Charge de Bennett.
Barack Obama declarou que as pessoas de mesmo sexo que pretendam se casar, devem casar-se, o que vem despertando reações as mais diversas, transitando da estupefação ao escárnio (notadamente no chamado Cinturão Bíblico), com passagem pelo aplauso, e que certamente vai render muito pano pra manga.
Aproveito para reproduzir artigo escrito por Lúcia Guimarães, que li no Conteúdo Livre:
Gays, raça, classe e religião
Nova York - Na quarta-feira
passada, quando Barack Obama garantiu mais uma vaga na história ao defender o
casamento entre pessoas do mesmo sexo, Cory Booker, o popular prefeito negro de
Newark, disparou pelo Twitter: vou dar entrevista, assim "que eu parar de
dançar".
A importância do anúncio feito por Obama ainda é muito recente
para ser compreendida, mas, que tal mandarmos o cinismo dar uma volta ali na
esquina? Podemos, por um momento, deixar de lado o escrutínio do cálculo
político que fez com que o presidente assumisse o risco de alienar
eleitores-chave em novembro?
Imagine se um político racista conseguisse
introduzir um plebiscito na Carolina do Sul, onde a bandeira confederada,
símbolo da luta contra a abolição da escravatura, continua desfraldada na
capital. O dito plebiscito perguntaria aos eleitores se a proibição das práticas
eleitorais que impediam negros de votar e o fim da segregação em escolas
públicas, conquistas do Ato de Direitos Civis de 1964, devem ser revogadas. Não
tenho dúvidas de que ficaríamos chocados com o número de votos a favor da volta
da segregação racial.
Esse plebiscito, felizmente, não vai acontecer e
sugiro o exercício da imaginação apenas para argumentar que direitos civis não
devem ser submetidos ao varejo nas urnas, especialmente num mês em que um
partido nazista conquistou 20 assentos no parlamento do berço da democracia
ocidental.
E, numa semana em que a Carolina do Norte aprovou uma emenda
constitucional para impedir que o casamento gay seja legalizado entre suas
fronteiras, tenho um recado para quem acha que os homossexuais americanos são
elitistas brancos e antidemocráticos, refestelados em privilégio na Califórnia e
em Nova York. Somente 34% dos eleitores compareceram às urnas para votar a
odiosa emenda. A mobilização conservadora é muito mais intensa, o que, de acordo
com o respeitado Pew Research Center, fez com que a maioria dos Estados
americanos que lançaram plebiscitos locais tenha banido o casamento gay. Ou
seja, quem não se opõe ao casamento gay tende a ficar em casa, revelam os
números do Pew.
A "evolução de opinião" sobre o assunto, que Barack Obama
alega, é refletida numa das mais incomuns evoluções estatísticas nos Estados
Unidos. Em 1996, 65% da população geral se manifestava contra o casamento gay,
27% a favor. Uma nova pesquisa do Pew revela 47% a favor, 43% contra. O anúncio
de quarta-feira acendeu os púlpitos das igrejas protestantes americanas. Sabemos
que a Proposition 8, passada há quatro anos para banir o casamento gay na
Califórnia, contou com quase 60% de apoio dos negros, mobilizados por seus
pastores.
Mais de 95% dos negros americanos votaram em Obama em 2008 e
continuaram a apoiar o presidente, apesar de constituir a minoria mais punida
pelo crash de 2008. A mídia americana, predominantemente branca, voltou a
sugerir que os negros são homofóbicos e vão ficar em casa em novembro. Aposto
minha coleção de CDs do Paulinho da Viola que eles vão votar em massa em Barack
Obama.
Sim, a cara da militância gay americana ainda é um homem branco de
meia-idade e de classe média alta. Os líderes religiosos que demonizam a
estabilidade de famílias lideradas por pessoas do mesmo sexo fariam por bem
observar que 66% das crianças negras americanas são criadas por mães ou pais
solteiros. Entre os brancos, esse número cai para 24%. Sim, são principalmente
os brancos afluentes que insistem no burguês direito de se casar. Um negro que
vive abaixo da linha da pobreza terá mais dificuldade de apresentar um
companheiro à família e esta é uma fonte de distorção estatística. Mas, em vez
de contemplar o fato com escárnio, podemos lembrar que Obama mudou de opinião
sob pressão de Michelle e das filhas Sasha e Malia. As meninas frequentam
colegas de escola que são criadas por gays e lésbicas e aproximaram o pai do
absurdo da intolerância. Quanto mais as pessoas convivem com gays assumidos e
ajustados, maior a tolerância.
Graças a um gesto simbólico do primeiro
presidente negro americano, um gesto que não implica burocracia ou imposição
legal, quantas famílias estarão, hoje à noite, fazendo as pazes? (Fonte: aqui).
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