Basquiat.
Crise em grupo de autores atinge patrimônio de artistas como Ziraldo e Millôr Fernandes
Por Marco Aurélio Canônico
"No fim da vida, quando podíamos ter um certo gozo do trabalho que fizemos e que não rendeu muito, nos vemos nessa situação horrorosa."
É com uma mistura de desânimo e desespero que o diretor teatral Aderbal Freire-Filho, 71, narra o imbróglio jurídico em que ele e três amigos --os desenhistas Ziraldo, 80, e Millôr Fernandes (1923-2012) e o dramaturgo Alcione Araújo (1945-2012)-- estão metidos há oito anos.
Depois que foram nomeados conselheiros da Sociedade Brasileira de Autores (Sbat), os quatro tiveram suas contas bancárias bloqueadas para o pagamento das milionárias dívidas trabalhistas da entidade, responsável pela arrecadação de direitos autorais de dramaturgos.
"Nós fomos chamados para salvar a Sbat. Aí o babaca aqui foi. Chamou para ser herói, lá vou eu", diz Ziraldo, um dos que participaram da assembleia que, em 2004, elegeu o novo conselho, não remunerado, para tentar contornar a crise em que a entidade se arrastava há décadas.
Aderbal diz ter ficado "empolgado com a ideia de salvar uma instituição centenária".
"Chamamos autores, pensamos que a solução seriam os jovens, juntamos muita gente. Aí tivemos a primeira surpresa em 2006, quando foram bloqueadas as contas. Ficamos em pânico."
As dívidas da Sbat são tantas, e a confusão tão grande que os envolvidos dizem nem ter certeza do valor exato.
As trabalhistas são estimadas em R$ 1 milhão; as tributárias, "entre R$ 5 milhões e R$ 10 milhões"; as cíveis, de herdeiros de autores como Jorge Amado e Antonio Maria, que cobram direitos autorais não recebidos, estão em pelo menos R$ 160 mil.
Há grandes débitos também com "dois ou três bancos" e com os condomínios das salas que a Sbat ainda ocupa em São Paulo e no Rio - e que estão penhoradas.
Por conta das ações trabalhistas -90% delas anteriores à entrada do conselho, segundo Aderbal-, Ziraldo e Alcione têm cerca de R$ 140 mil bloqueados; Aderbal diz já ter perdido "mais de R$ 100 mil".
MILLÔR SE LIVRA
Quem sofreu o maior baque inicial em suas contas foi Millôr, que teve R$ 273 mil bloqueados para o pagamento de uma dívida trabalhista de R$ 110 mil, na época em que já estava inconsciente.
Seu filho, Ivan Fernandes, entrou no caso e conseguiu liberar a quantia bloqueada em excesso. A dívida foi então renegociada para R$ 65 mil, valor que a Sbat pagou em 13 prestações, liberando o montante bloqueado.
A maior vitória de Ivan foi conseguida recentemente: a Justiça reconheceu que seu pai não devia ser considerado conselheiro da Sbat, pois nunca assinou atas nem participou de nada.
A sociedade fundada em 1917 por um grupo liderado por Chiquinha Gonzaga (1847-1935) está prestes a ser fechada.
Perdeu para outra sociedade de autores, a Abramus (Associação Brasileira de Música e Artes), a maior parte dos direitos autorais que administrava, mas ainda tem entre seus afiliados nomes simbólicos como Chico Buarque, Plínio Marcos, Dias Gomes e Ana Maria Machado.
"Ao contrário do Ecad, que não quer fiscalização, meu sonho é que o governo fiscalize a Sbat", diz Aderbal. "Que descubra as consequências horríveis dessa falência. O governo não pode ficar insensível à morte da Sbat." (Fonte: aqui).
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Faça o seu comentário.