domingo, 11 de novembro de 2012

MENSALÃO: JULGAMENTO NÃO FOI JUDICIOSO

Claus Roxin, jurista.

Participação no comando de esquema tem de ser provada

Do jornal Folha de S. Paulo

Insatisfeito com a jurisprudência alemã -que até meados dos anos 1960 via como participante, e não como autor de um crime, aquele que, ocupando posição de comando, dava a ordem para a execução de um delito-, o jurista alemão Claus Roxin, 81, decidiu estudar o tema.

Aprimorou a teoria do domínio do fato, segundo a qual autor não é só quem executa o crime, mas quem tem o poder de decidir sua realização e faz o planejamento estratégico para que ele aconteça.
Roxin diz que essa decisão precisa ser provada, não basta que haja indícios de que ela possa ter ocorrido.

Nas últimas semanas, sua teoria foi citada por ministros do STF (Supremo Tribunal Federal) no julgamento do mensalão. Foi um dos fundamentos usados por Joaquim Barbosa na condenação do ex-ministro José Dirceu.

"Quem ocupa posição de comando tem que ter, de fato, emitido a ordem. E isso deve ser provado", diz Roxin. Ele esteve no Rio há duas semanas participando de seminário sobre direito penal.

Folha - O que o levou ao estudo da teoria do domínio do fato?
Claus Roxin - O que me perturbava eram os crimes do nacional socialismo. Achava que quem ocupa posição dentro de um chamado aparato organizado de poder e dá o comando para que se execute um delito, tem de responder como autor e não só como partícipe, como queria a doutrina da época.
Na época, a jurisprudência alemã ignorou minha teoria. Mas conseguimos alguns êxitos. Na Argentina, o processo contra a junta militar de Videla [Jorge Rafael Videla, presidente da Junta Militar que governou o país de 1976 a 1981] aplicou a teoria, considerando culpados os comandantes da junta pelo desaparecimento de pessoas. Está no estatuto do Tribunal Penal Internacional e no equivalente ao STJ alemão, que a adotou para julgar crimes na Alemanha Oriental. A Corte Suprema do Peru também usou a teoria para julgar Fujimori [presidente entre 1990 e 2000].

É possível usar a teoria para fundamentar a condenação de um acusado supondo sua participação apenas pelo fato de sua posição hierárquica?
Não, em absoluto. A pessoa que ocupa a posição no topo de uma organização tem também que ter comandado esse fato, emitido uma ordem. Isso seria um mau uso.

O dever de conhecer os atos de um subordinado não implica em co-responsabilidade?
A posição hierárquica não fundamenta, sob nenhuma circunstância, o domínio do fato. O mero ter que saber não basta. Essa construção ["dever de saber"] é do direito anglo-saxão e não a considero correta. No caso do Fujimori, por exemplo, foi importante ter provas de que ele controlou os sequestros e homicídios realizados.

A opinião pública pede punições severas no mensalão. A pressão da opinião pública pode influenciar o juiz?
Na Alemanha temos o mesmo problema. É interessante saber que aqui também há o clamor por condenações severas, mesmo sem provas suficientes. O problema é que isso não corresponde ao direito. O juiz não tem que ficar ao lado da opinião pública. (Fonte: aqui).

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Quantas vezes, ao longo do julgamento do mensalão, foi citado o nome de Claus Roxin como principal fiador da teoria do domínio do fato nos moldes eleitos pelo STF, isto é, com a prevalência dos indícios sobre as provas, bastando para tal a posição hierárquica do acusado? E agora? Certamente outros doutos juristas serão alinhados pelos ilustres julgadores para contestar o juízo exposto por Roxin, mas que o 'embasamento' parece trincado, parece.

Depois dessa, resta indagar: se a teoria do domínio do fato, por seu ineditismo, despertou tanta polêmica, e considerando a complexidade, o vulto e a repercussão do processo do mensalão, não teria sido aconselhável, antes da emissão de qualquer juízo, solicitar o auxílio de Claus Roxin, para que ele, de corpo presente, explicitasse a teoria? Afinal, existiria amicus curiae melhor do que Roxin?

Em tempo: convém lembrar que na sessão plenária de 4 de outubro o ministro revisor do processo do mensalão fez um alerta sobre o equívoco em que o STF estava incorrendo. Para ler sobre o assunto, clique AQUI.

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