quinta-feira, 11 de maio de 2017

COMO MEDIR A ECONOMIA BRASILEIRA (DESCARTANDO A TURMA DO MERCADO)


Como medir a verdadeira economia brasileira

Por André Araújo

A mídia e o Governo se orientam por um referencial econômico que não representa a economia brasileira.

Nesse mundo fantasioso existem como personagens a Bolsa, o investidor estrangeiro, a Avenida Faria Lima em São Paulo, a Rua Dias Ferreira no Rio e uma categoria de mães de santo chamados de “economistas-chefes de bancos”, que adoram frações de frações de 1% de qualquer coisa para mostrar precisão e genialidade. No último FOCUS desta segunda-feira, reviram a perspectiva de crescimento do PIB para 2017, de 0.42 para 0.46%, como se esse preciosismo de “forecasting” tivesse alguma importância real para a população brasileira.

Reparem bem: não é um numero da realidade, é o preciosismo na projeção para o futuro. Ao invés de o Brasil crescer 0,42%, vai crescer 0,46%. Os dois números podem estar completamente errados, mas para o FOCUS eles são importantíssimos, porque garantem os empregos dos “economistas-chefes”.
Não estão representados neste cenário de "faz-de-conta" as milhares de empresas médias do Rio Grande do Sul ao Amazonas, os milhões de pequenos empresários que são a espinha dorsal do emprego e renda, o fundamental setor agrícola e pecuário, tanto de exportação como de alimentação do povo brasileiro - são cinco milhões de propriedade agrícolas -, os incontáveis prestadores de serviços autônomos que sobrevivem exclusivamente de seu trabalho de encanadores, jardineiros, eletricistas, taxistas, marceneiros.
Nenhum deles faz parte do Boletim FOCUS, que nada tem a ver com eles. O FOCUS é apenas uma brincadeira, um teatrinho sem nenhuma importância. Porque quer prever um futuro, são chutadores de números, que o Banco Central, uma instituição pública que custa caro ao País, usa para guiar seus passos, uma vez que se presume que o nosso Governo não tem seus próprios economistas para prospectar o futuro. Depende dos XPs da vida com suas echarpes e roupetas de grife, operando basicamente para seus clientes de Nova York e Londres.
Essa alienação não é histórica. No passado não tão longínquo, o governo e o Banco Central tinham suas próprias e sólidas estatísticas geradas nas instituições públicas e nas associações empresariais. Não eram palpites como o FOCUS, eram “tendências”, “linhas” que vinham da indústria pesada, através da ABDIB,  das associações comerciais de São Paulo e Rio, da CNI-Confederação Nacional da Indústria, da CACEX, das associações rurais (SRB, SNA), das associações setoriais ABINEE, ABIMAQ, ABCITRUS, ABIA, ABIT, ANFAVEA, dos Clubes de Lojistas, das associações de supermercados.
Essas eram estatísticas e projeções reais de gente com a mão na massa da economia, gente do chão de fábrica e não almofadinhas PhD de bancos exclusivamente de olho no mítico “investidor estrangeiro’ - na realidade, um coleguinha economista que trabalha para algum fundo de Chicago que nem sabe onde fica o Brasil ou uma offshore de Cayman, que opera dinheiro brasileiro disfarçado de estrangeiro.
O pior é que o Governo se guia exclusivamente por essa turma “digital”, esquecendo que existe outra economia, a verdadeira, a que dá empregos na ponta da enxada, no balcão, no trator, no caminhão, no boteco, na borracharia, na oficina, bem longe do happy hour na Tratoria Fasano na Faria Lima ou no Quadrucci na Rua Dias Ferreira.
A mídia segue o Governo e foca exclusivamente nos informantes do boletim FOCUS, só se interessa pelo investidor estrangeiro e pela opinião dos “economistas de bancos”. Os repórteres não vão ao interior entrevistar médios empresários, indústrias de beneficiamento de cereais, cerâmicas, pedreiras, fábricas de confecção. Não têm interesse na economia real. Para a mídia, vale o André Perfeito, a Zeina Latif, o economista chefe do Itaú. O resto não existe.
O pessoal do “mercado” está sempre disponível para entrevistas e todos falam exatamente as mesmas coisas. Entrevistar um é como entrevistar dez, o discurso é idêntico: “a reforma da previdência é essencial” etc. Não falam uma palavra sobre a política cambial do BC, ao segurar o dólar com swaps cambiais e, com isso, estimular os brasileiros a torrarem dólares em Miami. Nada falam sobre os mega juros dos bancos na ponta do tomador, indiferentes à baixa da taxa Selic. Os bancos não estão nem aí e não obedecem ao canto dos “economistas de mercado", al di lá, baixando a Selic baixam os juros, etc. Não baixam, e os “de mercado” nem tocam no assunto, continuam a cantar que os juros vão baixar, tra, lá, lá, etc, mas os juros não baixam e eles fingem que não é com eles.
Dos saudosos tempos de Delfim Neto, lembro de sua ligação profunda com a economia real. Telefonava no fim da tarde, duas ou três vezes por semana, para o Dr. Manuel Costa Santos, na ABINEE, queria saber da venda de geladeiras, para o Dr. Manuel Garcia Filho na Associação dos Pneus para saber das vendas, para o Salvador Arena na Termomecânica para saber da venda do cobre, para o Mario Garnero na ANFAVEA para saber de carros e caminhões.
Delfim tinha uma “rede” de contatos com toda a indústria, a exportação, a agricultura, o pessoal do zebu. Esse era o Boletim FOCUS dele, com cheiro de terra, de aço, de borracha, ele tirava o pulso da economia, sem precisar de palpites de 0,0004%, como esses bocós de asfalto que não acertam uma. Boletim FOCUS é um sinal da subserviência do Brasil ao mercado financeiro nacional e internacional, do desligamento do Governo da realidade econômica nacional para se lastrear exclusivamente na turma do “mercado”, como se o Brasil fosse uma ilhota do Caribe.  -  (Fonte: Jornal GGN - AQUI).

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Enquanto isso, a mídia exulta em face de o índice de inflação de março haver ficado abaixo da meta, feito inédito desde o plano real. Mas alguns dos veículos, cientes da impossibilidade de escapar do cenário recessivo que marca o país, se veem compelidos a reconhecer que o 'sucesso' decorre da fragilidade da demanda: se não há vendas, é claro que os preços congelarão/despencarão. A baixa inflação, assim, no mundo de Machado de Assis, é a glória que eleva mas não consola.
E qual o caminho? Os investimentos, privados e/ou públicos. Quanto a eles, nada há que injete otimismo. Rentismo, desconfiança e obsessão por inflação zero é que dão as cartas. Sem contar a entrega do patrimônio nacional a quem se interessar possa, do Brasil ou do exterior, sob o argumento de que é preciso "diminuir o endividamento" e/ou "auferir dinheiro para... investimentos". 

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