terça-feira, 1 de março de 2011
O DISCURSO DO REI
Um filme simples, bem à moda antiga, juntando solenidade, humor e superação. Bem à moda antiga mesmo, convindo abstrair os filmes antigos marcados pela apelação. O Discurso do Rei não apela: até as palavras de baixo calão gritadas têm mérito terapêutico: auxiliariam no combate à gagueira, cruz que o rei George 6º carregaria até o fim.
O filme, com 12 indicações para o Oscar, levou os de Melhor Filme, Melhor Diretor (Tom Hooper), Melhor Ator (Colin Firth) e Melhor Roteiro Original (David Seidler). Antes, ganhara o prêmio de Melhor Filme, segundo o público, no Festival de Cinema de Toronto 2010, e o Globo de Ouro de Melhor Ator - Drama (Colin Firth).
Marco Tomazzoni, do IG São Paulo, escreveu, há dias: "(...) O príncipe Albert (Firth), Duque de York, segundo colocado na linha de sucessão, era gago. Logo se descobre que ele experimentou de tudo para curar o problema, batendo na porta de todos os especialistas da Inglaterra. Tenta, tenta, mas morre na praia. Seu pai, George 5º, é um orador nato e explica para o filho o quanto é importante falar com os súditos e como os tempos mudaram na era da comunicação de massa. 'Nós viramos atores', diz ele, 'antes era só parecer respeitável no uniforme e não cair do cavalo'.
Albert, ou Bertie, como é chamado em casa, considera-se um caso perdido, ao contrário de sua mulher, Elizabeth (Helena Bonham Carter). A duquesa vai atrás do australiano Lionel Logue (Geoffrey Rush), terapeuta da fala com métodos pouco ortodoxos e sem treinamento formal. De cara Bertie e Lionel não se dão bem – o primeiro reivindica tratamento aristocrático, o segundo exige intimidade para que se superem os traumas que deram origem à gagueira. O príncipe tem complexo de inferioridade, não se vê como um futuro líder, enquanto o outro percebe sinais de grandeza por baixo daquela alma flagelada. (...)
Bertie é mesmo o modo certo de chamá-lo, porque a função do filme é aproximar a família real das multidões. Os monarcas são criaturas divinas, escolhidas por Deus para governar o Reino Unido, mas também são gente. Por trás da aura dourada da realeza, aprende-se, há sentimento, responsabilidade, humor e também erros – é esse o papel do príncipe Edward (Guy Pearce), ovelha negra da família, que assume o lugar do pai, mas desiste do reinado para poder se casar com sua amante, a americana Wallis Simpson. Bertie, o bom moço, precisa superar seus próprios problemas, tomar o posto do irmão e conduzir o país com segurança rumo à batalha contra o nazismo. Não por nada, a rainha Elizabeth assistiu ao filme em uma sessão privada no Palácio de Buckingham e adorou o retrato do pai.
Claro que para contar toda essa glória e ser um sucesso de bilheteria na Inglaterra O Discurso do Rei precisou tomar liberdades históricas. Muita coisa é jogada debaixo do tapete – a simpatia do príncipe Edward por Hitler, uma suposta predisposição antissemita de George 6º e a influência do primeiro-ministro Winston Churchill no governo e no estado de espírito da população. Os produtores sempre podem responder a acusação de chapa branca, como têm feito, afirmando que o foco do filme é a amizade do rei com Logue. O jogo de empurra começa e a plateia não dá a mínima bola.
Indicado ao Oscar, o trio protagonista é o grande responsável por cativar o público. Colin Firth faz de tudo para tornar palpáveis os fantasmas de Bertie e sua metamorfose num líder. Consegue, e dificilmente vai sair da cerimônia no final de fevereiro sem o prêmio. Helena Bonham Carter é a companheira perfeita, a doçura na família real. Já Geoffrey Rush rouba todas as cenas em que aparece e é o que o filme tem de melhor – sem ele, o projeto poderia ter fracassado miseravelmente. Não foi o caso e O Discurso do Rei está aí, prestes a ser consagrado. Sem qualquer inovação, correto até dizer chega. A coroação do lugar-comum."
Tomazzoni acertou: O Discurso do Rei foi consagrado. No trecho em que faz referência a Winston Churchill ele poderia ter dito que o primeiro-ministro não só foi 'minimizado', como mereceu sutil piparote o seu avantajado ego: ao cumprimentar George 6º pelo discurso final, reconhece modestamente: "Eu não teria feito melhor!"
O Discurso do Rei: filmaço.
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