Mário - A Tribuna de Minas.
Cheiro de orégano
Ruy Castro
No passado, quando se concluía que era besteira continuar a investigar alguma
coisa porque não daria em nada, dizia-se que ia acabar em samba. Como se o samba
fosse algo oco, anódino, sensaborão, de que se pudesse passar
sem.
Imagino o desgosto de Ary Barroso ao ouvir isso -ele que tanto
defendia o samba como a grande contribuição musical do Brasil e tinha nevralgia
quando alguém anunciava que ia cantar "um sambinha". Pior ainda quando o
"sambinha" era "Faceira", "Na Batucada da Vida", "Aquarela do Brasil", "Os
Quindins de Iaiá" ou "É Luxo Só", todos monumentais e dele. Pois Ary, que morreu
no Carnaval de 1964, deve ter se pacificado postumamente, porque de há muito as
coisas não acabam mais em samba, mas em pizza.
O que me intriga é que os
que acham pizza a maior coisa do mundo -e são milhões, em São Paulo, Nápoles,
Nova York - não se indignem com essa comparação que reduz a pizza a algo inútil,
sem sentido, que tanto faz comer como passar nas costas. Quando morei em São
Paulo, nos anos 80, conheci gente que derrubou a garagem para transformá-la num
forno a lenha do tamanho da própria casa, no qual produziam pizzas do diâmetro
de bambolês e faziam toda a vizinhança recender a orégano. Pois nem estes
parecem se ofender.
Na semana passada, membros da CPI do Cachoeira,
encarregados de investigar as relações do empresário zoológico com a fauna que
comanda os gabinetes mais poderosos do país, acusaram o governo de impeli-los a
limitar as investigações a alguns bagrinhos, os quais irão temporariamente para
a frigideira, a fim de salvar do fogo os peixes mais graúdos.
Donde a
velha e temida frase, "CPI a gente sabe como começa, mas não como termina",
caducou.
Termina em farinha de trigo, fermento, óleo, mozarela e, digamos,
aliche, para fazer de conta.
................
Entre aromas diversos, parece razoável que refreemos um pouco a gula.
Singularidades desta CPMI: a) as peças da investigação já existem; a PF já fez seu trabalho; b) os envolvidos irão permanecer calados? Tudo bem. Ocorre que o que foi captado nos Nextel já falou por eles (e nem metade do conteúdo veio a público!); c) instâncias que nas CPI anteriores animavam o clima, nesta contiveram o ânimo.
Assuntemos, pois.
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