segunda-feira, 12 de agosto de 2013

AUSTERIDADE, O FLAGELO GRATUITO

Oleksy Kustovsky. (Ucrânia).

A austeridade está nos suicidando?

Por Juan Gelman

Sócrates, Platão, Plotino e muitos outros filósofos analisaram o tema do suicídio ao longo dos séculos. A maioria o condena, como o judaísmo e o cristianismo.

Para Santo Augustinho “o que mata a si mesmo é um homicida”. Os epicúreos opinaram que a falta de sofrimento é o bem supremo e justificaram o ato quando a existência, em vez de alegrar, se converte em uma causa de aflição.

Os estoicos pensavam que era um tema grave a tratar com circunspecção e, em efeito, é muito difícil desentranhar as razões pelas quais alguém se tira a vida. Nunca é uma só. Cabe dizer que as circunstâncias exteriores exercem um papel maior ou menor, algumas vezes decisivo.

No dia 1° de outubro se comemora o dia europeu contra a depressão. Entre os habitantes do Velho Continente, “imersos nesta situação de crise econômica e a prevalência do estresse por trabalho, os problemas da depressão e os suicídios estão experimentando um notável aumento”, afirmou a Associação Europeia sobre a Depressão. Por sua vez, a Organização Mundial da Saúde (OMS) “alertou que o suicídio… constitui uma das três principais causas de morte entre as pessoas de 15 a 44 de idade” (www.infocop.es, 11012). O suicídio de pessoas despejadas de suas casas porque não podem pagar a hipoteca é um fato notório na Espanha.

O fenômeno não se limita à Europa. Os centros de controle e prevenção de enfermidades dos EUA (CDC, na sigla em inglês), organismos oficiais, informaram recentemente que as mortes por suicido superaram em número as causadas por acidentes de trânsito. “As taxas de suicídio entre os estadunidenses se elevaram desde 1999” (www.cdc.gov/2513). Os CDC levaram a cabo uma investigação entre adultos de 35 a 64 de idade e comprovaram que essas taxas haviam aumentado em 28%, especialmente entre brancos não hispanos e sobretudo em 39 dos 50 estados do país. O maior incremento foi observado nas pessoas de 50 a 54 (48%) e de 55 a 59 (49%), idades nas quais aqueles que perderam o trabalho pela crise econômica praticamente não encontrarão outro.

Não se trata apenas dos adultos. David Stuckler, investigador de mais alto escalão em Oxford, e o epidemiólogo Sanjai Basu, da Universidade de Standford, descobriram que 750.000 jovens (em sua maioria sem trabalho) haviam se voltado ao álcool e que mais de cinco milhões de estadunidenses perderam o acesso à saúde pública no período mais duro da recessão porque passaram a integrar as filas dos desempregados. A taxa de suicídios se elevou abruptamente no lapso 2007/2010, destacaram em um estudo publicado em maio (www.nytimes, 13-5-13). Um caso particular é o estado da Virginia, onde foram registradas as taxas de suicídios mais altas dos últimos 13 anos: é três vezes mais provável que os virginianos morram por suicídio que por homicídio (capitalnews.reu.edu, 8-5-13).

Stuckler e Basu encerram seu relatório com a seguinte conclusão: “O que aprendemos é que o perigo real para a saúde pública não é a recessão per se, mas a austeridade”, ou seja, as medidas impostas pela chamada Troika – o FMI, a Comissão Europeia e o Banco Central Europeu – para enfrentar a crise. Se presenciam reuniões dos chefes de Estado europeus com representantes da Troika nas quais estes últimos ditam as políticas econômicas que devem seguir os países da União Europeia. Nunca foi tão descarada a inversão dos termos “a política dirige a economia”, hoje substituídos por “a economia dirige a política”.

A correlação suicídios/austeridade é clara não apenas no Velho Continente e nos EUA. Investigadores australianos determinaram que a taxa de suicídios aumenta em seu país sob os governos conservadores (news.bbc.co.uk, 18-9-12). Quando as políticas de austeridade começaram a devastar a Grécia, dita taxa cresceu 18%: apenas em Atenas se elevou 25%. Antes deste flagelo, a Grécia tinha a taxa de suicídios mais baixa da União Europeia (www.euronews.com, 5-4-12).

A Islândia é o exemplo contrário. Em 2008 padeceu a crise bancária mais grave de sua história: três dos bancos mais importantes se declararam em bancarrota, o desemprego subiu para as nuvens e se desvalorizou a moeda nacional. Apesar disso, Reijawick não cortou o orçamento de seus programas sociais nem se dobrou à austeridade e, mediante acordos diversos, saiu da crise. Não se registrou um aumento significativo da taxa de suicídios durante o colapso financeiro (www.altenet.org, 3-8-13).

Como disse o Nobel de Economia Paul Krugmam: “A crise que estamos atravessando é fundamentalmente gratuita: não é necessário sofrer tanto nem destruir a vida de tanta gente”. (Fonte: aqui).

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"Apesar disso, (a Islândia) não cortou o orçamento de seus programas sociais nem se dobrou à austeridade...". Em palavras singelas: não se deixou levar pelo receituário neoliberal.

Indagação oportuna: quais teriam sido as consequências para o povo brasileiro caso o País tivesse abraçado a austeridade a partir da eclosão da crise financeira internacional iniciada em 2008?

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