Dilma e a reabilitação de Jango
Por Luis Nassif
Ontem, o corpo do ex-presidente João Goulart foi recebido com pompa de chefe do Estado no Palácio do Planalto.
Sua reabilitação coincide com o lançamento do documentário “O dia que durou 21 anos”, um trabalho definitivo sobre a participação do governo norte-americano no golpe de 1964. Com direção e roteiro de Camilo Tavares, pesquisou os arquivos da Casa Branca, liberados depois do prazo convencional de sigilo.
Nele, há imagens gravadas de conversas dos presidentes John Kennedy e Lyndon Johnson com o embaixador norte-americano no Brasil, Lincoln Gordon, planejando o golpe.
Há documentos mostrando o planejamento do golpe, recomendando a sua institucionalização, a aprovação da queda de Jango no parlamento, a eleição de um sucessor, todo um cerimonial para revestir o golpe como um impeachment legal e permitir a aprovação por outros países. Além do apoio tácito da 4a Frota, enviada para o país.
Pouco antes, Jango visitou Washington, acompanhado do embaixador brasileiros nos EUA Roberto Campos e do Ministro da Fazenda Walther Moreira Salles. Foi um encontro pitoresco. Jango era encantado com a mística de Kennedy. Por seu lado, Kennedy vinha da tradição rooseveltiana, de enxergar o Brasil como vítima de um atraso secular de suas elites.
Kennedy sabia, assim como o Departamento de Estado, que Jango caminhava equilibrando-se entre seu espírito conciliador e o radicalismo do cunhado Leonel Brizola – que, não sem razão, via na campanha de mídia e na movimentação civil e de militares no Rio um ensaio de golpe.
Enquanto governador, Brizola foi crucial para garantir a posse de Jango, após a renúncia de Jânio. Depois, sua atuação mais confundia do que orientava o cunhado.
Com a economia claudicando, devido à herança de JK, Jango ora recorria a uma política econômica tradicional, avalizada pelo Ministro da Fazenda Moreira Salles, para no momento seguinte enveredar por aventuras mais audaciosas, com planos econômicos de seu assessor Cibiis da Rocha Viana.
O desespero motivou gestos que acabaram por fortalecer o movimento golpista – como o comício da Central do Brasil.
Os EUA participaram mas não tiveram papel decisivo no golpe. A presença da 4a Frota deu segurança para os conspiradores avançarem, mas nem precisou ser acionada. Jango caiu sozinho, frente a um movimento conspiratório tão destrambelhado que quem deflagrou, general Olímpio Mourão Filho, nem tinha ideia do que se passava entre seus pares.
O filme foi exibido recentemente na sala de exibição do Palácio do Alvorada. A cena de Jango no comício, cercado por multidão de seguidores, não ocultava a verdade trágica: “Como estava sozinho! Como não se deu conta de que estava sendo traído”, comentou a presidente Dilma Rousseff ao final da sessão.
As cenas de Kennedy e Johnson conspirando com Gordon chocavam, numa demonstração eloquente de como os EUA invadiam estados nacionais, com a sem-cerimônia das potências imperiais.
E mereceu um comentário da presidente: “Isso nunca mais vai acontecer”. Foi logo depois do episódio da espionagem norte-americana no Brasil e do episódio de Dilma recusando a visitar os EUA antes do pedido de desculpas. (Fonte: aqui).
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