Ilustração: Fraga.
Economia
Antonio Delfim Netto
O conjunto de conhecimentos que, nos últimos 300 anos, os observadores do
funcionamento do sistema econômico organizaram sob o nome de "economia política"
foi, no fim do século 19, chamado de "economia", talvez na busca dissimulada de
sua promoção a ciência.
A despeito da crise em que vivemos, tal conjunto
de conhecimentos passa bem e continua sendo útil às administrações pública e
privada:
1º) Na conscientização da sociedade de que, apesar dos fatores
de produção terem usos múltiplos, cada unidade de um deles não pode geralmente
ser utilizada, ao mesmo tempo, para múltiplos fins. O carvão usado na produção
do aço não pode, simultaneamente, produzir energia elétrica. Só podemos
distribuir o que já foi produzido. A maior distribuição de renda e o consequente
aumento do consumo no presente implicam menor investimento e podem levar a um
menor aumento do consumo no futuro.
2º) Na busca do uso eficiente dos
recursos sempre limitados da sociedade para a satisfação aceleradamente
crescente das "necessidades" criadas pelo próprio processo
civilizatório.
3º) No reconhecimento da existência de restrições físicas
determinadas pelas identidades da contabilidade nacional e de que não há
artifício, mágica ou "vontade política" que permitam violá-las. Quando,
inadvertidamente, o poder incumbente tenta fazê-lo, paga um amargo custo sem
consegui-lo.
4º) No reconhecimento de que instituições adequadas que
proporcionem os incentivos corretos usando o sistema de preços estimulem os
agentes econômicos a atender simultaneamente os seus interesses e os da
sociedade, o que sugere um papel importante para as políticas econômicas e
sociais.
A economia não é uma ciência "dura" como a física, por exemplo,
mas também tem uma "lei universal". Da mesma forma que há nesta a "lei da
conservação da energia", naquela existe a lei aparentemente simplória de que
"não existe almoço grátis!".
A economia esconde uma verdade essencial às
vezes não percebida, mas que comparece inexoravelmente na hora da prestação de
contas.
É claro que a distinção da natureza, da qualidade e da precisão
entre os dois conhecimentos é abissal.
Nas últimas semanas, corrigiu-se um
erro de estimativa de 60 milionésimos de segundo na velocidade dos neutrinos,
enquanto, no Brasil, discutíamos, sem conclusão, se a "taxa de juros neutra"
(mais difícil de detectar do que o neutrino) é alguma coisa entre 4,5 % e 6
%!
Pois bem, para o bolso dos brasileiros, a eventual correção de
Einstein seria infinitamente menos importante que um erro de 1% na estimativa da
taxa de juro "neutra" pelo Banco Central...
................
O artigo (aula) acima foi publicado em 21 de março. Uma vez que desde então a Selic foi reduzida, chegando aos atuais 8,5%, menor da série histórica, e a 'taxa neutra' está por volta de 4,5%, pode-se afirmar que o Brasil seguiu a orientação do professor Delfim. Resta aguardar, entre outros, a necessária elevação dos investimentos, cuja ausência foi a causa maior da pequenez do PIB do primeiro trimestre (escassez fruto da 'radicalização de precauções' por parte das autoridades econômicas em 2011). A prática mostrou - vem mostrando! - que a austeridade é prejudicial a todas as economias.
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