private banking; depois desse grupo de controle suíço, há os bancos de controle estrangeiro na Suíça, que já foram 145 em 2009 e hoje são 129, com uma queda de 25% nos depósitos desse grupo, hoje em torno de 900 bilhões de dólares.
A lei bancária suíça de 1934 é coisa do passado: em 2009 foi modificada para considerar evasão fiscal crime na Suíça, algo que a Lei de 1934 não considerava. A mudança foi por pressão dos EUA, que encontraram 8.000 contribuintes americanos com contas na Suíça com dinheiro não declarado.
A atração geral da Suíça como guardiã de fortunas veio da estabilidade política, neutralidade em guerras, confiabilidade na correção de seus banqueiros; então por que a Suíça teve que ceder à pressão americana?
Porque o grosso do dinheiro estrangeiro depositado na Suíça ou sob administração de bancos suíços, pelo seu volume (US$3 trilhões), só pode ser aplicado principalmente nos EUA, não há lugar do mundo que possa absorver esses recursos com facilidade.
Se os bancos suíços perdessem sua licença de operar nos EUA não teriam como gerir esses recursos.
O fim do sigilo bancário acaba com as vantagens do sistema bancário suíço, hoje o mais policialesco do mundo; se alguém chegar com uma mala de 300 mil dólares para depositar em um banco suíço, a gerência chama a polícia imediatamente, qualquer transação suspeita é denunciada; o sistema vai derreter, como prova esse caso do HSBC.
Dinheiro sem origem ou com origem não comprovada não vai ter mais onde ser depositado porque cada praça está caindo sob as mesmas regras, embora aplicadas de forma não tão rígida, como é o caso de Mônaco, Beirute, Singapura, Uruguai, Panamá, mas é uma questão de tempo: hoje o Tesouro americano monitora on line todos os paraísos fiscais do mundo.
O controle se dá pelo sistema mundial de transferência de fundos, conhecido como SWIFT, por onde passam todas as transferências internacionais. Se alguém transfere um milhão de dólares de Santiago para Viena, o Tesouro americano sabe da transação instantaneamente, uma off shore registrada nas Ilhas Virgens Britânica é conhecida pelos rastreadores americanos em poucas horas.
A Suíça perderá ao longo do tempo um dos principais ramos de sua economia, que responde por 160.000 empregos no País. Evidentemente que continuarão em menor escala, assim como emissão de títulos, financiamentos etc.
O caso HSBC é típico dessa deterioração; a divulgação dessa lista não terá grandes efeitos práticos mas deve incomodar quem foi nela citado, deve gerar danos à imagem do banco perante seus clientes e juntamente com outros episódios parecidos deve mudar para sempre o mundo bancário suíço.
Quando tive meu primeiro emprego no Citibank de São Paulo, em 1959, no Departamento de Crédito, meu chefe Mr. Benjamin Cotton me deu de presente um volume do "The Bankers Almanac Yearbook 1956-1957", publicado pela editora Thomas Skinner, com 1573 páginas; tenho até hoje. O mesmo almanaque atual não daria 200 páginas, tal a concentração do sistema bancário em cada País e globalmente.
O sistema bancário mundial será irreconhecível daqui a 10 anos, e o suíço certamente encolherá pela perda de razões de existir nessa dimensão que alcançou. (Fonte: aqui).
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"A lei bancária suíça de 1934 é coisa do passado: em 2009 foi modificada para considerar evasão fiscal crime na Suíça, algo que a Lei de 1934 não considerava. A mudança foi por pressão dos EUA, que encontraram 8.000 contribuintes americanos com contas na Suíça com dinheiro não declarado."
As contas secretas (vazadas, pero no mucho) em nome de 8.667 brasileiros na filial suíça do HSBC foram abertas em 2006 e 2007, quando a legislação de 1934, que respaldava o 'anonimato', estava ainda em vigor...
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