quinta-feira, 21 de maio de 2020

MILITARES NO GOVERNO - O CASO DA VENEZUELA

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"A incorporação de militares no Governo, como anel de proteção, é uma questão de PROCESSO e não de ideologia. Nada tem a ver com ideologia, é um método de governo, conhecido desde os tempos do Império Romano."


Por André Araújo 

No início de 2003 estive em Caracas para um encontro com a direção da PETROLEOS DE VENEZUELA S.A., a mítica PDVSA, a pedido de um cliente. Meu anfitrião foi José Rojas, então Vice Presidente Executivo da empresa, que era maior que a PETROBRAS em faturamento, não só pelas três grandes estruturas herdadas da EXXON, SHELL e TEXACO; a nacionalização dessas multinacionais petroleiras se deu muito antes de Chavez, nos anos 80, mas também pela vasta estrutura de refinarias e postos de combustíveis da CITGO no Texas, 8 refinarias e 14.000 postos de combustíveis; a PDVA exportava 1,3 milhão de barris/dia para o Texas, lá refinava  e distribuía em seus postos.
Posteriormente também acompanhei a compra da ELECTRICIDAD DE CARACAS pela PDVSA, a primeira grande nacionalização do governo Chavez, que pagou sem discutir o preço da EDC pelo que valia na Bolsa de Nova York, usando o caixa da PDVSA, que era maior que o caixa da Tesouraria da República. José Rojas depois se desentendeu com o presidente da PDVSA, o mítico revolucionário Ali Rodriguez, por motivos onde Rojas tinha total razão, mas Chavez não podia confrontar com Rodriguez, uma espécie de pai ideológico de Chavez.
Rojas continuou respeitado e admirado por Chavez, que o enviou a Washington como diretor executivo do Fundo Monetário Internacional representando a Venezuela e mais 10 países.
Estive com ele em Washington algumas vezes no restaurante Citronelle, onde a PDVSA tinha uma mesa cativa, Rojas era formado pelo prestigiado Instituto Francês do Petróleo, um homem brilhante, depois foi candidato à presidência do BID, seria um dos homens talhados para uma nova Venezuela, sua esposa costarriquenha juíza, gente de escol.
Nessa época não havia nenhum militar na PDVSA, nem no Conselho de Diretores. Quando Chavez começou a perder prestígio político por causa das más condições da economia começou o processo de cooptação dos militares para garantir o regime. No início dois generais foram para o Conselho da PDVSA, foi só o começo. Hoje o que restou da PDVSA, uma ruína completa, está inteiramente na mão de militares. A cooptação não foi homogênea, no golpe fracassado contra Chavez em 2002, quem o recolocou no poder foi o General Raul Baduel, que depois foi Comandante do Exército de 2004 a 2007 e, em seguida, Ministro da Defesa. Mas em 2008 Baduel rompeu com Chavez, foi preso e se encontra preso até hoje em Fuerte Tuna. Baduel rompeu com Chavez porque viu a escalada autoritária que colocaria fim à democracia na Venezuela, que foi o que aconteceu.
Hoje, o aparelho do Estado na Venezuela está inteiramente dirigido por militares, especialmente do Exército. O sucessor de Chavez aliciou o Exército com nomeações que contemplaram os mais de 500 generais e suas famílias, os quais todavia veem seu poder  erodir pela existência de milícias cada vez mais armadas, que são as que enfrentam as manifestações de rua anti-maduristas, fazem as distribuições de alimentos e se tornaram um novo Estado dentro do Estado.
No processo de cooptação das Forças Armadas dois valores foram destruídos na Venezuela, a República, o País está em ruínas, e as próprias Forças Armadas como instituição.
A incorporação de militares no Governo, como anel de proteção, é uma questão de PROCESSO e não de ideologia. Nada tem a ver com ideologia, é um método de governo, conhecido desde os tempos do Império Romano, quando em certo período a Guarda Pretoriana dominava o trono, aliás chegou a leiloá-lo.
Os quatro maiores regimes autoritários do Século XX, dois comunistas, Stalin na URSS e Mao na República Popular da China e os dois regimes fascistas, Mussolini na Itália e Hitler na Alemanha, NÃO usaram militares no Governo, ao contrário, seu domínio sobre a máquina militar era completo. No caso alemão, já fiz aqui vários artigos.
Um dos maiores Comandantes militares alemães da Segunda Guerra, o Marechal Erich von Manstein não se envolveu com o nazismo, sobreviveu à Guerra e foi o fundador do Exército da Alemanha Federal, o Bundeswehr. Até sua morte, em 1973, era uma das personalidades mais respeitadas da Alemanha.
Outro General da 2ª Guerra, Hans Speidel, que foi Comandante militar de Paris sob Hitler, dez anos depois era o Comandante das Forças Terrestres da OTAN. Só foi possível porque eram OFICIAIS PROFISSIONAIS e não se envolveram com política mesmo sob o nazismo; raros generais alemães eram filiados ao Partido Nazista.
Dentro dos registros históricos vê-se que essa questão é delicadíssima e comporta análise substantiva, não é uma questão de “mais ou menos”.
O GOVERNO MILITAR DE 64 TINHA ESTRUTURA CIVIL
O Governo Militar instaurado em 31 de março de 1964 teve Generais Presidentes alternados, não se criou o domínio de um homem ou família e seus grandes formuladores e operadores eram todos civis de alta qualidade. Roberto Campos, Delfim Neto, João Paulo dos Reis Velloso, Mario Henrique Simonsen, Mario Thibau, Camilo Penna, Octavio Marcondes Ferraz, Azeredo da Silveira, Mario Gibson Barbosa, Petrônio Portella, Magalhaes Pinto. Alysson Paulinelli, Murillo Macedo, Saraiva Guerreiro, Esther Figueiredo Ferraz.
Os militares reservam para si as áreas de defesa e segurança, as demais eram civis, era um Governo de DNA militar, mas funcionava como civil.
A passagem para a redemocratização, em 1985, não causou um desmonte da máquina administrativa porque ela foi mantida civil antes, durante e depois de 1964.
O aparelhamento militar no atual Governo é infinitamente maior do que no período 1964-1985, na forma e número de cargos, ocupados sem lógica de pertinência e eficiência.
A natureza do governo, mais e mais, vai sendo militar, não adianta dizer que a instituição militar não está envolvida, é evidente que está pela presença de generais da ativa, e na ativa, em cargos palacianos. A simbiose passa a ser total e os ganhos e custos vão ser jogados na conta das Forças Armadas, é verdade que mais para o Exército. É um alto risco.  -  (Fonte: Jornal GGN - Aqui).

Manstein, marechal alemão, uma aula de sobrevivência, por André Motta Araújo

O Brasil vai precisar de todas as forças de resiliência para reconstruir o Estado devastado pela guerra ideológica alucinada e destrutiva.

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