domingo, 30 de novembro de 2014
CRISE MUNDIAL: AUSTERICÍDIO NA BERLINDA
Fortalezas ideológicas neoliberais começam a ceder diante da crise
Por José Carlos de Assis
Paul Krugman, de longe o comentarista econômico mais acurado da atualidade, observa em sua coluna em The York Times que os economistas ditos ortodoxos e obcecados por duras medidas contracionistas começam a se dar conta, seis anos depois do início da crise financeira (que se tornou fiscal), de que vem recomendando medidas equivocadas de contração para enfrentá-la.
Aparentemente, depois de todos esses anos de sofrimento inútil, principalmente na Europa, os keynesianos voltam a cena em alguns centros importantes de formulação de ideologia econômica como a OCDE, que começa a pregar expansão fiscal.
Na verdade, o fundamentalismo neoliberal para enfrentar a crise não é um fenômeno que apareceu em 2008, mas sim em 2010. Em 2008, na reunião do G20 em Washington, e posteriormente em Londres e Pittsburg, em 2009, até Sarkozy se dizia keynesiano. Com isso a economia começou a recuperar-se. Foi a obsessão alemã com medidas de austeridade fiscal e monetária, ancoradas em pareceres dos tecnocratas do FMI e da OCDE, que fez abortar uma recuperação em andamento para levar os países industrializados à prolongada recessão que, na Europa, ainda continua.
O lado espantoso disso tudo é que os Estados Unidos, que têm voz proeminente nas instituições internacionais que pregam a austeridade, realizam eles próprios uma política fiscal e monetária extremamente expansiva, de corte keynesiano. É verdade que eles saíram de um déficit de 1,7 trilhão de dólares para menos de 1 trilhão; contudo, este último ainda é um déficit gigantesco. Quanto à expansão monetária, o que fizeram é sem precedentes na história: afogaram o mundo em 3,4 trilhões de dólares para "irrigar" o mercado. Não há surpresa que a economia norte-americana, diferentemente da europeia, esteja se recuperando razoavelmente nesse último ano.
A boa notícia trazida por Krugman infelizmente ainda não chegou ao Brasil. Nossos ortodoxos, isto é, nossos fiscalistas ainda não se deram conta de que a parte que eles consideram equivocada da nossa política econômica, por exemplo, a redução do superávit primário, é indiscutivelmente a parte certa num contexto de economia recessiva. Também foi certa a política de redução de juros, infelizmente abortada de forma precipitada por pressão do mercado. Mas foi equivocado o expediente de querer reduzir a inflação com aumento dos juros, aplaudido pelos falcões, quando não havia pressão real de aquecimento econômico sobre os preços.
O fato é que o neoliberalismo não reconhece a existência do ciclo econômico. Acha que a economia evolui numa linha reta ascendente, em qualquer circunstância, bafejada pela "confiança" infinita do empresariado nos seus fundamentos neoliberais. Essa crença contamina as instituições internacionais dominadas pela ortodoxia, e impregna profundamente a mídia dita especializada. Entretanto, seis anos de fracassos econômicos, sobretudo na Europa, é tempo demais. Vai chegar o momento em que até o FMI se dará conta de que não há saída fora de uma dose certa de keynesianismo e de expansão fiscal deficitária. Infelizmente, até lá, continuará o sofrimento de milhões. (Fonte: aqui).
J. Carlos de Assis - Economista, doutor pela Coppe-UFRJ, professor de Economia Internacional da UEPB.
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