sábado, 31 de maio de 2014

JB, O PODER E O PODER DA MÍDIA


"Joaquim Barbosa foi o primeiro negro a assumir uma cadeira no STF. Não foi o primeiro a protagonizar um bate-boca no Tribunal, mas certamente foi o primeiro a ser filmado fazendo isto. Foi o primeiro negro a presidir a Corte e também o que mais irritou a comunidade jurídica em razão de seu autoritarismo e incontinência verbal.

Sua ascensão meteórica, alavancada pelo apoio que granjeou na mídia ao aceitar a protelação do mensalão tucano (mais antigo) e julgar com rigor exagerado o mensalão petista, o transformou em candidato presidencial em potencial. Durante algum tempo ele pareceu alimentar a ideia. Mas quando a rejeitou de maneira inequívoca, Joaquim Barbosa desagradou bastante a mídia brasileira (que parece estar sempre à procura de um salvador da pátria que possa ser manipulado).

JB não se notabilizou pelas posições confortáveis. Mas as polêmicas jurídicas que criou não acrescentaram brilho à administração da justiça no Brasil. Digo isto pensando especialmente no mau uso que ele fez da teoria do domínio do fato para condenar petistas sem provas e apesar da presunção constitucional de inocência que eles deveriam gozar. Sob seu comando o STF passou a ser pautado pela imprensa, que adora exercer um poder político absoluto e extraconstitucional que não lhe foi atribuído pela CF/88.

A mesma imprensa que elevou JB derrubou D. Pedro I, exilou D. Pedro II, matou Getúlio Vargas e depôs João Goulart. O que teria ocorrido ao “menino pobre que salvou o Brasil” se ele tivesse escolhido aplicar serenamente a Lei no caso do mensalão petista? JB não caiu porque não tinha o apoio da imprensa. A julgar por algumas manchetes de jornal ele ainda o tem ao abandonar o STF. A imprensa poderia dizer que lhe faltou a fibra e o destemor de Ricardo Lewandowski, ministro que foi intensa e cruelmente hostilizado pelos jornalistas durante o julgamento do mensalão. Preferiu transformá-lo em vítima. Há um racismo sutil e estilizado na conduta da mídia.

No momento de sua queda, JB é tratado não como o “menino pobre que mudou o Brasil” e sim como o “menino negro” cujo pirulito foi roubado depois de algumas lambidas. A indignação hipócrita neste caso mal esconde o ódio que a imprensa devota a todos os que não se prestam a fazer o que os jornalistas desejam (José Dirceu e José Genoino que o digam). JB andou pelo tapete vermelho e recusou a coroação. Antes de concluir a tarefa que lhe foi atribuída pela imprensa (perseguir implacavelmente os petistas enquanto os mensaleiros tucanos não seriam incomodados), o negro aposentou-se mais cedo. Cedeu às “forças ocultas”, dizem alguns jornalistas. Duvido muito, pois se tivesse cedido teria ficado no cargo até o fim e quem sabe até disputado a presidência como um teleguiado das 7 famílias midiáticas.

A renúncia de JB pode ser interpretada como um ato de traição à mídia? Sim e não. Sim, porque ao deixar o palco ele terá que ser esquecido. JB não virará estrela, apenas paradigma. Doravante, toda e qualquer decisão que não seja truculenta e beneficie os réus do mensalão arrancará suspiros e recordações dos tempos gloriosos em que o “juiz negro” tratava os bandidos com rigor carcerário. Não, porque após três derrotas evidentes em eleições presidenciais a imprensa brasileira talvez já tenha percebido que não pode mais controlar sozinha a democracia brasileira. Isto explica os arroubos autoritários e saudosismos da ditadura que fazem eco cá e lá. O contexto não é muito favorável a soluções ditatoriais. Se apostar num golpe a própria imprensa será mortalmente golpeada.

Talvez JB, que é suficientemente inteligente, tenha percebido o risco de se render totalmente ao canto da sereia midiática. Nesse sentido, sua renúncia pode ser interpretada como um ato digno. Ele não sai do STF para entrar na História. Ele entra na História porque saiu do Tribunal possibilitando que a Corte Constitucional  recupere sua moderação, sua independência da mídia e, sobretudo, sua vocação para cumprir e fazer cumprir uma boa constituição."



(Por Fábio de Oliveira Ribeiro, no jornal GGN, aqui
O fato é que a mídia, mesmo após a anunciada saída do ministro, continuará influenciando o universo jurídico e político brasileiro. Todos sabem o que deve ser feito para o atendimento da recomendação expressa no artigo 220 da CF, consistente na inadmissibilidade de monopólio e oligopólio nos meios de comunicação. A mídia sabe perfeitamente quem será capaz de realizar tal intento. Daí o empenho redobrado no sentido de que a reeleição não aconteça).

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